● Assunto: a
donzela levanta-se ao romper da manhã e vai lavar camisas (brancas) a uma
nascente. Quando aí chega, o vento começa a soprar e faz voar as camisas, o que
deixa a jovem zangada.
● Tema:
a. sentido literal: o aborrecimento da
donzela;
b. metafórico: a descrição de uma
primeira relação sexual.
● Estrutura interna
▪ 1.ª parte (1.ª e 2.ª coblas)
– Introdução:
- localização espacial: alto mar/rio;
- localização temporal: a madrugada;
- sujeito poético: a donzela;
- ação: lavar camisas.
▪ 2.ª parte (3.ª e
4.ª coblas) – Desenvolvimento: o vento leva as camisas à donzela.
▪ 3.ª parte (5.ª e
6.ª coblas) – Desenlace: reação irada da donzela.
● Dupla leitura do poema
De acordo
com uma leitura superficial, esta cantiga retrata uma simples situação rural:
uma jovem rapariga levanta-se de madrugada e vai lavar camisas que o vento lhe
leva e ela, zangada, segue-o.
Optando por
uma outra leitura, de cariz metafórico, o poema descreve uma primeira
experiência sexual, marcada por um erotismo sugerido: acordado pela manhã, um
casal de namorados, que terão passado a noite juntos, irrita-se com o nascer do
dia, que obrigará à sua separação. Neste contexto, a cantiga ilustra a donzela
como alguém envolvido ativamente na relação amorosa, já que se submeteu ao
lugar alto da nascente de água – onde se encontrava à mercê do vento –
colocando-se à prova, oscilando entre o desejo e o receio, algo característico
da primeira relação sexual.
Deste modo,
pode compreender-se a ira da jovem ao ver o vento levar-lhe as camisas. Ao
perdê-las, perde também a sua virgindade. Por outro lado, de acordo com Hélder
Macedo, estamos na presença de uma relação em que a iniciação erótica é
«implicitamente rejeitada ao nível da sua vontade, mas simbolicamente requerida
pela sua condição biológica e social de núbil».
● Elementos narrativos
da cantiga
▪ Personagens: a donzela e o amigo
(simbolizado pelo vento).
▪ Espaço: o rio.
▪ Tempo: a madrugada – presente.
▪ Ação: a ida da donzela ao rio para
lavar camisas.
● Estrutura formal
• Coblas: seis quintilhas.
• Rima:
- cruzada;
- toante (“velida”/”camisas”);
- pobre (“louçana”/”alva”) e rica (“velida”/”camisas”);
- grave.
• Métrica: versos de 2, 4 e 6 sílabas.
• Ritmo rápido: transmite
a forma lesta como a donzela se levanta e encaminha para o rio, a passagem do
vento, que lhe leva as camisas, e a imediata ira da jovem.
• Refrão: é ambíguo,
devido à presença da palavra «alva».
● Recursos expressivos
• Assonância: repetição
insistente das vogais a e i.
• Aliterações:
- em v:
sugere o som do vento (= amigo → a sua presença constante);
- em l.
• Palavra «alva»:
- enquanto nome:
significa «madrugada», isto é, indicia que a donzela se levantou de madrugada;
- enquanto adjetivo
significa «branca».
. moça de pele branca;
. simbolismo: o branco é a cor simbólica
da pureza, inocência e virgindade, ideia corroborada pelo ato de lavar (tornar limpo
algo sujo).
Assim sendo, o vocábulo
adquire vários sentidos:
. o amanhecer;
. a água onde lava a roupa;
. a donzela (ainda) pura;
. a necessidade de se «manter pura»;
. ou a necessidade de se «tornar
pura», se a intimidade for «manchada».
Como é usada simultaneamente em
vários sentidos, esta palavra estabelece uma identidade entre a moça – e por
extensão metonímica – a própria água onde ela lava a roupa, para, implicitamente,
também a tornar ou manter «alva» (= pura).
• Nomes:
- camisas:
. de linho ou de seda, vestiam-se
sobre a pele, quer pelo homem quer pela mulher, correspondendo à atual roupa
interior;
. simbolismo: a intimidade da donzela:
- vento:
. traduz o ambiente pouco ameno que,
pela agressividade, contrasta com a delicadeza da donzela;
. simbolismo:
- as preocupações e as
inquietações que o amigo provoca;
- o tumulto interior da
jovem;
- o sopro fálico que
pressupõe a relação sexual e a fecundidade a que se vê exposta – as camisas
representam o contacto com o corpo nu, ao passo que o vento que as leva, a presença
masculina reforçada pela aproximação metonímica entre o facto de transportar o
pólen e o papel masculino na relação sexual.
• Expressão «lavar
camisas»: como o banho nupcial era um ritual simbólico por parte da noiva,
lavar camisas permite associar a água à sensualidade feminina.
• Dois pontos: introduzem
um momento de suspense, anterior ao segundo verso do refrão.
• Anáfora: “Levantou-se…”/”levantou-se…”.
• Conjunção coordenativa
copulativa «e»: serve de elo de ligação entre a 1.ª e a 2.ª partes.
• Metáforas: giram em
torno das conotações que as palavras «alva» e «vento» possuem.
● Classificação
1. Cantiga de amigo (?): em
termos estritamente formais, o poema não poderá ser classificado exatamente
como uma cantiga de amigo, dado que a voz feminina está ausente. Contudo, quer
a protagonista, quer o cenário em que se movimenta são claramente
característicos da cantiga de amigo, pelo que é neste género que é inserida.
1.1. Temática: alva ou alvorada (faz referência à
madrugada/ ao amanhecer).
1.2. Formal:
- cantiga de refrão;
- cantiga de paralelismo perfeito e «leixa-pren».
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