. As crónicas de Fernão Lopes
enquadram-se numa fase da língua portuguesa normalmente conhecida como português antigo e exibem construções
sintáticas, expressões e vocabulário com marcas da língua de um período de
amadurecimento. Apesar dos arcaísmos (“talente”, “aadur”, “açalmamento”) e de
construções arcaicas (“Ca nenhuu por estonce podia outra cousa cuidar”), é claro
que a língua portuguesa já sofreu uma evolução que a distingue dos seus
primórdios.
. Na Crónica de D. João I, a narração
alterna com a descrição e com o diálogo para incutir vivacidade e energia no relato dos
episódios mais relevantes da Crise de 1383-1385. Fernão Lopes cria ritmo e
tensão através da forma expressiva de narrar os acontecimentos e da introdução
de discurso direto no relato (“– U matom o Meestre?”).
. A vivacidade, o ritmo e a
emoção das personagens são também conseguidos através de características do
discurso como as marcas de oralidade
e a simplicidade da linguagem
(registo corrente e vocabulário familiar), os verbos de movimento, os verbos
introdutores do discurso (“bradar”), as interjeições e as apóstrofes (“Ó
Senhor!”). O dinamismo da ação resulta do uso de tempos, formas e aspetos
verbais como o imperfeito do indicativo, o gerúndio e o aspeto durativo. O uso
de recursos expressivos é relativamente parco e pouco vai além da comparação,
da metáfora e da personificação.
. As descrições são pautadas
pelo forte apelo visual, isto é,
pelo visualismo. O narrador
desempenha o papel da testemunha dos acontecimentos; percorre os espaços e
caracteriza os lugares, o ambiente e as figuras (indivíduos ou grupos) que
encontra. O uso de verbos associados ao olhar (“oolhae”, “vede”) ajuda a
salientar o visualismo das situações descritas. Por vezes, as sensações visuais são associadas às
auditivas (cap. XV).
. Numa técnica semelhante à do
cinema ou da reportagem, o narrador
percorre os espaços, detendo-se em figuras individuais ou em grupos, como
sucede na descrição do sofrimento do povo de Lisboa (cap. CXLVIII). Em
colaboração com as outras técnicas anteriormente descritas, assim se consegue
criar um estilo expressivo que põe em destaque pormenores patéticos (ou seja,
de sofrimento) da situação descrita.
. Articulação entre objetividade e subjetividade:
- Objetividade presente no rigor da pormenorização (exs.: descrições
pormenorizadas com valor descritivo e informativo);
- Subjetividade presente na apreciação crítica e emotiva dos factos
relatados (exs.: interrogação retórica, frase exclamativa).
. Coloquialismo:
- Interpelação do interlocutor
(narratário), recorrendo à 2.ª pessoa do plural e à apóstrofe;
- Utilização do verbo ouvir, sugerindo a interação oral;
- Reprodução de cantigas
populares;
- Uso de palavras / expressões
de sabor popular e / ou arcaizante.
. Visualismo e
dinamismo:
- Articulação entre planos gerais (focalização da cidade e dos
atores coletivos aque nela intervêm) e planos de pormenor (incidência em grupos
de personagens e / ou em situações particulares);
- Recriação dos acontecimentos de forma dinâmica;
- Emprego de vocábulos que marcam o sensorialismo da linguagem
(atos de ver e ouvir);
- Emprego de recursos expressivos que conferem visualismo ao
relato: comparação, personificação, enumeração, hipérbole.