Português

segunda-feira, 19 de outubro de 2020

Palácio da Pena


 

Apreciação crítica

 Definição
 
         A crítica é um texto de caráter informativo e argumentativo, no qual o autor apresenta ao leitor um produto cultural (um filme, um livro, uma peça de teatro, uma exposição, uma pintura, um “artigo” televisivo, etc., com o objetivo de o analisar e avaliar. Assim, a sua função é informar com rigor e apreciar quer positiva quer negativamente.
 
 
Estrutura
 
         A estrutura de uma apreciação crítica é a seguinte:
 
Título: deve ser sugestivo e apelativo (o texto poderá possuir também um antetítulo e um subtítulo) ‑ anuncia a opinião sobre o produto cultural ou evento criticado.
 
Introdução ou Abertura: apresentação sucinta do objeto e da opinião do autor (tese).
 
Desenvolvimento:
» descrição sucinta do objeto;
» comentário crítico, com apreciações pessoais favoráveis ou desfavoráveis.
 
Conclusão: confirmação da tese defendida / apreciação final.
 
 
Marcas de género
- Descrição sucinta do objeto da apreciação crítica.
- Linguagem clara e objetiva.
- Linguagem valorativa, elogiosa ou depreciativa (adjetivação expressiva).
- Recursos expressivos: metáfora, comparação, hipérbole, ironia, etc.
- Uso da terceira pessoa.
 

Exemplo de texto de apreciação crítica: "A agonia dos «blockbusters»

Afinal de contas, é bem verdade que a história dos "blockbusters" está recheada de maravilhas. Começando logo por "Tubarão" (1975), precisamente o título que, em termos industriais e comerciais, inaugurou o tipo de exploração comercial (cada vez mais salas, rentabilização cada vez mais acelerada) que os caracteriza. E, sem qualquer preocupação exaustiva, poderíamos citar "Regresso ao Futuro" (1985), "O Rei Leão" (1994), "O Sexto Sentido" (1999)... São todos "blockbusters" e todos são excelentes espetáculos.

Resta saber se o "género" não está a fabricar a sua própria agonia, de tal modo se vai ficando com a sensação de que a maioria destes filmes passaram a resultar mais de uma gestão "tecnológica" do que propriamente de um desejo de construir personagens e encenar aventuras. "Homem de Ferro 3", dirigido por Shane Black, de novo com Robert Downey Jr. no papel principal, aí está como penosa ilustração disso mesmo.

Ben Kingsley, compondo a personagem de um terrorista condenado à sua própria caricatura, será a única variação que nos pode levar a pensar que talvez pudesse existir aqui, ao menos, algum sentido de autoironia. Mas não. A proliferação gratuita de cenas ditas de ação, incluindo o "obrigatório" duelo final, vai-se reduzindo a uma acumulação de proezas mais ou menos digitais que, estranhamente, já nem conseguem rentabilizar o valor dramático do espaço.

Do ponto de vista da gestão industrial, estamos perante mais um exemplo de ocupação da produção pelos grandes conglomerados da banda desenhada (Marvel, neste caso). Não vem mal ao mundo por causa dessa aliança económica. Resta saber se nela, e através dela, ainda se procura alguma coisa que tenha a ver com o cinema. E com o gosto tão primitivo (mas tão essencial) de contar histórias.

 Fonte: RTP on-line


Análise do texto

Título:
▪ expressivo e apelativo;
▪ antecipa a tese do autor do texto o fim (previsível) dos “blockbusters”.
 
Abertura:
identificação sumária do objeto de crítica: terceiro capítulo da saga “Homem de Ferro”;
tese do autor: os realizadores atuais preferem mostrar efeitos especiais em vez de contar histórias.
 
Desenvolvimento:
 
Argumento favorável aos “blockbusters”: alguns são “excelentes espetáculos” (2.º      par.);
- Exemplos: filmes “Tubarão”, “Regresso ao Futuro”, “O Rei Leão”, “O Sexto Sentido”.
 
- Argumentos que sustentam a tese e exemplos (3.º par.):
1.º) os filmes valorizam a exibição de tecnologia, desvalorizando a ação credível e a construção de personagens coesas;
Exemplo: filme “Homem de Ferro 3”;
 
2.º) a ação do filme consiste numa acumulação de cenas “ditas de ação” (ex.: o obrigatório duelo final), que consistem numa mostra de habilidades digitais, não explorando categorias como o espaço (4.º par.);
Exemplo: filme “Homem de Ferro 3”.
 
