Português: A Alteridade do Ocidente: Aspetos Conceituais

sábado, 1 de junho de 2024

A Alteridade do Ocidente: Aspetos Conceituais

    Com o intuito de iniciarmos a fundamentação da análise do conto “As aventuras de Pinóquio”, partimos das considerações de Sousa Santos (2008) acerca da alteridade do Ocidente, em A gramática do tempo: para uma nova cultura política. O autor afirma que o Ocidente, enquanto mais destacado descobridor imperial do segundo milênio, instituiu o seu “Outro”, o seu descoberto, sob “[...] três formas principais: o Oriente, o selvagem e a natureza.” (SOUSA SANTOS, 2008, p. 181).
    No entanto, no mecanismo de descoberta imperial, o nível conceitual precede o empírico, de modo que a ideia ocidental preconcebida daquilo que é descoberto comanda o processo de descoberta e os atos que se seguem a este, fundamentando-se tal ideia na afirmação e reiteração da inferioridade do outro, de forma que este último se reduza a um objeto de violência física e epistêmica: “[...] o descoberto não tem saberes, ou se os tem, estes apenas têm valor enquanto recurso.” (SOUSA SANTOS, 2008, p. 182). Entre os três lugares da alteridade do Ocidente apontados por Sousa Santos (2008), focamos em nosso artigo em dois deles: o selvagem e a natureza, intencionando identificar o quanto à infância são relegados tais espaços de alteridade com relação ao paradigma moderno ocidental. O selvagem, para Sousa Santos (2008, p. 185-186), “[...] é o lugar da inferioridade [...] a diferença incapaz de se constituir em alteridade. Não é o outro porque não é sequer plenamente humano [...]”, constituindo uma ameaça irracional mais do que uma ameaça civilizacional. Tal inferiorização conceitual efetivou-se a partir da identificação dos descobertos com os seres irracionais e da natureza, considerando-se suas culturas inferiores à racionalidade científica. A natureza, por sua vez, é o lugar da exterioridade, tanto ameaçando o homem quanto servindo-lhe de recurso. Entretanto, a natureza e o selvagem, enquanto ameaças irracionais constituídas, podem ser domina- das e utilizadas por intermédio do conhecimento que os transforma em recurso. “O selvagem e a natureza são, de fato, as duas faces do mesmo desígnio: domesticar a ‘natureza selvagem’, convertendo-a num recurso natural.” (SOUSA SANTOS, 2008, p. 188 – grifos no original). O autor considera que as três descobertas do Ocidente — o Oriente, o selvagem e a natureza — “[...] permanecem intactas na sua capacidade para alimentar o modo como o Ocidente vê a si próprio e tudo o que não identifica consigo.” (SOUSA SANTOS, 2008, p. 190).

Fabiano de Oliveira Moraes, A representação da infância em Pinóquio: a propagação
e a perpetuação do discurso hegemônico por meio da literatura infantil e da escola

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