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quarta-feira, 20 de dezembro de 2023

Viver no presente


Dave Whamond

Análise do poema "A abelha que, voando, freme sobre", de Ricardo Reis


    Nesta ode, Ricardo Reis socorre-se de um inseto, uma abelha, para demonstrar o contraste entre a mudança que ocorre na vida do ser humano e a imutabilidade da Natureza.
    Assim, neste poema de três quadras, o «eu» começa por descrever uma situação em que uma abelha, ao aproximar-se de uma flor e ao pousar nela, se confunde com esta aos olhos de quem não presta atenção, “À vista que não olha”. A ideia expressa na primeira quadra apenas se conclui no primeiro verso da segunda (transporte): a abelha não mudou desde a Antiguidade, representada por Cecrops, o lendário fundador e rei de Atenas (entre 1558 e 1508 a.C.), que ensinou aos gregos a leitura, a escrita, o casamento e o cerimonial do sepultamento.
    Pelo contrário, o “ser que se conhece”, isto é, o ser humano, que tem consciência de si mesmo e da sua individualidade, ao contrário do que sucede com os elementos da Natureza, envelhece de forma distinta dos outros membros da sua espécie. Dito de outra forma, o ser humano tem consciência de que envelhece, é diferente dos outros seres e vai morrer, ou seja, conhece-se.
    A «abelha» é a mesma que outra que não ela.”, isto é, é igual a qualquer outra abelha, de qualquer época, sem diferença ou individualidade, ao contrário dos seres humanos, que, marcados pelo tempo, pela alma, pela vida e pela morte (atente-se na enumeração e sucessão de apóstrofes), «compram» (metáfora) “Ter mais vida que a vida”, ou seja, procuram algo mais do que a vida naturalmente lhes oferece (sonhos, desejos, arte, cultura, etc.). Essa demanda é, todavia, mortal, já que implica sofrimento e dor, desde logo porque o Homem está condenado à morte, que tudo reduz a pó. Mas não é esse, afinal, o desejo do ser humano, isto é, ser diferentes dos demais animais e não se limita a viver? “Ter mais do que a vida”.
    Assim, neste poeta, o «eu» poético estabelece o contraste entre o ser humano, a única entidade que é consciente de si mesma, e os outros animais, representados aqui pela abelha, que são iguais e imutáveis. Além disso, o ser humano envelhece e morre de forma diferente dos outros animais, exatamente porque é um ser consciente, desde logo de si, e, por isso, sabe que envelhece e morre e esta consciência, este saber que, provocando-lhe dor, angústia, sofrimento. Enquanto ser irracional, a abelha de nada tem consciência, daí que não sofra, por exemplo, com a passagem do tempo, o envelhecimento e a morte. A abelha é a mesma desde a Antiguidade, o ser humano envelhece e diferencia-se dos outros elementos da sua espécie, é único e mortal.
    Em suma, para Ricardo Reis, a questão que diferencia o ser humano e os animais é a mortalidade do primeiro e a imortalidade dos segundos, neste caso não em sentido literal, mas figurado, ou seja, a abelha, o exemplo de que se socorreu o poeta, é tomada como um elemento de uma espécie [morre uma abelha, nasce(m) outra e assim sucessivamente]. Pelo contrário, o Homem é encarado, não em termos de espécie, mas como ser individual.

Análise do poema "As mãos da noite postas sobre a mesa : uma palma", de Manuel Gusmão


 
As mãos da noite postas sobre a mesa : uma palma


As mãos da noite postas sobre a mesa : uma palma
oblíqua à espera da surda cabeça da manhã:
– a outra escura como se abrem as folhas do chá.

 
Uma recordação e a sua névoa; um rosto indeciso
entre o sono e o sonho, entre o corpo do brilho
e a cintilação da noite :  as figuras quebradas.

