A superficialidade do romantismo de
Emma fica clara nas suas interações com Leon, que compartilha do seu amor pelos
sentimentos e paixão excessivos. A conversa de Emma com Leon no jantar é banal
e sentimental – eles discutem como os livros os transportam para longe das suas
vidas quotidianas –, mas para os dois parece arrebatadora e significativa. Ela
desafia o seu casamento estável, todavia insatisfatório, com um relacionamento
baseado em declarações falsamente profundas, em vez de sentimentos verdadeiros.
O nascimento da filha de Emma sublinha o materialismo dos
seus sentimentos, mas também introduz alguns dos argumentos feministas do
romance. Ela deseja ser uma figura materna apenas quando parece que o papel
pode ser glamoroso. Assim que percebe que não pode comprar roupas e móveis
caros para a bebé, o seu interesse desvanece-se, e vemos que o seu único
interesse pelo filho constitui um meio para realizar os seus próprios desejos.
Emma sonha ter um filho, porque acredita que ele terá o poder que lhe falta a
ela. Essa declaração franca mostra que Flaubert estava ciente e talvez
desaprovasse as liberdades concedidas às mulheres no final do século XIX. Emma
observa que “um homem, pelo menos, é livre; ele pode explorar todas as paixões
e todos os países, superar obstáculos, saborear os prazeres mais distantes. Mas
uma mulher é sempre prejudicada.” Os amantes de Emma desfrutam sempre de uma
liberdade que ela não possui.
A descrição de Flaubert do mundo
mundano que rodeia Emma é realista, mas um tanto exagerada. Ele usa uma linguagem
poética e florida para descrever Yonville, referindo que “o campo é como um
grande manto desdobrado com uma capa de veludo verde bordada com uma franja de
prata”. Mas Flaubert também reconhece a banalidade do cenário quando se refere
a “uma terra mestiça cuja linguagem, como a sua paisagem, não tem sotaque nem
caráter”. Ao descrever a mesma cena de maneiras contrastantes, Flaubert produz
dois efeitos. Primeiro, diferencia-se dos seus antecessores românticos, que
teriam avaliado uma cena monótona como indigna de sua atenção. Em segundo
lugar, faz contrastar a banalidade que Emma vê com a beleza que um estranho
pode perceber. Flaubert estabelece assim que, embora a protagonista possa estar
certa sobre o tédio da vida na aldeia, também é incapaz de captar uma camada de
beleza que a sua perspetiva é muito estreita para abarcar.
Os aldeões que cercam Emma proporcionam-nos
um contexto para entender historicamente o estatuto social de Emma. A ama de
leite que ela visita, por exemplo, mora numa pequena cabana com as crianças de
que cuida. Quando vê a protagonista, implora por pequenas necessidades – um
pouco de café, um pouco de sabão, um pouco de conhaque. Embora Emma continue
infeliz porque não pode socializar com a aristocracia em Paris, a sua visita à
ama de leite mostra-nos que está vive, comparativamente, bem. A estalajadeira
da aldeia, por sua vez, é uma mulher prática cujas únicas preocupações são se a
refeição será servida a horas e se os bêbados que frequentam a pousada vão
destruir a mesa de bilhar. Embora ela não tenha imaginação, também representa
algo que Emma não: uma mulher que aceita e gosta da sua vida.