Conclusão (5.º parágrafo): reforço da tese inicial este tipo de realização cinematográfica nega o cinema enquanto arte de narrar histórias ‑ interrogação.
 

sexta-feira, 9 de outubro de 2020

A Geração de Orpheu

 1. Cronologia
 
O grupo de jovens que ficaria conhecido como «Geração de Orpheu» começou a reunir-se por volta de 1912, nos cafés da Baixa de Lisboa.
 
Em 1912, Fernando Pessoa e Mário de Sá-Carneiro conhecem-se e criam o Paulismo, o Interseccionismo e o Sensacionismo.
 
Em 1913, Mário de Sá-Carneiro começa a escrever poesia e Fernando Pessoa escreve o primeiro texto que integrará o Livro do Desassossego, da autoria de Bernardo Soares.
 
Em 1914, Fernando Pessoa cria os heterónimos.
 
Ainda em 1914, regressam de Pais Santa-Rita Pintor, Amadeo de Sousa Cardoso e o próprio Sá-Carneiro. Por sua vez, do Brasil chega Luís de Montalvor.
 
A ideia da criação de uma revista literária de Vanguarda vai crescendo, incentivada, sobretudo, por Pessoa e Sá-Carneiro.
 
Em 1915, é publicado o n.º 1 da revista Orpheu, o órgão do Primeiro Modernismo, a 15 de março, com capa de José Pacheco e direção de Luís de Montalvor e do brasileiro Ronald de Carvalho.
 
Vários autores colaboram neste número: Mário de Sá-Carneiro, Fernando Pessoa, Almada Negreiros, Alfredo Pedro Guisado, Armando Côrtes-Rodrigues, José Pacheco, Luís de Montalvor, Ronald de Carvalho.
 
Esse número 1 inclui textos que foram determinantes para o Modernismo português:
- “Ode Triunfal”, de Álvaro de Campos;
- “O Marinheiro”, de Fernando Pessoa;
- poemas para Índices de Ouro, de Sá-Carneiro;
- “Frisos”, de Almada Negreiros.
 
Como seria de esperar numa sociedade conservadora, como a portuguesa era, a publicação da revista causou grande escândalo na imprensa e os jovens escritores foram considerados loucos e provocadores, mas a verdade é que esgotou. No entanto, a reação da imprensa e do público serviu perfeitamente os interesses dos jovens poetas de Orpheu, visto que o escândalo era também uma forma de divulgação.
 
Assumindo um carácter irreverente e descomprometido, cosmopolita e simultaneamente nacionalista, o Orpheu apresenta práticas de escrita e correntes artísticas vanguardistas – Paulismo, Interseccionismo, Futurismo, Sensacionismo ‑, embora surjam ainda, na revista, leituras e práticas simbolistas e decadentistas.
 
O número 2 de Orpheu, correspondente ao segundo trimestre de 1915, saiu a 28 de junho, com capa de Almada Negreiros e direção de Sá-Carneiro e Fernando Pessoa.
 
Vários autores colaboraram neste número: Sá-Carneiro, Fernando Pessoa, Almada Negreiros, Santa-Rita Pintor, Ângelo de Lima, Raul Leal, Violante de Cysneiros, Luís de Montalvor, Eduardo Guimarães.
 
Ele incluía textos muito significativos: “Ode Marítima”, de Álvaro de Campos; “Chuva Oblíqua”, de Fernando Pessoa; poemas de Sá-Carneiro; poemas de Ângelo de Lima; Atelier, de Raul Leal; desenhos de Santa-Rita Pintor.
 
A revista vendeu 600 exemplares.
 
O n.º 3 da revista não chegou a sair, apesar de estar esboçado e com matéria para publicação. Apenas seria publicado em 1984, compilado por Arnaldo Saraiva.
 
Em setembro, Mário de Sá-Carneiro escreve a Pessoa, avisando-o de que o seu pai não continuaria a financiar a revista, inviabilizando a publicação. Coloca-se a possibilidade de financiamento de Orpheu por parte de Santa-Rita Pintor, no entanto, temendo que este futurista desse uma orientação pessoal à revista, o projeto caiu por terra.
 