 
A ondulação é mais pressentida que avistada. Pode
ser apenas a circulação do sangue no animal ereto,
a tremulante auréola dos fetos arbóreos. Ou

 
a luz que sobe da mesa onde as mãos esperam, ou
do chão sobre que dançamos a dança. Tomo
irrepetível a curva infinita de uma linha, onde


O teu corpo não cessa de ter nascido. Não cessa


    Este poema de Manuel Gusmão abre com uma imagem das mãos da noite – personificada – postas sobre a mesa, indiciando uma atmosfera de silêncio, espera, contemplação. O que simbolizará a peça de mobiliário? Um local de espera? De encontro? De espera? Uma das palmas é ou está oblíqua, isto é, inclinada desviada, sugerindo uma atitude de espera, enquanto a outra é escura, como as folhas de chá que se abrem na água quente. A comparação que aqui é feita indicia uma atitude de mistério, de profundidade e revelação, a partir da alusão à noite e à escuridão. Por outro lado, associa a mão a um movimento ou abertura subtil (“como se abrem as folhas do chá”), que remete para uma revelação gradual que se vai operando. Recuando ao verso anterior, a mão cuja palma é oblíqua está à espera da “surda cabeça da manhã”, ou seja, à espera do nascer do sol, que sucede sem se ouvir. O amanhecer surge silenciosamente.
    Na segunda estrofe, o sujeito poético alude à memória, que está envolta em «névoa», isto é, estamos perante uma memória que não é clara, que é vaga ou distante. O “rosto indeciso” representa a indefinição “entre o sono e o sonho”, entre o corpo do brilho e a cintilação da noite, o que pode constituir uma imagem poética que aponta para uma fronteira entre a vigilância e a sonolência.
    O terceiro terceto apresenta-nos uma ondulação apresentada como algo pressentido, não necessariamente visto, isto é, trata-se de um movimento suave e ritmado que é mais sentido do que visto, mais intuído do que percebido. O «eu» poético coloca em questão se essa ondulação pode ser apenas a circulação do sangue no animal ereto, isto é, no ser humano. Pode referir-se também à “tremulante auréola dos fetos arbóreos”, quer dizer, a luz que se reflete nas folhas dos samambaias, plantas antigas e resistentes que simbolizam a vida e a renovação. Pode ainda ser “a luz que sobe da mesa onde as mãos esperam”, ou seja, a claridade que se eleva da mesa onde as mãos descansam, a claridade que brota do local onde a noite está presente. A referência ao “chão sobre que dançamos a dança” (pleonasmo) aponta para uma ligação à terra e para o caráter terreno e ritualístico da vida, uma expressão artística – a dança –, uma celebração da vida. A dança desde sempre constitui uma forma ritualizada de celebração com múltiplos significados, desde ritos de agradecimento ou de celebração dos deuses até formas de sedução do outro. O recurso à conjunção coordenativa disjuntiva «ou» indicia a multiplicidade de interpretações possíveis.
    Os dois últimos versos oferecem diferentes possibilidades de interpretação. A forma verbal «tomo» remete para uma escolha: ele toma irrepetível a curva infinita de uma linha, na qual o “teu corpo não cessa de ter nascido”, isto é, o corpo do «tu» (a pessoa amada? a vida?) está em constante renovação e transformação.

O tema do sacrifício do filho / A intertextualidade no conto "A Aia"


    O tema do sacrifício do filho surge em textos seminais do Oriente, como, por exemplo, a Bíblia, através de Abraão, e a mitologia grega, através de Ifigénia, personagem da Ilíada.
    Na Bíblia, no Génesis, Abraão oferece o seu filho primogénito, Isaac, em sacrifício para provar a sua fidelidade à divindade. Ora, o ritual é interrompido pelo próprio Deus, que considera que o gesto de Abraão constitui já prova de amor e adoração.
    Há uma relação entre o gesto de Abraão e a atitude da aia: a lealdade. Tal como sucede com a figura bíblica, também no conto de Eça se confrontam a fidelidade a um Senhor e o amor ao filho. No entanto, na casa da ama de leite, a lealdade é levada ao extremo, tanto que o amor de mãe se torna secundário perante a submissão à rainha e aos interesses do reino. Ao contrário do que sucede na narrativa bíblica, o sacrifício do filho da aia não é interrompido por nenhum Deus piedoso; o seu filho não é substituído pelo cordeiro, antes se torna o cordeiro que substitui o príncipe.
    O episódio da Ilíada tem contornos semelhantes: o sacrifício de Ifigénia. Agamémnon provocou a ira de...


