Português: Contexto de Memórias de um Sargento de Milícias

quarta-feira, 19 de julho de 2023

Contexto de Memórias de um Sargento de Milícias


    A ação decorre no período em que D. João VI e a corte portuguesa viviam no Brasil, entre 1808 e 1821, depois de aí se terem refugiado, fugidos de Portugal das Invasões Francesas, por isso o romance começa com a expressão “Era no tempo do rei”, que recorda o início dos contos tradicionais populares: “Era uma vez…”.
    Em 1806, a Inglaterra e a França estavam em conflito. Napoleão Bonaparte, imperador da França, decretou o Bloqueio Continental, que estabelecia que todos os países europeus deveriam encerrar os seus portos aos navios ingleses, com o objetivo de enfraquecer as exportações inglesas, dando origem a uma crise económica.
    Nessa época, Portugal e Inglaterra eram aliados e mantinham boas relações comerciais, por isso os portugueses não anuíram às exigências dos franceses. Assim, Napoleão decidiu invadir Portugal, pelo que, em 1808, a família real lusitana fugiu para o Brasil, passando a capital do Império a ser o Rio de Janeiro.
    Após a chegada da corte portuguesa ao Brasil, D. João VI põe em prática diversas medidas económicas, políticas e sociais que favoreceram o florescimento das atividades culturais no Brasil. Depois de 1822, D. João VI regressou a Portugal. Dois anos a seguir, em 1824, D. Pedro I outorga a Constituição brasileira.
    Em 1840, dá-se o Golpe da Maioridade de D. Pedro II, que faz com que o Brasil inicie novo período de crises económicas, políticas e sociais, acentuadas pela guerra com o Paraguai, a extinção do tráfico negreiro e a abolição da escravatura.
    Já na década de 1860, o Brasil começa a exportar diversos produtos, como café, açúcar e algodão, que tornam a balança comercial brasileira positiva. Foi neste contexto que, entre 1836 e 1881, floresceu, atingiu o apogeu e decaiu o Romantismo.
    A obra explora personagens características da sociedade do Rio de Janeiro do século XIX, sempre recorrendo ao humor e à ironia. Nessa época, a literatura brasileira cultivava uma narrativa que recuperava as raízes e tradições nacionais. Em simultâneo, surgiu um outro género, o chamado romance urbano, que tinha como pano de fundo a cidade e a vida social, familiar e amorosa de personagens que vivem os seus conflitos amorosos, os problemas de convivência, o materialismo, a corrupção, a procura de ascensão social, etc.
    Manuel António de Almeida não foi alheio ao envolvimento político. Na obra, descreve e compara a cultura brasileira referente ao período em que o Brasil foi a sede da monarquia portuguesa com a do tempo em que a obra foi escrita (1852 – 1853), fazendo uso da ironia para denunciar as mazelas sociais, procurando mostrar que aqueles que defendiam o “tempo do rei” estavam equivocados ao pensar que o governo déspota desenvolveria a sociedade brasileira com o passar dos anos. Pelo contrário, enquanto liberal, considerava que um governo tirano como o que se praticava no Brasil teria exatamente o efeito contrário, isto é, atrasaria o desenvolvimento social, criando pessoas ignorantes e rudes. Assim, o livro pode ser lido como uma alegoria da época da sua escrita, pretendendo o autor sugerir que o Brasil de 1850 não diferia muito do de 1808, daí a crítica que vai tecendo ao sistema de Justiça, à Educação, ao clero, à polícia, aos imigrantes portugueses, etc., etc.
    Na sua ótica, o desenvolvimento brasileiro teria de estar ligado ao investimento na educação dos seus cidadãos, algo completamente descuidado pelos sucessivos governos e abordado na obra. De facto, todas as personagens manifestam comportamentos tidos por inadequados, bem como uma clara falta de formação intelectual. Elas são espertas e resolvem os seus problemas com base em esquemas e na malandragem. O próprio Vidigal, o legítimo representante da lei no Rio, conhecido pela sua eficiência, usa métodos investigativos e punitivos violentos e ilegais.

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