1.ª
fase (1873 - 74): a "Crise Romanesca" ‑ o idealismo
romântico temperado pelas tendências literárias e estéticas da época.
Nesta
fase, verifica-se a idealização romântica da mulher, que o poeta coloca num plano superior, como objeto de
adoração, inacessível ao sujeito, que se limita a formular vagos desejos
impossíveis (ex.: Responso). Estão
presentes elementos como os cabelos louros, o luto, a tristeza, um grande
sofrimento, o ambiente macabro do cemitério, o noturno, os castelos, os
palácios e mosteiros silenciosos e abandonados, as «florestas tenebrosas», as
«Velhas almas» errantes, o «locus horrendus» romântico em que se projeta um
estado de alma, recordando alguns sonetos de Bocage.
Noutros
poemas (Esplêndida, Deslumbramentos), Cesário descreve a
mulher fatal, artificial, citadina, que humilha, esmaga e fascina o sujeito
poético, transportando consigo a artificialidade e a violência da vida da
cidade, que pode levar à alienação e à perda da identidade do cidadão. A mulher
é portadora da morte, não uma morte ambicionada, antes receada. A mulher é uma
«vamp», produto do luxo, da moda, da despesa inútil e ostentatória. Ela é o
agressor e dominador que é necessário vencer.
2.ª fase (1875 -
76): "Naturais" ‑ o antirromantismo e o naturalismo.
Nesta
fase, no poema Humilhações, surge o
contraste entre o sujeito, «ignorado e só», e a mulher superior, distante e
altiva que o atrai, sendo a distância entre homem e mulher sobretudo económica
e social. Ela é uma burguesa rica que o atrai e fascina e ele é de baixa
condição social; entre os dois instala-se, portanto, uma relação de opressão/humilhação,
que impede qualquer hipótese de aproximação. Resta ao sujeito lírico a
vingança, concretizada com o recurso ao retrato da velhinha «suja», «fanhosa,
infecta, rota, má», que o poeta contrapõe como sucedâneo irreversível da mulher
altiva e opressora.
Cesário,
por outro lado, em Contrariedades,
critica a sociedade alienada e desumana através da denúncia de atitudes que
ferem a sensibilidade do eu: o abandono a que são votados os doentes (ex.: a
engomadeira tuberculosa) e os poetas (ex.: os jornais recusaram publicar os
seus versos).
3.ª
fase (1877 - 86): a maturidade ‑ "O real e a análise" - o
campo e a cidade.
Em
Num Bairro Moderno, Cristalizações e O Sentimento dum Ocidental, Cesário é o pintor de Lisboa, que nos
descreve quadros e tipos citadinos, sem deixar de exprimir as atitudes
subjetivas provocadas pela vida exterior.
O
poeta é um burguês que se move na cidade e tudo encontra «alegremente exato»,
até que a tomada de consciência da dureza da vida dos trabalhadores o surpreende
e fere, facto que o leva a denunciar a injustiça de que são vítimas.
Nesta
fase, desenvolve Cesário a dicotomia campo/cidade,
sucedendo frequentemente a invasão simbólica da cidade pelo campo (ex.: a
vendedeira). A cidade é simbolizada, por exemplo, pela atriz, pelos
significados de luxo, artificialismo, teatralidade, mundanismo.
Em
O Sentimento dum Ocidental, nota-se
uma revolta do sujeito perante as desigualdades sociais da sua época e um
desencanto para com a cidade (vista como prisão, de que o sujeito procura
fugir), onde há dor em busca de «amplos horizontes» ‑ o campo, espaço de
liberdade.
No
poema Nós, Cesário retoma o elogio da
vida campestre; a cidade surge identificada como «lívido flagelo, a moléstia
horrenda», e oposta à salubridade do campo, à salvação da família. É provável
que esta repulsa pela cidade e o entusiasmo pelo campo resultem da doença que
desde cedo apoquentou Cesário, e da esperança de encontrar alívio na vida rústica,
natural.
Já
segundo Joel Serrão, a produção poética de Cesário distribui-se por quatro
fases:
1.ª
fase (1873-74) – A Crise
Romanesca: o idealismo romântico temperado pela ironia: o campo como “metáfora
antinómica” da cidade.
É
a fase de iniciação literária de Cesário, caracterizada pela influência de João
Penha, sendo marcado por um idealismo romântico (temas do amor e da mulher) que
é atenuado pela ironia dos versos finais, e pelo rigor formal do Parnasianismo.
São exemplos desta fase os poemas “A Forca” (1873), “Num tripudio de corte
rigoroso” (1873), “Ó áridas Messalinas” (1873), “Cinismos” (1874), “Responso”
(1874), “Esplêndida” (1874), “Setentrional” (1874), “Arrojos” (1874), “Vaidosa”
(1874).
2.ª fase (1875-76)
– O Naturalismo e a influência de
Baudelaire.
Cesário
é agora influenciado pelo poeta francês Baudelaire, mostrando-se interessado
pelo quotidiano citadino (os contrastes desse quotidiano são o seu alvo
preferencial), do qual nos oferece belos quadros, bem ao jeito impressionista,
repletos de plasticidade.
Vários
são os poemas em que isto sucede: “Deslumbramentos” (1875), “Frígida” (1875),”A
Débil” (1875), “Contrariedades” (1876), “Humilhações” (1876).
3.ª
fase (1877-80) – A maturidade poética – “o real e a análise”: o
aprofundamento da oposição cidade/campo, sendo este ainda um “contraste
idealizado” daquela.
Esta
é, provavelmente, a fase mais importante da sua produção poética, contemplando
um conjunto de poemas que constituem uma busca febril das cores, das luzes, das
sombras, dos ruídos, dos odores, das dores e dos fantasmas que pulsam na cidade
de Lisboa.
Exemplificam
esta fase poemas como “Num Bairro Moderno” (1877), “Cristalizações” (1878), “Em
Petiz” (1878), “O Sentimento dum Ocidental” (1889).
4.ª
fase (1881-86) – O pictórico e a visão impressionista da realidade.
A amplificação do contraste cidade/campo, tornando-se este uma alternativa
àquela.
A
vida citadina aborrece-o e provoca-lhe mal-estar e o campo (o gosto das “coisas
primitivas, sinceras, e a (…) boa paz regular”) substitui a cidade. A sua condição
de agricultor proporciona-lhe não só a descoberta de novos temas e motivos de
uma visão impressionista da realidade, mas também a evasão possível da cidade
turbulenta. Ao “desejo de sofrer” e ao clima sombrio de “O Sentimento dum
Ocidental” sucedem a claridade fecunda, o vigor, e a pureza dos ares do campo,
que parecem antecipar uma ânsia de preservar a débil saúde do poeta.
Exemplos
deste derradeiro período são os textos “De Tarde” (?), “De Verão” (?), “Nós”
(1884), “Provincianas” (derradeiro poema, incompleto).
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