    Continuação da análise: aqui.

Relação do conto "A Aia" com os contos de fada


    A expressão “Era uma vez” remete-nos para o mundo atemporal da fantasia, bem característico dos contos de fadas.

    Por outro lado, a lealdade da aia à rainha e ao pequeno príncipe, traduzida em última análise no facto de tirar a vida ao próprio filho para salvar a do futuro rei, sugere uma aceitação e uma felicidade em ser servo. Essa servidão atinge o auge no momento em que a serva sacrifica o próprio filho, tornando o amor de mãe em secundário para que a lealdade à rainha e ao reino seja superior e prevaleça.

    Deste modo, a felicidade parece estar reservada aos nobres: quem vai viver e ser feliz é o príncipe e não o bebé escravo. Por outro lado, o bem público parece prevalecer sobre...


    A análise continua aqui → a-aia-e-os-contos-de-fadas.

A moralidade do conto "A Aia"


 
O conto exemplifica a eterna luta entre o Bem e o Mal. A aia, a rainha e a população do reino, por exemplo, representam o Bem: a aia é leal, sente ternura pelo príncipe e comporta-se de forma admirável; a rainha tem amor pelo escravozinho, sente-se “desventurosa” por o reino estar em perigo e “ditosa” pela salvação do filho; o reino tinha “casais e aldeias felizes” e a população era “fiel” e recompensava quem praticava boas ações. Por seu turno, o bastardo e a sua «horda» representam o Mal: o irmão do rei é caracterizado como “bastardo cruel”, “homem depravado e bravio”, “um homem de rapina”, que, com a sua horda, executa a matança.

 
Por outro lado, Eça pretendeu criticar a sociedade do seu tempo, o século XIX, nomeadamente a escravidão e a inferioridade do negro. Apesar de o herói ser uma mulher, escrava e negra, essa ascensão da aia só vem acentuar as diferenças sociais.

 
Eça tem em mira o pensamento dogmático e conservador que estipula a soberania do rei sobre o súbdito, do nobre sobre o plebeu, do rico sobre o pobre; em suma, do senhor sobre o servo que, ao reconhecer essa suposta soberania, é impelido ao sacrifício extremo.

 
Alegoricamente, o tio representa as fissuras da ordem colonialista. Deste modo, Portugal, na sua dimensão intercontinental, apresenta-se como serva possuidora de um filho de pele escura que é capaz de sacrificar em defesa do “status quo”, particularmente das suas relações com a Inglaterra.

 
O conto condena a ambição desmesurada e exalta a fé, a lealdade e a fidelidade, socorrendo-se de um tempo passado, longínquo, mas que porta consigo uma certa autenticidade, na esteira das narrativas tradicionais, como a fábula e a lenda, que são portadoras de uma verdade que ratifica valores coletivos. Ao retomar essa tradição narrativa de base oral, Eça, através da figura da aia, apresenta ao leitor valores como a lealdade, a fidelidade e a fé. Disseminados pelo poder e, uma vez assimilados pelos dominados, esses valores perpetuam a dominação.

 
Publicado em 1893, o conto surge pouco depois do Ultimatum inglês, que colocou Portugal numa situação de submissão e humilhação face à Inglaterra, nomeadamente no que diz respeito à posse das colónias africanas de Chire e das regiões habitadas pelos Macalocos e os Machonas, sob a ameaça de rompimento diplomático (que implicaria perdas económicas incalculáveis) e a invasão da esquadra britânica em Gibraltar. Assim, Portugal passaria da condição de poderoso colonizador com posição de destaque no cenário europeu desde o século XVI, à posição de nação serva e subjugada ao poderio inglês. Tal episódio representa a decadência gradativa do país. O facto de a ação se localizar na Índia, território que Portugal sempre quis atingir, remete para o poderio do império marítimo português, que teve como uma das suas principais conquistas a rota para as Índias em 1492, e tal poderio sucumbia às mãos das imposições inglesas. Assim, Eça pretenderia, com este conto, abordar simbolicamente a situação histórica vivida pro Portugal naquela época.

