A obra
aparece-nos como um conjunto de histórias que se vão acumulando, narradas por
alguém que só diz delas o que quer e quando quer. A ação central é
continuamente interrompida por uma série de pequenas histórias narradas pelo
narrador omnisciente, que servem para caracterizar ambientes e personagens.
Estas pequenas histórias surgem desordenadamente, frequentemente fora da
sequência lógica do tempo, não se vislumbrando uma estruturação lógica da
intriga. A grande atenção da narradora está em transmitir o pormenor quer da
paisagem, quer do aspeto e atuação das personagens (seu vestuário, seu modo de
vida, suas reações somáticas) de modo a captar o seu universo psicológico. Daí
o facto de muitas delas serem interrompidas para voltarem a ser retomadas
posteriormente.
Uma das formas
de agrupar as várias ações secundárias é com base na sua funcionalidade.
a) Ações que se
relacionam com Quina, personagem central, desvendando as suas características
psicológicas e as suas relações com os outros:
"Quina
tornou-se, então, dum grande interesse para ela, e mandou chamá-la. (...)
- Ora viva a
Sibila! - disse, com mais riso na voz do que nos lábios. (...) Dirigiu-se a
Quina como se se tratasse duma velha amiga perante a qual as cerimónias nem
lembram e são supérfluas.
- É maluquice
minha, mas eu queria que me dissesse uma coisa: se alguém a ofendesse muito,
perdoava, retribuía ou esquecia?
- Perdoava a
uma criança, retribuía a uma mulher; tratando-se de um homem, esquecia.
- Ah! - Com um
certo pasmo, a condessa fitou Quina. Começava a respeitá-la, antes mesmo de a
ter entendido.
- Acha então?!
(...)
- Ah, Joaquina
Augusta - disse ela dando-se à canseira de se fingir pensativa -, haverá muita
gente assim, pelo mundo? É que diz palavras de iluminada, como se só contasse
um chiste.
- Doutra
maneira, quem me ouvia?" (pp. 76-77)
b) Ações que se
relacionam com as personagens secundárias, mostrando a sua caracterização
psicológica e o seu comportamento e relacionamento:
"- Ela já
morreu - dizia. - Antes de hoje e há muito tempo que ela estava morta. Já a
pariste morta, porque as tuas entranhas são amaldiçoadas. Quando viste os teus
filhos estendidos numa tábua em cima da cama, não choraste uma lágrima que
enchesse um dedal; porque também tu estás morta, e os teus frutos são uma
desgraça. (...)
Tossia e
gritava, e as patadas das tuas botas reboavam pela casa. - Se a menina não
aparecer, se ela não vier ter aqui, trazida pelos anjos e pelos diabos, e sem
que um pico de tojo lhe tenha arranhado a pele, abro uma cova no quinteiro e
enterro-te lá. Ouves?
- Ela não torna
a aparecer - disse Estina, debilmente. (...)
- Não? - E ele
vacilou na sua cólera." (p. 117)
c) Ações que
nos fornecem imagens do ambiente social onde se insere a protagonista:
" Porque
acontecera ser o sétimo rapaz duma família, fora batizado com o nome de Adão,
para evitar assim o correr do fado, ou seja, ficar condenado a vadiar de noite,
transformado em bácoro, ou cavalo, ou bode, ou toiro, em cujo rasto espolinhado
se espojasse. Ah, e então apenas uma labareda, à meia-noite, consumindo-lhe as
roupas que abandonou, um espinho ou um chuço ferindo o bicho que corre
desabaladamente pelos atalhos, podem quebrar o encanto! Melhor é chamar, pois,
Eva às quintas ou sétimas filhas e que Adão sejam os infantes todos que venham
perfazer esses fatídicos números." (p. 40)
d) Ações que
contêm elementos temáticos que constituem o substrato ideológico da obra:
"- Olha
que o teu homem dorme com essa moça - prevenira Narcisa Soqueira, avisada como
era em intrigas de harém provinciano. (...)
- Cantês! -
disse Maria, com a sua secura habitual. (...)
Uma tarde, não
muito depois disto, quando a merenda já fora servida e a moça se preparava para
arrumar as camas que às vezes até à noite se faziam, Maria despediu-a também
para o campo. Fazia muito calor. A sala, que era ao mesmo tempo quarto de
dormir, tinha aberta as portadas da varanda. Da eira subiam cepas que tinham
ganho corcovas, o jeito dos ferros que enlaçavam. Foi um desses pés de videira,
cuja casca, já velha, desfibrava, que Francisco usou para trepar, disposto a
representar com rigor a cena do balcão. Maria que, inclinada sobre a cama,
lançava a ponta da coberta contra a parede, sentiu-se abraçada pela cintura;
umas suíças loiras roçavam-lhe o rosto. Ela endireitou-se sem muita pressa,
disse, com uma indiferença que era como uma chicotada:
- Como te
enganaste!" (pp. 34-35)
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