Homero, durante a narração, estabelece vários paralelismos. No caso deste canto, os desejos e as ações dos Gregos e dos Troianos são apresentados de forma paralela. Por exemplo, Heitor ataca Ájax com uma determinada arma e este contra-ataca usando o mesmo utensílio de guerra, geralmente causando mais dano no adversário; durante a trégua, o poeta descreve a dor dos Troianos enquanto queimam os seus mortos para, de seguida, fazer o mesmo com a dos Aqueus. A existência de uma causa comum, de uma dor comum, etc., e o seu reconhecimento vinculam os inimigos aos mesmos princípios de honra.
Um desses princípios comuns
prende-se com o respeito pelo outro e a dignidade individual. Exemplo disso é o
duelo entre Heitor e Ájax, que termina com a troca de armas e com um pacto de
amizade. O equilíbrio entre valores opostos, como a amizade e a inimizade, são
uma das evidências de um indivíduo digno.
Outro desses princípios tem a ver
com a importância dada ao sepultamento dos mortos. Tal como o fantasma de
Pátroclo afirma no Canto XXIII, o espírito de uma pessoa não entraria no mundo
dos mortos até que fosse devidamente sepultado. Deixar uma alma por enterrar
ou, pior, deixá-la como carniça para os animais selvagens, era um desrespeito
para com o morto e pelas tradições religiosas da época. É tudo isto que preside
ao estabelecimento da trégua na guerra. Note-se que, no caso da Ilíada,
os corpos eram queimados numa pira, embora também houvesse casos na época de
enterramento. Os ossos sobrantes na pira eram guardados numa jarra ou caixa
decorativa, ou, em alternativa, enterrados junto ao local onde o corpo fora
incinerado.
Por último, uma chamada de atenção
para a atuação dos deuses, que volta a revelar a sua mesquinhez e
superficialidade. A preocupação, no final do canto, de Poseidon ao ver os
Gregos erigir as suas muralhas tem a ver unicamente com o facto de tal obra
poder ofuscar a muralha que ele construiu em redor de Troia. Por outro lado, a
cena chama a atenção para o respeito que é devido sempre aos deuses, pois eles
podem destruir as obras humanas com grande facilidade e por mero capricho.
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