Inconformado, Pessoa escreve a Sá-Carneiro o seguinte: “De resto, Orpheu não acabou. Orpheu não pode acabar.”. Sá-Carneiro responde: “Você tem mil razões: o Orpheu não acabou. De qualquer maneira, em qualquer «tempo» há de continuar. O que é preciso é termos «vontade».”.
 
A revista reage contra o tradicionalismo, rompe com o passado e cria um espírito de vanguarda, tendo uma preocupação com o futuro e com a euforia do moderno, apresentando um programa literário inovador. Sob a influência das correntes estéticas e filosóficas europeias, Pessoa, Sá-Carneiro e Almada, entre outros, que se iniciaram no Saudosismo, transitaram para o Modernismo.
 
A geração de Orpheu faz a releitura crítica da tradição e dos movimentos literários vigentes (Decadentismo, Simbolismo e Saudosismo) de forma paródica e irónica, através da qual se instaura uma rutura aberta face aos cânones instituídos, postulando-se o primado da poesia, a autenticidade da busca experimentalizante, a originalidade e a liberdade criativa.
 
Orpheu constitui um “balão de ensaio de múltiplas experiências poéticas novas” (Clara Crabbé Rocha), atesta uma estética plural e até eclética onde se combinam processos de escrita em continuidade com a estética finissecular (cf. números 1 e 3 da revista) e outros que reivindicam a rutura: Paulismo, Intersecionismo, Sensacionismo, Futurismo e Simultaneísmo.
 
O Primeiro Modernismo português vê a sua ação prosseguida e esclarecida pelo grupo da Presença, Segundo Modernismo, com José Régio, Casais Monteiro, Miguel Torga, entre outros.
 
Depois de Orpheu, outras revistas literárias deram voz à vanguarda modernista: Exílio e Centauro, em 1916; Portugal Futurista, em 1917; Contemporânea, em 1922-1926; e Atena, em 1924-1926.
 
 
2. Origem do nome
 
     A revista adotou o nome da figura mitológica que traduz o desejo mais recôndito do ser humano: encontrar na realidade percetível aquilo que é invisível – a sua descida aos infernos para ir buscar Eurídice significa o conhecimento de algo que estava vedado ao Homem: aquilo que está para além da vida. Simbolicamente, Eurídice, a amada de Orfeu, é a sua metade, a sabedoria que essa descida lhe proporcionaria. De facto, os artistas que colaboraram na revista aspiravam a alcançar um conhecimento das coisas que o distanciava dos seus compatriotas e que constituía uma outra visão do mundo.
     O mito original remete-nos para os Trácios, um povo grego que se dedicava à música. A figura de Orfeu não tinha rival no mundo, com exceção dos deuses. De facto, a sua arte de tocar e de dançar era ilimitada e nada nem ninguém lhe podia resistir. Tudo o que era animado e inanimado o seguia; Orfeu fazia mover os rochedos dos montes e mudar o curso dos rios.
     Não se conhece o local onde encontrou Eurídice pela primeira vez e como lhe fez a corte, mas a verdade é que se apaixonou por ela, a qual, dados os talentos dele, seria incapaz de resistir ao fascínio da sua música. Orfeu e Eurídice casaram, mas a sua felicidade foi de curta duração, pois, logo após o casamento, quando a jovem esposa caminhava pelo campo com as suas amigas, foi mordida por uma víbora e morreu pouco depois. A dor de Orfeu foi tão grande que decidiu descer aos Infernos na tentativa de a recuperar. Através do seu talento musical, conseguiu convencer os deuses infernais a devolverem-lhe a esposa, mas com uma condição: não poderia voltar-se para trás para a ver, até atingirem a superfície terrestre. Quando estavam prestes a abandonar os limites do Inferno, Orfeu voltou-se, mas nesse instante Eurídice desapareceu. Desesperado, tentou correr atrás dela, mas tal não lhe era permitido, pois os deuses não consentiam que entrasse no reino dos mortos duas vezes enquanto estivesse vivo. Assim, Orfeu teve de regressar à Terra, só, absolutamente devastado.
 
