Chorosos versos meus
desentoados,
Sem arte, sem beleza e sem
brandura,
Urdidos pela mão da Desventura,
Pela baça Tristeza envenenados:
Vede a luz, não busqueis,
desesperados,
No mudo esquecimento a sepultura
Se os ditosos vos lerem sem
ternura,
Ler-vos-ão com ternura os
desgraçados.
Não vos inspire, ó versos,
cobardia
Da sátira mordaz o furor louco,
Da maldizente voz a tirania.
Desculpa tendes, se valeis tão
pouco;
Que não pode cantar com melodia
Um peito, de gemer cansado e rouco.
Estamos
perante um código óptico-grafemático que nos conduz para um texto poético. Há,
no entanto, a interação de vários códigos que vão configurar o texto literário.
a) Análise temática
O poeta
dirige-se aos seus versos num tom desiludido, reconhecendo a sua pouca valia,
mas desculpando-os ao mesmo tempo, quando afirma “Que não pode cantar com
melodia / Um peito, de gemer cansado e rouco.”
A própria
produção do poeta, o soneto, serve para ele se dirigir aos seus versos, o que
faz com que se crie um distanciamento do poeta em relação aos seus versos,
porque só com esse distanciamento os pode analisar e avaliar. Em relação aos
seus versos, reconhece que são “... sem arte, sem beleza e sem brandura...” e
ainda desentoados: o poeta faz aqui uma autocrítica e apresenta-se desiludido,
desilusão essa que, porém, é justificada.
O poeta
vai apelar à valia dos seus versos. De facto, para os desgraçados eles são
dotados de valor.
Apesar
de valerem pouco, exorta-os a não desanimarem e a continuar. Ao usar o
condicional, mostra que pensa que os ditosos também os podem apreciar. Na
verdade, se forem rejeitados pelos ditosos, o mesmo não acontecerá com os
desgraçados, ou seja, os ditosos podem também ler os versos com interesse, à
semelhança daqueles que tenham um espírito semelhante ao do poeta.
A temática
deste soneto tem sido colocada em vários grupos e Hernâni Cidade inclui-o no
grupo “como o poeta se retrata e a sua obra”.
Outra temática é a oposição entre a luz e a escuridão (sepultura).
Ao contrário do que é comum na literatura pré-romântica, não se apela aqui para... (para continuar a ler a análise, clica aqui »»»).
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