●
Condições histórico-políticas que estão na génese do soneto:
–
Revolução Francesa (1789);
–
consolidação da República Francesa (1797);
–
estado de absolutismo despótico que se vivia em Portugal.
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Tema: a ânsia de Liberdade.
● Assunto: o sujeito poético
lamente a chegada tardia da Liberdade, constata a oportunidade da sua vinda,
desejando e fazendo apelo para a instauração definitiva de tal valor.
● Estrutura interna
• 1.ª
parte (1.ª quadra) – O sujeito lírico interroga-se sobre o paradeiro da
Liberdade e desabafa, em tom de incerteza e dúvida, quanto à sua chegada.
Possuído
por grande ansiedade e inquietação, face à situação presente de falta de
liberdade e opressão, o sujeito poético chama por uma “liberdade colectiva” (“nós”)
que alguém desconhecido impede de chegar.
• 2.ª
parte (vv. 5-14) – A ansiedade, o desejo e consequente apelo, súplica, à Liberdade
para que, chegando, possibilite a realização do sujeito/Humanidade.
▪ Na 2.ª estrofe, é clara a
dicotomia liberdade/despotismo: o presente é o despotismo, a opressão “feroz”
que “nos devora”; a situação desejada é a da redenção, da salvação: “é vinda a
hora”.
▪ No 1.º terceto, temos a súplica do sujeito
poético à Liberdade, súplica para o merecido acolhimento para quem é patriota.
Por outro lado, o sujeito apresenta os efeitos do despotismo em si:
– frio e mudo ® inexistência de liberdade de expressão – não pode
poetar à vontade;
– oculta o amor pátrio;
– torce a vontade;
– finge.
Há,
de facto, no soneto, uma oposição entre uma situação real e uma situação
desejada. A situação real é de opressão (“despotismo feroz”), que obriga o
sujeito a silenciar, por medo, o próprio amor à Pátria, a contrariar a sua própria
vontade e a fingir, para não ser apanhado nas malhas da perseguição política,
conforme pode ver-se neste terceto.
A
situação desejada é a de Liberdade, aqui encarada como uma “santa redenção”,
uma verdadeira salvação, tal é a violência da tirania que “nos devora”. Só a
“aurora” da Liberdade poderá iluminar a
“espera de Lísia” (Portugal) e dissipar as trevas de um regime ditatorial.
▪ No 2.º terceto, a Liberdade é
apresentada como aspiração máxima do Homem [“tu és (...) tudo”] e caracterizada
como divindade, glória, “mãe do génio (não há entraves para poetar) e do prazer”.
▪ A dicotomia Liberdade/Despotismo é
sustentada, no poema, por um vasto conjunto de vocábulos:
Liberdade
|
|
Vv.
|
|
Ausência de
Liberdade
|
|
Vv.
|
“Liberdade”
“santa redenção”
“Oh! Venha... Oh! Venha”
“pátrio amor”
“piedade”
“númen tu és”
“glória”
“Mãe do génio e prazer”
“Liberdade”
|
|
1
5
7
10
12
13
13
14
14
|
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“demora”
“triste de mim!”
“não caia”
“desmaia”
“descaia”
“Despotismo feroz, que nos
devora!”
“frio e mudo”
“Oculta”
“torce a vontade”
“fingir”
“temor”
“grilhões”
|
|
1
2
2
6
7
8
9
10
10
11
11
12
|
O
número de vocábulos/expressões dos dois grupos opostos é semelhante, ficando,
deste modo, comprovada a luta, o conflito entre forças iguais
(Liberdade/Ausência de Liberdade), para o qual o sujeito poético incita,
apelando e desejando a chegada da Liberdade como necessidade imperiosa para os
homens, uma vez que tal privação já causara avultados sacrifícios.
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Recursos poético-estilísticos
A nível formal, trata-se de um soneto
pois contém duas quadras e dois tercetos, de versos isométricos – decassilábicos. O esquema rimático
é ABBA / ABBBA / CDC / DCD, sendo a rima interpolada e emparelhada nas quadras
e cruzada nos tercetos. Os versos têm ainda rima grave, consoante, rica (“demora”/”aurora”)
e pobre (“desmaia”/”descaia”).
A nível morfossintáctico, existem, nos versos 5 e 12,
dois hipérbatos bastante significativos: “Da
santa redenção é vinda a hora”; “Movam nossos grilhões tua piedade”. Com a
inversão sintáctica que caracteriza o hipérbato, são colocados na posição de
destaque do verso (no início) os elementos mais significativos: “Da santa
redenção” ® a necessidade de salvação; “Movam nossos grilhões” ® o desejo de libertação e de resolução do
conflito.