3. Objetivos:
▪ Reagir contra o tradicionalismo e o academismo oficial.
▪ Romper com o passado.
▪ Ser porta-voz dos ideais e das produções vanguardistas,
 
 
4. Influências:
▪ Correntes modernas europeias (estéticas e filosóficas).
 
 
5. Características
▪ A irreverência.
▪ O descomprometimento.
▪ O caráter simultaneamente cosmopolita e nacionalista.
 
 
6. Protagonistas: Fernando Pessoa, Mário de Sá-Carneiro, Almada Negreiros, Santa-Rita Pintor, Luís de Montalvor.
 
 
7. Valores e atitudes fundamentais da geração do Orpheu
 
▪ O desejo de universalidade, de “[…] ter um pouco de Europa na alma” (F. Pessoa), que passava por uma perspetivação europeia do “modo de ser literário” português. Tratava-se de efetuar uma profunda e radical revisão de toda a literatura nacional através de um novo espírito, liberto dos «fantasmas» do servilismo e de qualquer sentimento de inferioridade face ao estrangeiro.
 
▪ O desejo de rutura com a literatura do passado, que passava por uma viragem renovadora e agressiva rumo ao futuro, orientando-se para a descoberta de novas expressões da sensibilidade, e despertava o fascínio por tudo quanto fosse novo.
 
▪ A exigência de absoluta originalidade e novidade.
 
▪ A exigência de pleno cosmopolitismo, misturado com um patriotismo muito especial.
 
▪ A abolição do tradicionalismo e a atenuação do provincianismo tipicamente portugueses, tendo como alternativa a instauração de uma nova “visão do mundo” capaz de revolucionar e reformar totalmente a mentalidade cultural nacional. Para isso, era necessária uma abertura e apropriação criativa aos valores europeus.
 
▪ Estética aberta, expansiva, eclética e disponível a tudo quanto fosse diferente, estranho, exótico. Dela fariam parte uma extrema plasticidade e versatilidade, características positivas da alma portuguesa que seriam assim renovadas e multiplicadas pelos poetas órficos, através de uma tendência para a diversificação estética expressa pelo delírio sensacionista do “ser tudo de todas as maneiras”. Esta experiência de pluralidade implicava uma dispersão e um desdobramento sistemático em todas as práticas culturais e potencialidades civilizacionais possíveis.
 
▪ A implicação entre a arte e a vida: criava-se civilização fazendo arte e fazia-se arte em função de uma busca libertação dela mesma e do ser-artista.
 
▪ A procura de novos padrões de toda a civilização ocidental: o seu «sê plural como o universo» reflete a fragilidade e o niilismo de toda a consciência moderna, uma «consciência infeliz» ao descobrir a absoluta imprevisibilidade essencial de tudo, bem como o sentimento de incerteza infinita que a possibilidade – cada vez mais precária – de pensar a divindade ou qualquer unidade provoca.
 
▪ A criação de diversos «ismos».
 
▪ Esta geração caracterizou-se por um modo de ser onde se salientavam as sensibilidades superiormente requintadas e fortemente individualistas, determinadamente antissociais e antissociáveis, que cultivam a diferença e a exceção e professam um arrogante e assumido aristocracismo de tonalidade vincadamente decadente e elitista.
 
▪ Valorização do raro e do insólito, fazendo uso e abuso de toda a espécie de blagues.
 
 
8. Princípios / Características
 
▪ Os artistas produzem obras cheias de sarcasmo, ironia e alguma provocação, enveredando por um caminho de rutura com a tradição, adotando uma atitude radicalmente subversiva, pondo em causa padrões morais, políticos, artísticos e religiosos dominantes há séculos.
 
▪ Recusam-se os velhos temas, as estruturas poéticas, dramáticas e narrativas já gastas e sobretudo a linguagem poética tradicional.
 
▪ As personagens da literatura modernista são, frequentemente, seres vulgares, sem nada de excecional que as distinga dos demais (ex.: simples funcionários que sofrem a pesada máquina social, burocrática e quotidiana – Ulisses, de James Joyce; O Processo, de Kafka; O Livro do Desassossego, de Bernardo Soares).
 
▪ Esse esbatimento da força do indivíduo traduz-se, por vezes, na perda da identidade, da unidade do «eu», chegando mesmo ao desdobramento da personalidade (ex.: Fernando Pessoa).
 
