Esta
cantiga de escárnio e maldizer, da autoria de Afonso Anes do Cotom, chegou até
nós incompleta: uma única estrofe (sétima) com rima interpolada e emparelhada. Nela,
compara-se o aspeto físico de três maljeitosos: o próprio trovador, João
Fernandes e Pero da Ponte, o qual levaria a palma aos outros dois.
O
sujeito poético começa por referir que tem a fama ou reputação – que não é
despropositada, ou seja, é certeira – de ser maljeitoso. Para que não haja
dúvidas, volta a confirmar que concorda com essa apreciação: “e nom erram i”.
O verso
três refere-se a um tal Joam Fernandes, figura de difícil identificação, desde
logo por se desconhecer o seu apelido. Se considerarmos que a cantiga datará de
cerca de 1241 e terá sido produzida em Castela, poder-se-ia tratar de Juan Fernández
Valdés, senhor de Beleña, que faleceu na batalha de Martos, em Jaen, em 1275.
Um outro candidato seria João Fernandes de Lima, marido da Ribeirinha, a famosa
barregã de D. Sancho I, após a morte do monarca, e que antes tinha sido casado,
em primeiras núpcias, com Berenguela Afonso de Baião, tia do trovador D. Afonso
Lopes Baião. Desempenhou cargos importantes nos reinos de Leão e Portugal,
tendo falecido por alturas de 1245.
Joam
Fernandes pertence também ao grupo dos maljeitosos. Ele é conhecido pela alcunha
de “o mouro” por causa do seu aspeto físico, como é confirmado pela rubrica de
uma cantiga de Martim Soares (“Joam Fernándiz, um mour’est aqui”).
Outro
dos homens que faz parte do grupo é o trovador Pero da Ponte, que supera os
dois anteriormente citados. De facto, se alguém o visse em «cós», isto é, sem
manto, em corpo bem feito, parecer-lhe-ia “moi peor talhado”, ou seja, o mais
maljeitoso.
Em
suma, esta cantiga constitui uma sátira dirigida a três figuras específicas (o
próprio Afonso do Cotom, João Fernandes e Pero da Ponte) e à sua aparência.
Ironicamente, o sujeito poético inclui-se no grupo dos maljeitosos, o que pode
configurar uma forma de autoironia, através da qual ri de si mesmo, enquanto satiriza
os demais.
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