 
Numa leitura alegórica, a morte do rei – além de ecoar, por similitude – o desaparecimento de D. Sebastião – parece aludir à perda dos ideais colonialistas nostalgicamente evocados através da referência à longínqua Índia, com todos os seus tesouros: “pedrarias, galas e céus sumptuosos”.


A linguagem do conto "A Aia"



Advérbio de modo:
- “magnificamente”, “desoladamente”, “ansiosamente”: contribuem para expressar a emoção da rainha após a morte do rei;
- “Serva sublimemente leal!”: o advérbio de modo e a exclamação realçam a fidelidade da serva.

 
Diminutivo (“filhinho”, “principezinho”, “criancinha”, “corpinho”, “escravozinho”): traduz o carinho que rodeia os dois bebés e realça a forma como a rainha vê o seu filho, isto é, como um ser humano frágil e indefeso (“filhinho”), que urge defender; caracterizam os bebés, acentuando a sua fragilidade e insegurança.

 
Verbos expressivos:

- “tremia”: exprime o receio e a preocupação da Aia pelo principezinho, por causa da sua fragilidade;

- “Então […] arrebatou o príncipe do seu leito de marfim”: o verbo «arrebatar» evidencia a rapidez e a convicção com que a aia troca as crianças de berço.

 
Adjetivação expressiva:

- contribui para a caracterização das personagens: “bela e robusta escrava”, “cabelo louro e fino”, “pobre e de verga”, “cabelo negro e crespo”;

- indicia a preocupação, a ansiedade e a angústia com o destino do principezinho e o seu crescimento: “longa distância”, “anos lentos”;

- “beijos pesados e devoradores”: a dupla adjetivação posposta ao nome realça o afeto, o carinho, o amor que a asia nutre pelo filho.

 

Metáforas:

- “faminto do trono”: exprime o forte desejo do trio por usurpar o trono e o ocupar;

- “E sem que a sua face de mármore perdesse a rigidez” realça a rigidez e a lividez da face da Aia, sugerindo a sua apatia e ausência de vida;

- “cabelos de ouro”: os cabelos louros do principezinho;

- “a flor da sua nobreza”: sugere que os que pereceram faziam parte da elite da nobreza, eram os melhores dentre os melhores;

- “Uma roca não governa como uma espada”: a metáfora e a comparação enfatizam o poder desigual e a fragilidade da mulher (“roca”) em relação ao homem (“espada”) numa sociedade tradicional, isto é, uma mulher não tem a capacidade guerreira de um homem – a rainha é incapaz de defender o reino após a morte do rei;

- “O bastardo, o homem de rapina […]”: a metáfora mostra o caráter violento e cruel do tio do príncipe; por outro lado, o uso do determinante artigo definido confere-lhe um sentido de generalização e singularidade, como se ele fosse o único e o pior de todos os seus semelhantes;

- “acendeu um maravilhoso e faiscante incêndio de oiro e pedrarias”: sugere o brilho intenso produzido pelo tesouro do palácio, bem como a sua beleza a extrema riqueza;

- “… valia uma província.”: sugere que o punhal escolhido pela aia era muito valioso.

 

Comparações:

- “de face mais escura que a noite e coração mais escuro que a face” (vide hipérbole):

- “Os olhos de ambos reluziam como pedras preciosas”: realça a beleza e o brilho dos olhos dos bebés;

- “à maneira de um lobo”: intensifica o caráter cruel e selvagem do tio;

- “Nenhum pranto correra mais sentidamente do que o seu pelo rei morto”: mais do que qualquer outra pessoa, a aia chorou copiosa e sentidamente a morte do seu rei;

- “Só a ama leal parecia segura – como se os braços em que estreitava o seu príncipe fossem muralhas de uma cidade…”: a comparação aponta para as ideias de proteção e coragem. A ama leal é a personagem que cuida do filho da rainha, que está em perigo por causa de um inimigo que ataca o reino. A comparação entre os braços da ama e as muralhas de uma cidade sugere que ela é capaz de defender o príncipe com a sua força e determinação, mesmo que esteja cercada de medo e insegurança. A comparação também cria um contraste entre a fraqueza da rainha, que apenas sabe chorar, e a firmeza da ama, que parece segura;

