Ao contrário de outros textos de
Agostinho Neto, este poema representa não apenas o sofrimento dos negros
colonizados, mas também as particularidades da sua cultura.
O sujeito poético abre o poema com
uma imagem da natureza, associa as árvores características de continente
africano (os embondeiros e as palmeiras) com seres humanos, humanizando-as, ao
referir-se a “braços erguidos” para remeter para os galhos e a “silhuetas
escuras”, isto é, a sombra das árvores. O sujeito poético realça nestes versos
a relação dos africanos com a natureza, nomeadamente com as árvores, que, como
já foi referido, são humanizadas, indiciando o seu valor sentimental. Por outro
lado, a sinestesia “cheiro verde” e a alusão ao fogo trazem para o poema os
cheiros e as cores africanos com estreita ligação à luta africana pela liberdade.
A segunda estrofe introduz novos
ambientes, como a estrada, um quarto e a cama, trazendo distintas visões do
povo: os trabalhadores que sofrem (os carregadores bailundos, isto é,
indivíduos que pertencem aos grupos étnicos dos Bailundos, de Angola); a mulata
enquanto representante da miscigenação e da vaidade feminina da mulher africana
(“a mulatinha de olhos meigos” – atentar na expressividade do diminutivo e do
adjetivo «meigos»); o homem africano com ideias e desejos estrangeiros como o
de “comprar garfos e facas para comer”. Além disso, é apontado um ambiente não
retratado concretamente, que é o vestuário da figura feminina: “A mulher
debaixo dos panos fartos remexe as ancas”, representando a musicalidade e a
alegria do povo que dança, ou até a fertilidade.
Na terceira estrofe, o sujeito
poético promove um encontro entre o humano e a natureza (“No céu o reflexo do
fogo”; “No ar a melodia quente das marimbas” – as marimbas são um instrumento
musical formado por placas de madeira ou de metal, graduadas em escala sobre
cabaças, que percutem com banquetas, ou seja, a música produzida pelos homens
em contacto com o ar e o fogo também produzido por eles refletindo no céu. “As
silhuetas dos homens negros batucando de braços erguidos” constitui a retoma ou
a lembrança / semelhança dos baobás descritos na primeira estrofe, reforçando a
ideia do encontro entre a espécie humana e a natureza.
A quarta estrofe repete excertos da
segunda, remetendo de novo para a musicalidade que perpassa todo o poema. Por
sua vez, o título da composição indicia que a poesia africana não aborda
apenas o sofrimento do africano, mas a cultura dos povos.
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