▪ A criação de uma linguagem original, criativa, que recorre até à desarticulação da própria linguagem e ao uso novo e inesperado da metáfora
 
▪ A reinvenção das formas nas artes visuais e o uso de técnicas como a colagem, paralelamente à reinvenção da linguagem ao nível da forma da expressão, que se traduz num certo experimentalismo, de que são exemplos a poesia caligramática (por exemplo, Apollinaire), a linguagem da publicidade, a linguagem da imprensa, etc.
 
▪ A desconstrução da linguagem verbal.
 
▪ A diversidade e a pluralidade.
 
▪ A associação da literatura às artes plásticas.
 
▪ A interação de linguagens, em que as artes plásticas (por exemplo, o Cubismo), a literatura, a arquitetura, as artes gráficas, a publicidade, o cinema (o filme Tempos Modernos, de Chaplin, reflete a pequenez do Homem, triturado pelas engrenagens de uma produção industrial desenfreada), etc., interagem estreitamente e se complementam;
 

sexta-feira, 2 de outubro de 2020

Contexto histórico da poesia trovadoresca

 
▪ No território encostado à fronteira líquida do Oeste Atlântico, existiu, em tempos e espaços diferentes, uma unidade administrativa e política. A mais duradoura e a que mais influenciou o etnos, a língua, lo desenho das estradas, a estrutura das cidades, a articulação da via marítima da costa foi a Lusitânia romana. Durante muitos séculos, marcou a realidade política e social; uniu o território desde a margem esquerda do Douro ao mar do Algarve e engordou um pouco na fronteira leste. Mérida era a cabeça regional e política.
 
▪ A ocidente, o reino suevo constituiu uma segunda construção política. A sua capital era a Braga romana, envolveu a Galiza e, durante um século, o território português até ao Mondego.
 
▪ A terceira construção política, efémera, ocorreu com o estabelecimento do Reino e Condado da Galiza. Surgiu pela primeira vez com Ordonho de Leão no início do século X e tinha Viseu como uma das capitais. Anos mais tarde, o conde Raimundo de Borgonha, casado com D. Urraca, filha de Afonso VI e futura rainha de Leão e Castela, manteria esta unidade, sob a forma de condado, entre 1093 e 1096. O reino da Galiza assentava numa realidade sociológica e cultural muito própria, ainda hoje visível no terreno situado a norte do rio Douro, e bem expressa na língua galaico-portuguesa.
 
▪ A última construção é a que se refere ao Condado Portucalense, que reunia os territórios entre os rios Minho e Mondego e que remonta a 1096 e ao conde Henrique de Borgonha. Iniciada em 718, a reconquista cristã só viria a terminar em 1492 com a conquista do reino de Granada. Para auxiliar os povos peninsulares nesta empresa, chegaram à Península Ibérica, a partir do século XI, muitos cruzados vindos da Europa. Numa dessas vagas veio D. Henrique, a quem o rei Afonso VI de Leão e Castela concedeu, como gratidão pelos favores prestados, a mão da sua filha ilegítima, D. Teresa, e o Condado Portucalense (1096). Com este casamento, Henrique reuniu dois condados: o Portucalense propriamente dito, que remontava a Vímara Peres, no século IX, e o condado de Coimbra, organizado por Sisnando Davides de Tentúgal, após a conquista da cidade de 1604. De fora ficava a Galiza. Com a morte do marido, D. Teresa assumiu o governo do condado, mas seu filho, Afonso Henriques, vendo o perigo de o território portucalense se aliar à Galiza, combateu-a e, em 1143, foi aceite como rei de Portugal na Conferência de Zamora pelo rei de Leão, Afonso VII, mas o reconhecimento do papa só chegou em 1179, com a bula “Manifestis Probatum”, de Alexandre III.
 

Idade Média: designação e definição

 
▪ A Idade Média foi um período que se estendeu por mil anos, do século V ao século XV.
 
▪ Foi assim batizada pelos humanistas do Renascimento por ocupar o grande “vazio” situado entre a Antiguidade greco-romana e os tempos modernos, daí a designação Idade Média, isto é, época / idade no meio.
 