- “… um corpo tombando molemente sobre lajes, como um fardo”: indica o modo como o corpo do tio caiu, morto, no chão, isto é, de forma simultaneamente mole e pesada;

- “A mãe caiu sobre o berço, com um suspiro, como cai um corpo morto.”: mostra a reação de alívio e, simultaneamente, o esgotamento físico e emocional da rainha ao constatar que, afinal, o seu filho está vivo;

- “Nos seus clamores havia, porém, mais tristeza do que triunfo.”: sugere que os habitantes da cidade, que acabaram de derrotar o inimigo que os ameaçava, não sentem alegria nem orgulho pela sua vitória, mas sim dor e luto pelos seus mortos;

- “… seria no Céu como fora na Terra.”: sintetiza a visão do mundo e as crenças da aia;

- “… arrancou a criança, como se arranca uma bolsa de oiro”: acentua a violência do ato (rapto do bebé) e a sua motivação (o dinheiro).

 

Exclamações:

- “Pobre principezinho da sua alma!”: traduz a ansiedade e a preocupação em torno do crescimento do principezinho, face à sua fragilidade e aos perigos que o cercam.

 

Repetição:

- “forte pela força e forte pelo amor”: reforça a ideia de grandeza do reino, nascida não só da força, mas também do amor.

 

Antítese:

- “cabelo louro e fino” / “cabelo negro e crespo”: marca o contraste físico entre os dois bebés – o príncipe e o escravo;

- “mãe ditosa” / “mãe dolorosa”: a mãe ditosa é a rainha, que fica feliz por o seu filho estar vivo e salvo, enquanto a mãe dolorosa é a Aia, que está triste e repleta de dor pela perda do seu filho.

 

Eufemismo:

- “[…] os seus pajens tinham subido com ele às alturas”: suaviza a morte dos pajens, o que está de acordo com as crenças da aia num mundo para além da morte;

- “O seu cavalo de batalha, as suas armas, os seus pajens tinham subido com ele às alturas.”: traduz a ideia de morte e a crença da aia na vida no céu enquanto réplica da vida terrena. De facto, para a personagem, o céu reproduz a estrutura social existente na terra, mantendo o rei e os seus súbditos a hierarquia vivida na terra. Esta crença envolvia os próprios animais: “O seu cavalo de batalha, as suas armas, os seus pajens tinham subido com ele às alturas.”;

- “… sucumbira, ele e vinte da sua horda.”: traduz a morte do tio bastardo e dos seus soldados.

 

Hipérbole:

- “de face mais escura que a noite”: exprime o caráter tenebroso e desprezível do irmão do rei, estabelecendo a correspondência entre os traços exteriores e os interiores.

 

Aliteração:

- “passos pesados”: a aliteração em “p” marca a cadência sinistra dos passos (podemos considerar esta expressão também uma hipálage)

- “forte pela força e forte pelo amor”: a aliteração em “f” sugere a fragilidade do príncipe, que não tinha quem o protegesse e defendesse.

 

Enumeração:

- “refulgiam os escudos de ouro, as armas marchetadas, os montões de diamantes, as pilhas de moedas, os longos fios de pérolas”: sublinha a valia / a riqueza do tesouro.

 

Interrogação:

- “Que bolsas de ouro podem pagar um filho?”: o narrador suscita a reflexão sobre o valor / o preço da vida humana – um filho não tem preço.

 

Determinante artigo indefinido:

- “Era uma vez”; “um reino abundante”, um rei”:

não permite determinar com precisão o tempo histórico e o tempo cronológico (intemporalidade);

não permite determinar com precisão o espaço físico:

contribui para a exemplaridade da história, cuja mensagem, cujo teor humano pode ser aplicado a muitos tempos e lugares;

traduz o anonimado das personagens.

 

Determinante artigo definido:

- “O bastardo, o homem de rapina […]”: vide metáforas.

