Português: Análise da cena 5 do ato I de Hamlet

sábado, 10 de fevereiro de 2024

Análise da cena 5 do ato I de Hamlet


    A revelação do fantasma de que o velho rei Hamlet foi assassinado pelo próprio irmão, Cláudio, mostra como a ambição pelo poder pode levar algumas pessoas a cometer os crimes mais hediondos. Por outro lado, revela que a corte e a nobreza dinamarquesas estão corruptas e degradadas, pois parece que a ascensão de Cláudio ao trono com base no crime foi bastante fácil e não obteve grande oposição ou objeto de questionamento. Tal como ainda hoje sucede, com os casos de compadrio, corrupção (ou da chamada cunha), que se acumulam por todo o lado, o sistema político e de governo da Dinamarca parecem ser particularmente vulneráveis a este tipo de atos criminosos. Assim sendo, Marcelo parece ter acertado no alvo quando afirmou, na cena anterior, que algo estava podre no reino da Dinamarca. De facto, algo está: o sistema político, a governação, o caráter e a integridade da monarquia.

    O pedido de vingança que o fantasma dirige ao jovem príncipe – justiça retributiva – levanta questões relevantes. De facto, tal pedido seria considerado, hoje em dia, um crime e um ato condenável a todos os títulos. Tal não era o caso na época em que a ação decorre, visto que o gesto de matar o assassino do próprio pai seria não só aceite, como até esperado, e estaria intimamente ligado às ideias de família, honra e dever. Deste modo, é evidente que o jovem Hamlet sentirá, a partir desta cena e do encontro com o espectro, a pressão de concretizar o seu pedido. Não o fazer mancharia a sua reputação e deixaria o nome da família por vingar.

    Juntamente com essa pressão, ou fazendo parte integrante dela, estão outras questões, como, por exemplo, quando e como executar a vingança. De facto, assassinar um rei não é uma tarefa simples e fácil de executar. Além disso, a revelação do fantasma vem confirmar as suspeitas do jovem príncipe, que sempre desconfiou da postura do tio. Teria ele pressentido desde sempre o seu caráter e a sua participação no crime? Seja como for, agora que ouviu da boca do fantasma do próprio pai a verdade, não lhe restará outra alternativa se não executar a vingança.

    Por último, as novas informações permitem estabelecer um paralelo entre Hamlet e Fortinbras, dado que ambos viram os seus pais morrer recentemente e, embora em circunstâncias diferentes, ambos se sentem pressionados a vingá-los.

    Como fica a rainha Gertrudes no meio deste imbróglio? Determinadas referências, ao longo da cena, ao incesto permitem concluir que, na ótica do fantasma do seu ex-marido, a monarca se está a comportar de forma imoral, desde logo pelo facto de ser casado com o irmão do próprio marido, portanto seu cunhado até ficar viúva. Além disso, há a considerar a questão de Gertrudes não ter esperado muito tempo desde a morte do primeiro esposo para voltar a casar. Podemos interrogar-nos: porquê? Desconfiaria ela do até então cunhado e recearia ser a próxima vítima se se opusesse aos seus intentos? Ou tratar-se-ia apenas do caso de uma mulher que vive no seio de uma sociedade governada por homens, que, portanto, não possui uma voz livre e independente e que é pressionada (ou, pelo menos, se espera tal) a casar novamente? Tendo tudo isto em conta, a fúria do fantasma dirigida a ela (que o leva a dizer ao filho que não estenda a vingança à mãe, para que seja ele próprio a exercê-la no Céu) ou é justificada porque o espírito sabe algo que mais ninguém conhece, ou não tem em consideração as pressões que uma mulher na sua situação e posição social sofreria e às quais seria difícil resistir.

    Por último, a finalizar a cena, Hamlet diz a Marcelo e Horácio que não estranhem o seu comportamento nos próximos dias, o que se justifica pela conversa que manteve com o fantasma e tudo o que dela resultou ou resultará. Quem agiria da mesma forma que dantes depois de ter recebido tais notícia?

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