 
2. Definição
 
▪ Designa-se por Idade Média um largo período de dez séculos / mil anos, subsequente à queda do Império Romano do Ocidente às mãos dos invasores “bárbaros”, com a conquista de Roma em 476, e que se prolongou, segundo alguns historiadores, até 1453 – data da queda do Império Romano do Oriente, após a conquista de Constantinopla pelos Turcos – e, segundo outros, até 1492, data da descoberta da América por Cristóvão Colombo e da conquista de Granada, que representou a expulsão definitiva dos mouros da Europa.
 
▪ Considerada posteriormente como uma “longa noite de dez séculos” pelos intelectuais do Renascimento, foi reabilitada pelos românticos, que viam na Idade Média, sobretudo, uma época de afirmação das pátrias, línguas, literaturas, culturas e “identidades” dos diversos povos europeus.
 
▪ As datas apontadas são meramente representativas, para fins de “arrumação” de factos de diversa ordem, pelos historiadores. É evidente que não podemos considerar que até ao dia 31 de dezembro de 476 se pensava e vivia de uma maneira e que, no dia 1 de janeiro de 477, subitamente se passou a viver e pensar de outra forma.
 

quarta-feira, 2 de setembro de 2020

O Fim da Aventura, de Graham Greene

     Henry Miles, um funcionário do Ministério do Interior, é casado com Sarah, que já foi amante do narrador. Após um encontro fortuito, Henry, desconfiado da mulher após uma denúncia anónima, combina com o narrador que este finja interesse em Sarah para descobrir quem é o seu eventual amante atual. O narrador, um escritor com algum sucesso, tendo como pano de fundo a Segunda Guerra Mundial, relembra, em vários flash-backs, o seu romance com Sarah durante quatro anos, que ela deu por findo para se dedicar a outra relação extra-conjugal. Enquanto isso, contrata um detetive privado, de nome Parkis, que, juntamente com o seu filho, passam a vigiar Sarah, e fornecem ao narrador relatórios periódicos sobre as suas andanças.
     Certo dia, o narrador, querendo magoar Henry, dominado por sentimentos de ciúme e de vingança mesquinhos, confessa-lhe que foi amante da mulher e que esta teve muitos outros. No entanto, Henry reage molemente, frustrando os intuitos do narrador.
     Seguidamente, temos acesso a páginas do diário de Sarah, que se revela uma mulher mal-amada pelo marido (que só se preocupa com a sua carreira política e a ascensão nos ministérios), desiludida e descrente. A sua grande esperança na possibilidade de alcançar a felicidade seria ao lado de Maurice, o amante e narrador da obra, que vive na expectativa de reencontrar. A aventura amorosa iniciou-se por volta de 1939 e terminou cerca de 1944 por iniciativa dela, após uma promessa feita de que não continuaria sua amante, na sequência da deflagração de uma bomba alemã perto da casa onde se encontravam, que ela pensava tê-lo morto.
     Em fevereiro de 1946, ela prepara-se para deixar o marido e juntar-se a Maurice, quando Henry chega a casa a chorar e diz-lhe que a ama, o que a leva a prometer-lhe que não o abandonará. Subitamente, Maurice é surpreendido pela notícia da morte de Sarah, vítima de uma constipação que se agravou. Ainda mais surpreendente é o facto de Maurice ter convidado Henry a morar consigo por algum tempo e este ter aceitado.