 

Sensações auditivas e visuais:

- as sensações auditivas relevam a solenidade do momento e o acontecimento trágico que lhe deu origem: “(…) respeito tão comovido que apenas se ouvia o roçar das sandálias nas lajes. As espessas portas do tesouro rolaram lentamente.”; “Um longo «Ah!», lento e maravilhado, passou por sobre a turba que emudecera. Depois houve um silêncio ansioso”; “Todos seguiam, sem respirar […]”;

- as sensações visuais relacionam-se sobretudo com a descrição da “câmara dos tesouros”, destacando-se as notações de luz e brilho (que servem também para marcar o tempo cronológico – “a luz da madrugada, já clara e rósea”): “acendeu um maravilhoso e faiscante incêndio de ouro e pedrarias!”; “reluziam, cintilavam, refulgiam os escudos de ouro, as armas marchetadas, os montões de diamantes, as pilhas de moedas, os longos fios de pérolas”; “refulgência preciosa”.


domingo, 10 de dezembro de 2023

Análise do poema "A novela inacabada", de Fernando Pessoa


    Este poema de Fernando Pessoa é constituído por três quadras de versos de redondilha maior, com rima cruzada, de acordo com o esquema rimático ABAB.

    Na primeira quadra, o sujeito poético usa a metáfora nos dois versos iniciais para representar a sua vida como uma “novela inacabada”. Ora, sabendo que uma novela é um texto narrativo envolvente e complexo, cheio de situações variadas e complexas, com múltiplas reviravoltas, podemos inferir que o verso 1 remete para uma vida repleta de eventos intensos e emotivos. Por outro lado, a referida metáfora sugere que a vida do «eu» lírico, sendo uma novela e inacabada, não consegue realizar-se no seu dia a dia, no seu quotidiano. Deste modo, ele procura sentido... [continuação da análise 👉 análise-de-a-novela-inacabada].

sexta-feira, 8 de dezembro de 2023

Resultados do PISA 2023

     Diga muitas vezes OCDE. Alugue o táxi que levará João Costa até ao aeroporto. Porém, antes, leia (já não digo o estudo, que tem muitas páginas, logo uma coisa aborrecida - o tempo ganho dará para se deliciar com «n» vídeos do TikTok) o que Paulo Guinote escreveu sobre o estudo: inclusão-e-equidade-PISA.

quarta-feira, 6 de dezembro de 2023

Pai

     No dia em que celebrarias 96 anos...

    A palavra portuguesa "pai" deriva diretamente da forma latina «pater», que originou pelo caminho «padre», usado em textos portugueses antigos. Ora «pater» terá derivado do proto-indo-europeu *phtḗr (note-se que as letras representam os supostos sons das palavras reconstruídas a partir da comparação das várias línguas europeias).

    Foi, portanto, este *phtḗr que esteve na origem do vocábulo latino «pater» e seus derivados, bem como dos vocábulos que designam "pai" nas línguas germânicas, por exemplo, o termo inglês father, cujo "f" inicial resulta da transformação do som inicial do indo-europeu. De facto, várias das palavras iniciadas por "p" nas línguas latinas começam por "f" nas línguas germânicas: "peixe" → "fish" (ambas derivam do proto-indo-europeu *peysk-.

    Em suma, do indo-europeu *phtḗr (uma reconstrução, como atrás foi referido), passamos para o latim pater, daí para o português antigo padre e para o atual pai.


    A seguir, vamos descobrir de onde veio João e, depois, saudade...

terça-feira, 5 de dezembro de 2023

Um pinheiro diferente

Marco de Angelis

Objetivo da NASA: causar o maior estrago possível


 

    O nome do meio de comunicação é Notícias ao Minuto, a autoria do pedaço de prosa é anónima. Ainda bem para o escriba: o objetivo é fazem com que a Estação Espacial Internacional caia onde possa causar risco (?).
    Desde o vocabulário até à falta de nexo, é a total labreguice linguística que galopa desenfreadamente.

Na aula (XLIX): adolescência desnudada


    Numa qualquer aula, um trabalho fruto da cooperação entre um aluno e uma aluna.

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