● Assunto: Manuel de Sousa Coutinho revela a Maria a
identidade do retratado (D. João de Portugal) e aconselha a filha a dedicar-se
mais a atividades próprias da sua idade.
● Esta cena é
uma continuidade da anterior: Maria tinha questionado Telmo sobre o retrato de
D. João; Telmo é evasivo e não a elucida; Manuel de Sousa entra em cena e é ele
que lhe responde, sem subterfúgios.
● De facto,
Manuel de Sousa Coutinho entra em cena e revela a Maria a identidade do
cavaleiro do retrato (“Aquele era D. João de Portugal, um honrado fidalgo e um
valente cavaleiro.”), confirmando as dúvidas da filha: “Bem mo dizia o coração!”
Esta exclamação confirma as premonições de Maria, visto que, sem ninguém lho
afirmar, já sabia que o retrato era de D. João de Portugal.
O fidalgo refere-se a D. João de forma semelhante à
que fizera na cena 8 do Ato I: elogia e admira as suas qualidades e não tem
quaisquer ciúmes (afinal, morto ou não, tinha sido o primeiro marido de D.
Madalena).
Este comportamento contrasta com o de D. Madalena,
que receia o passado e sente uma culpa de que não consegue libertar-se. Pelo
contrário, Manuel de Sousa não tem nada que o faço sentir-se culpado e para si
o passado é apenas isso – o passado. Admira-o, respeita-o, mas não o receia.
● Maria não
reconhece o pai pela voz, apenas quando o vê, porque se encontrava obcecada pela
imagem de D. João.
● Manuel de
Sousa veio a casa de dia, embora encoberto com uma capa e um chapéu. Anda
escondido para escapar à perseguição dos governadores. A afronta dos incêndios
leva a que tenha de ir a sua casa disfarçado e de forma oculta. Perante a
preocupação e a inquietação da filha (“Mas de dia!... Não tendes receio, não há
perigo já?”), Telmo tranquiliza-a, dizendo-lhe que o maior perigo de represálias
por parte dos governadores castelhanos já tinha passado: “(…) sei pelo senhor
Frei Jorge que está, se pode dizer, tudo concluído.”
● Mais uma
vez, Maria revela ser uma jovem marcada pela doença: as mãos quentes e a testa
a escaldar (hipérbole) de febre são sintomas de tuberculose. Tal como sucede
noutros passos da obra, o pai pede-lhe que não pense tanto, que se divirta. De
facto, os progenitores consideravam que a reflexão em excesso e o estudo a
debilitavam ainda mais. Na realidade, Maria dedicava-se imenso aos estudos, lia
muito, questionava tudo, o que era invulgar para a sua idade. Por outro lado,
era uma jovem doente e a falta de distrações, de brincadeiras adequadas à sua
idade acentuam a sua debilidade. Além disso, os estudos eram ocupação de
homens, não de mulheres, mesmo aristocratas, que apenas deviam saber o
necessário para a sua condição na época: bordar, tocar harpa, organizar o
trabalho dos serviçais.
●
Retrato de Maria
Maria
confirma nesta cena e na anterior que é uma criança curiosa, precoce e
perspicaz, com uma intuição apurada: “(…) é que eu sabia de um saber cá de
dentro; ninguém mo tinha dito, e eu queria ficar certa.” Note-se, por exemplo,
que ela não sabia de quem era o retrato, mas parecia saber que pertencia a D.
João de Portugal, o dono da casa, como se tivesse o dom da adivinhação, daí que
o pai lhe chame «feiticeira» depois de a ouvir dizer que “sabia de um saber cá
de dentro”.
● Em determinado
momento da cena, Manuel de Sousa deixa de tratar a filha por tu e dirige-se-lhe
por você (“Ah! você sabia e estava fingindo?”). Esta mudança de tratamento
constitui uma repreensão carinhosa, visto que Maria questionou Telmo insistentemente
para saber quem era a figura retratada, colocando-a até numa posição
desconfortável, mas, logo de seguida, confessou que já sabia de quem era o
retrato.
●
Retrato de Manuel de
Sousa
Manuel
mostra ser bom pai, atento (“esta testa”, “Escalda!”), preocupado com a filha e
o resto da família. Por outro lado, demonstra ser franco e honesto, pois não esconde
a identidade do retratado no quadro, falando dele abertamente. Além disso, é
uma pessoa culta, como o reconhece Maria (“Manuel – Poetas e trovadores padecem
todos da cabeça…” / “Maria – E então pata que fazeis vós como eles? Eu bem sei
que fazeis.”), e revela uma profunda fé (“Valha-te Deus, Maria!”).
● Características trágicas da cena
▪ Agón: o conflito de D. João com Maria, que se manifesta nesta cena (tal como na
anterior) nos sonhos premonitórios e na sagacidade com que esta perscruta as
palavras e as meias palavras, os silêncios, os olhares, os gestos da mãe e do
pai, o conflito com Telmo, até lhe ser revelada a identidade da figura do
retrato.
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