A Liga dos Homens Assustados, de Rex Stout

     Nero Wolfe recebe Andrew Hibbard, que lhe promete 500 dólares por semana para que o proteja de Paul Chapin, um ex-amigo que um grupo de compinchas aleijou grave mas acidentalmente, durante uma brincadeira, há 25 anos, e que agora se procura vingar, assassinando esse conjunto de homens. Wolfe não aceita a proposta e Hibbard é assassinado. Paul Chapin é presentemente um escritor de livros policiais onde, aparentemente, descreve os crimes que vai cometendo.
     Wolfe reúne, em sua casa, a Liga de Expiação, isto é, os homens responsáveis pela desgraça de Chapin, propondo-lhes a libertação da perseguição de que estão a ser alvo, mediante um determinado preço. A meio da reunião entra Chapin, o que constitui uma espécie de desafio a Wolfe, apresentando-se como inocentemente acusado. Após a sua partida, um dos homens recorda o acidente que marcou para sempre Chapin: Andrew Hibbard, um aluno de Harvard do segundo ano, deixa a chave do quarto do lado de dentro e, como era da tradição, escolhem um caloiro para, saindo por uma das janelas do corredor, caminhar por um rebordo estreito até à janela do quarto fechado e entrar por aí. Esse caloiro recusa a tarefa, pois o quarto situa-se no terceiro andar, mas é forçado pelos outros e acaba por cair, tendo estado posteriormente dois meses no hospital, onde é operado três vezes. No dia em que abandona o hospital, Chapin, o caloiro vítima dos trinta e cinco colegas, envia-lhes uma cópia de um poema por si escrito.
     Chapin era natural da mesma cidade de um dos homens, o Dr. Burton, e namorava aí com uma jovem. Esse namoro terminou após o acidente e essa jovem acaba por desposas esse Dr. Burton. Já em Nova Iorque, a Sr.ª Burton contrata uma criada, Dora Ritter, com quem Chapin casa. Dias depois, Dora Chapin, ex-Ritter, surge no escritório de Wolfe apresentando vários golpes no pescoço, afirmando ser o marido o autor da agressão, num momento de fúria. No entanto, o detetive, sem explicar como, descobre que a mulher auto-infligiu as feridas no pescoço.
     Um dos membros da Liga, o arquiteto Farrell, escreve um bilhete informando que parte para Filadélfia, no qual Wolfe descobre os «n» e «a» desalinhados que caracterizam os bilhetes que o assassino envia a todos os membros da Liga quando inflige uma morte. Archie Goodwin parte no seu encalço e, quando o encontra, é-lhe dito por Farrell que a máquina pertence ao Harvard Club e é utilizada por vários dos seus membros. Nero Wolfe solicita a Archie a compra de uma máquina de escrever nova para colocar no lugar da do Harvard Club, que trará para casa do detetive.
     Wolfe convoca, via Archie, um dos detetives que vigiam Chapin, desconfiando já que se trata do desaparecido Hibbard. Wolfe propõe-lhe que se mantenha isolado, em sua casa, para que possa dar todos os passos de forma a levar Chapin a confessar. No final desta conversa, um dos «assalariados» de Wolfe telefona, informando-o de que a polícia vai prender Chapin, acusado da morte, a tiro, do Dr. Burton.
     A Sr.ª Burton odeia Chapin pela sua monstruosidade, apesar de já ter sido sua noiva, e conta que ouviu tiros e, quando chegou ao local do crime, este estava às escuras e Chapin de joelhos no chão.
     Archie Goodwin vigia Dora Chapin e acaba por se fazer convidado da sua casa, acabando por ser drogado, juntamente com Pitney Scott, outro dos ex-alunos de Harvard, na atualidade um taxista alcoólico. Rouba o casaco e o táxi do taxista e a carteira de Archie, que envia a Wolfe, juntamente com um bilhete, ameaçando que matará Archie se o detetive não se encontrar com ela. Wolfe acede e entra no táxi roubado. O objetivo de Mrs. Chapin é obrigá-lo a confessar a manigância a que recorreu para estender a armadilha ao marido.
     Wolfe convoca os membros da Liga para sua casa, às 9 horas da noite. Nessa reunião, apresenta a confissão de Chapin de que não matou ninguém; a sua vingança pelo que lhe sucedera à 25 anos é executada nos livros que escreve. O único assassinado foi o Dr. Burton; os outros homens foram vítimas de casos acidentais. O seu único pecado foi o de se aproveitar dessas mortes para escrever os bilhetes com que pretendia aterrorizar os outros indivíduos.
     O criminoso é outro e assassinou o Dr. Burton pois, enquanto corretor, roubou a empresa deste e, quando foi descoberto, decidiu pôr-lhe termo à vida, armando ao mesmo tempo uma cilada a Chapin.

