Léonie
era francesa, "cocote" luxuosa de mais de trinta mil réis. Não morava
no cortiço, e sim num sobrado na cidade. Prostituta de casa aberta, vivia
cercada de grande luxo. Os lábios eram pintados de carmim, as pálpebras de
violeta e o cabelo de loiro. Considerada de bom coração, tinha o rosto redondo,
malicioso e petulante, combinando com os dentes alvos. Bonita, possuía um bom
carro, frequentava teatros, bailes e "pagodes". Tinha muito dinheiro
para gastar. As roupas que vestia eram extravagantes: vestidos de seda sempre
enfeitados, sapatos da moda, luvas cano longo, sombrinha vermelha com muita
renda com o cabo enfeitado, chapéu chamativo, jóias de pedrarias circundadas
com muito brilhante, meias, muito luxo nas rendas e bordados. Ela tinha outra
afilhada, Juju, que morava com ela, filha de Augusta Carne-Mole com Alexandre,
que moravam no cortiço de João Romão. Léonie tinha o hábito de visitar a
comadre lavadeira no cortiço, em cuja casa se sentia muito à vontade.
Descalçava-se dos seus sapatos luxuosos para calçar os chinelos velhos dos
donos da casa. Ali, cercada de gente simples, transforma-se numa mulher de
elevada moral.
Léonie
era uma prostituta proveniente do cortiço que frequentava a alta roda da
sociedade carioca com seus amantes, e voltava sempre ao cortiço para ver a
afilhada. Atualmente, se Léonie fosse classificada, seria descrita como uma
mulher forte corajosa e à frente do seu tempo, como se pode notar na citação
abaixo: “Léonie, com as suas roupas exageradas e barulhentas de cocote à
francesa, levantava rumor quando lá ia e punha expressões de assombro em todas
as caras. O seu vestido de seda cor de aço, enfeitado de encarnado sangue de
boi, curto, petulante, mostrando uns sapatinhos à moda com um salto de quatro
dedos de altura; as suas lavas de vinte botões que lhe chegavam até aos
sovacos; a sua sombrinha vermelha, sumida numa nuvem de rendas cor-de-rosa e
com grande cabo cheio de arabescos extravagantes; o seu pantafaçudo chapéu de
imensas abas forradas de velado escarlate, com um pássaro inteiro grudado à
copa; as suas joias caprichosas, cintilantes de pedras finas; os seus lábios
pintados de carmim; suas pálpebras tingidas de violeta; o seu cabelo
artificialmente louro; tudo isto contrastava tanto com as vestimentas, os
costumes e as maneiras daquela pobre gente, quede todos os lados surgiam olhos
curiosos a espreitá-la pela porta da casinha de Alexandre” (AZEVEDO, 1997, p.
50). Como podemos observar no trecho do texto acima, Léonie era uma mulher
muito vaidosa, que sempre saia bem vestida, com roupas extravagantes,
perfumada, e é de certo que gostava de chamar a atenção de todos. Acontece que
o naturalismo tem por característica tratar a mulher como objeto sexual,
portanto desta forma Léonie sempre é vista de uma maneira pejorativa, ou seja,
sempre na busca de satisfazer seu apetite sexual, como podemos ver na citação: “-
Vem cá, minha flor! disse-lhe, puxando-a contra si e deixando-se cair sobre um
divã. Sabes? Eu te quero cada vez mais!... Estou louca por ti! E devorava-a de
beijos violentos, repetidos, quentes, que sufocavam a menina, enchendo-a de
espanto e de um instintivo temor, cuja origem a pobrezinha, na sua
simplicidade, não podia saber qual era” (AZEVEDO, 1997 p. 71). Como podemos
observar, Léonie era uma moça muito fogosa e que não dava descanso a ninguém,
muito menos as pobres mocinhas do cortiço. Assim sendo, no cortiço havia uma
jovem chamada pombinha, filha de uma viúva, antes com boas condições de vida,
teve que se mudar para o cortiço após o suicídio do seu marido. Mesmo assim a
mãe da garota, lhe dera boa educação, falava até francês, assim lia e escrevia
cartas para todos no cortiço além de prestar outros favores que demandavam uma
maior instrução, motivo pelo qual eram adorados por todos, chegando a ser
muitas vezes presenteadas pelos moradores, como pode-se constatar, a seguir:
Pombinha era muito querida por toda aquela gente. Era quem lhe escrevia as
cartas; quem em geral fazia o rol para as lavadeiras; quem tirava as contas;
quem lia o jornal para os que quisessem ouvir. Prezavam-na com muito respeito e
davam-lhe presentes, o que lhe permitia certo luxo relativo(AZEVEDO, 1997,
p.17). Na citação supracitada, mostra como era a vida da personagem Pombinha,
de como ela era querida por todos, por ser a pessoa que escrevia as cartas e
que lia o jornal de quem vivia no cortiço, Pombinha tinha lá seus
privilégios. A mãe apostava todas as
suas fichas no casamento da filha, pois esta casando-se com um bom partido,
conseguir sair do cortiço. Pombinha já estava noiva, entretanto como ainda não
havia tido sua primeira menstruação, era aconselhada pelos médicos a não se
casar, além do mais, a moça possuía uma saúde frágil.
Numa
das suas visitas ao cortiço, Léonie conhece Pombinha e logo se encanta pela
moça, de uma maneira “diferente”, passa a presenteá-la e a visitá-la, constantemente;
por fim, convida a moça e a mãe para jantarem em sua casa, convite que estas
aceitam. Durante o jantar, Léonie investe contra a moça todo o tempo; por fim,
quando a mãe desta, já embriagada de vinho, se vai deitar, a prostituta entra
no quarto da moça e passa a assediá-la, até que termina por praticar um
estupro, como podemos observar: “E, num relance, desfez-se da roupa, e
prosseguiu na campanha. A menina, vendo-se descomposta, cruzou os braços sobre
o seio, vermelha de pudor. - Deixa! segredou-lhe a outra, com os olhos
envesgados, a pupila trêmula. E, apesar dos protestos, das súplicas e até das
lágrimas da infeliz, arrancou-lhe a última vestimenta, e precipitou-se contra
ela, a beijar-lhe todo o corpo, a empolgar-lhe com os lábios o róseo bico do peito.
- Oh! Oh! Deixa disso! Deixa disso! reclamava Pombinha estorcendo-se em
cócegas, e deixando ver preciosidades de nudez fresca e virginal, que
enlouqueciam a prostituta. - Que mal faz?... Estamos brincando... - Não! Não!
balbuciou a vítima, repelindo-a. - Sim! Sim! insistiu Léonie, fechando-a entre
os braços, como entre duas colunas; e pondo em contacto com o dela todo o seu
corpo nu (AZEVEDO, 1997, p.71).
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