Esta cena curta
e de transição permite o primeiro encontro de Hamlet com o fantasma que se
supõe ser do seu pai. Além disso, possibilita a mistura de elementos de
diferentes cenários, contrariando a tendência verificada até então de se
apresentarem cenários diversos separados e individualizados. Hamlet, por
exemplo, tinha estado associado aos espaços interiores de Elsinore, porém agora
surge enquadrado na escuridão do seu exterior. De modo semelhante, o ambiente
de terror ficara circunscrito ao seu exterior e separado do que se passa no
interior do castelo, porém, nesta cena, o som da festa de Cláudio rompe as paredes
e chega ao exterior, aos ouvidos de Hamlet e dos seus companheiros durante a
noite. Note-se que essa folia serve essencialmente para manchar o caráter de
Cláudio, dado que está mais interessado em celebrar a sua ascensão ao trono do
que em honrar a memória do irmão recém-falecido. Hamlet considera que este tipo
de coisas prejudica a imagem da Dinamarca perante as outras nações e considera
estas celebrações como um sinal da corrupção do Estado, acrescentando que o
álcool leva a que os defeitos de caráter de algumas pessoas se sobreponham às
suas qualidades. Apesar de Cláudio não ser o primeiro governante dinamarquês a
entregar-se a tal folia, parece ser opinião do jovem príncipe que esta é
excessiva.
A cena muda
drasticamente com o aparecimento do fantasma, que também é associado a uma
imagem de decadência da nação, nomeadamente quando Marcelo faz a sua famosa
afirmação, segundo a qual algo está podre no reino da Dinamarca. Por outro
lado, a aparição do espectro permite estabelecer um contraste entre o
relacionamento de Hamlet com o seu pai e com o seu tio, de quem está distante e
tem uma visão muito negativa.
Além disso,
o episódio permite destacar a tristeza do jovem príncipe e o pouco valor que
atribui à sua vida. Convém também ter presente que, como Hamlet não sabe o que
existe para além da morte, não consegue ter a certeza se o fantasma é realmente
o espírito do seu pai ou se é um demónio vindo do Inferno para o destruir. Essa
incerteza condu-lo a tecer considerações dolorosas sobre a moral, já abordadas
igualmente na cena inicial, quando se alude ao seu desejo de se matar.
Por sua vez,
o tema da loucura também está presente e é suscitado por Horácio quando procura
demover Hamlet de seguir o fantasma e sugere que isso poderá privá-lo da razão
e mergulhá-lo na loucura. Assim sendo, esta temática assume um papel relevante
na peça, nomeadamente no que toca ao príncipe.
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