A adjectivação agrupa-se dm dois conjuntos: “triste”,
“feroz”, “frio e mudo”, “pátrio”, referem-se à situação de despotismo, de
opressão; “santa” refere-se à ânsia de redenção e salvação possíveis de obter
através da chegada da Liberdade.
O uso do pronome indefinido (“tudo”) reforça a dificuldade
do sujeito poético em seleccionar os vocábulos apropriados para a definição de
Liberdade, a aspiração máxima do Homem. Dada essa dificuldade, recorre a este
pronome como forma de sintetizar a definição.
O apelo e desejo de
liberdade implicam o predomínio da função apelativa,
na medida em que o discurso está centrado no receptor – Liberdade – , para,
através de vocativos (“Liberdade”, “ó
Liberdade”), formas de imperativo (“acode”)
e de presente do conjuntivo
(“venha”, “descaia”, “movam”), suplicar a sua intervenção redentora. Por outro
lado, é visível também a presença emocionada do sujeito poético (função expressiva), não só pela utilização de pronomes pessoais e determinantes
possessivos de primeira pessoa (“nós”, “mim”, “nos”, “nossos”, “nosso”),
mas, sobretudo, através de exclamações (“triste
de mim!”, por exemplo), interrogações, interjeições (“eia”, “oh”), repetições (“Oh!, venha... Oh!, venha”), reticências e adjectivação
(“santa”, “trémulo”, “feroz”, “frio e mudo”) e até da metáfora
(“raia (...) a tua aurora”, “devora”, “grilhões”).
O
pronome interrogativo “Quem” remete
para a indefinição que rodeia a pessoa ou entidade que impede a liberdade de
chegar e libertar o sujeito da situação de asfixia em que se debate face ao “despotismo feroz”.
O
polissíndeto (vv. 13-14) resulta numa
tentativa de definição de algo que é transcendente pela sucessão de vocábulos.
Encontram-se
no soneto frases interrogativas (vv. 1, 2,
3-4), declarativas (vv. 5-6), exclamativas (vv. 3, 7-8, 13-14) e imperativas (vv. 9-11, 12). Esta sequência, no que
diz respeito à forma como surgem no poema, remete para uma determinada
progressão do estado de espírito do sujeito poético: em primeiro lugar,
incerteza e indignação pela ausência de Liberdade (frases interrogativas, vv.
1-4); de seguida, a constatação de que o tempo oportuno havia chegado (frases
declarativas, vv. 5-6), acompanhado de um desejo em forma de súplica para o
término da situação presente (frases exclamativas, vv. 7-8); o apelo para a
instauração da Liberdade (frases imperativas, vv. 9-11, 12); e, por último, o
destaque atribuído à Liberdade e ao sentimentos do sujeito por tal valor
(frases exclamativas, vv. 13.14) que protagoniza o poema.
A
nível semântico, logo no primeiro verso
deparamos com uma apóstrofe à Liberdade que
se repete no último. Ainda na primeira quadra encontramos uma série de interrogações retóricas, isto é, uma série de
interpelações à origem da Liberdade, aos responsáveis pela não existência da
mesma e às causas da sua chegada tardia, que servem especialmente a função
expressiva, presente na 1.ª quadra, na qual o sujeito poético revela a sua
tristeza e indignação pelo facto de estar privado de Liberdade.
As
exclamações, associadas às interjeições (vv. 3, 7-8, 9, 13, 14), marcas da
função expressiva, evidenciam o estado de espírito do sujeito poético: a
súplica, a ansiedade, a aspiração, o desespero.
Por
outro lado, quer a Liberdade quer o Despotismo surgem personificados.
Assim, a personificação da Liberdade por parte do sujeito poético traduz a
grande ânsia da sua chegada, enquanto a personificação do Despotismo, por um
lado, intensifica a sua presença, força e acção, e, por outro, a situação
asfixiante em que vive.
A
metáfora é outro dos recursos importantes do
poema:
– “raia (...) a tua aurora” (vv. 3-4);
– “A esta parte do mundo, que desmaia”
(v. 6);
– “Despotismo feroz, que nos devora!”
(v. 8);
– “... torce a vontade...” (v. 10);
– “Movam nossos grilhões...” (v. 12);
– “Nosso númen tu és...” (v. 13);
– “Mãe do génio e do prazer...” (v. 14).
Este conjunto de metáforas revela a situação de opressão em que o
sujeito se debate face ao “despotismo feroz” que a Liberdade tarda em destruir,
porque demora a chegar. Além disso, no caso da última metáfora, é atribuída à
Liberdade a capacidade de gerar e proteger, sendo ela identificada como a
génese da inspiração, do talento.
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Características