O Americano Tranquilo, de Graham Greene

     Pyle, um oficial norte-americano destacado no Vietname, colónia francesa, é assassinado em Saigão.
     Thomas Fawler é o repórter, "amigo" de Pyle, que recorda episódio da guerra que se desenrola naquele país, episódios relativos ao próprio Pyle e o triângulo amoroso que se estabelece entre os dois e uma jovem vietnamita, Phuong.
     Relativamente à guerra, uma das questões é a forma como o comando francês destaca as vitórias (pequenas ou grandes) no terreno e as baixas do inimigo, sonegando qualquer informação sobre as derrotas ou as suas próprias baixas; outra é a falta de material aéreo de combate, nomeadamente helicópteros; uma terceira passa pela falta de primeiros socorros, o que faz com que mesmo os feridos ligeiros corram perigo de vida.
     Entretanto, Fawler é nomeado editor para os assuntos internacionais, por isso terá de regressar a Londres, apesar de esse não ser o seu desejo. Escreve à mulher, pedindo-lhe o divórcio, por causa do seu «affair» com Phuong.
     Durante um ataque noturno de que são vítimas, Pyle acaba por salvar Fawler, ferido, transportando-o às costas. Entrementes, este recebe a resposta negativa da mulher ao pedido de divórcio, numa carta onde está bem vincada a amargura dela; seguidamente, Fawler escreve a Pyle comunicando-lhe o oposto, isto é, que a esposa aceitara a separação.
     A verdade acaba por vir à tona e Phuong vai morar com Pyle, que revela o seu envolvimento em atentados, cometidos ao serviço da designada Terceira Força do general Thé, distinta dos Franceses e dos Comunistas. Certo dia, Fawler vê-se envolvido num desses atentados, que originalmente tinha como finalidade uma parada militar, entretanto cancelada, e que acaba por apenas vitimar civis inocentes. Posteriormente, é-lhe comunicado que permanecerá mais um ano no Vietname.
     No final, recebe um telegrama da mulher concedendo-lhe o divórcio, ficando assim disponível para Phuong.

O Natal de Mr. Krank, de John Grisham

     Luther Krank e a esposa despedem-se da filha Blair, que parte para o Peru no contexto de uma ação humanitária. Cansado da rotina e dos gastos excessivos, por exemplo em objetos inúteis de Natal, Luther propõe à mulher um Natal diferente: uma viagem às Caraíbas.
     Antes de partir, procura fugir às tradições natalícias, como a de colocar um boneco de gelo no telhado de cada casa, ou o donativo habitual, através da compra de um calendário, para a Associação de Polícia, no valor de cem dólares, ou a venda de bolos de frutos pelos bombeiros. Luther Krank tudo recusa, não obstante a crescente irritação surda da mulher e as provocações dos vizinhos, que tudo fazem para o vergar e humilhar.
     Na véspera de Natal, Blair telefona aos pais, informando que está em Miami e vem passar o Natal a casa e traz consigo o noivo, um médico peruano. O cruzeiro fica, assim, anulado e os Krank dispõem de meia dúzia de horas para preparar a tradicional festa de Natal. Porém, quando Luther sobe ao telhado para nele instalar o boneco de neve de 20 kg, feito de plástico, escorrega no gelo. O boneco cai ao chão e desfaz-se, enquanto Krank é salvo da morte graças ao facto de as suas pernas se terem enrolado nas cordas e nos fios elétricos. Depois, os vizinhos e os bombeiros acorrem e retiram-no da posição de suspenso, de cabeça para baixo, a 2, 5 metros do solo.
     Ao conhecerem os motivos que levaram os Krank a anular o cruzeiro e a fazer a festa de Natal, os vizinhos solidarizam-se e cada um contribui com o necessário para que a celebração aconteça. Quanto aos bilhetes de cruzeiro de dez dias às Caraíbas, Luther oferece-os a um casal vizinho, cuja mulher está doente com cancro, restando-lhe apenas seis meses de vida.

terça-feira, 1 de setembro de 2020

O Roubo do Colar de Anúbis, de Paul Doherty

     Egito, cerca de 1479 a.C. No Templo de Anúbis, decorrem as negociações entre Hatusu, a rainha e viúva do faraó Tutmés II, e Tuchratta, rei dos Mitânios, por ela derrotado, para um tratado de paz, o qual permitiria a Hatusu ser definitivamente aceite no trono, que usurpara após a morte do marido meio-irmão. Uma dançarina é assassinada no Templo.
     Sinuhe, um viajante, prepara-se para negociar com os Mitânios o seu relato escrito das viagens feitas. No entanto, é assassinado com uma picada no pescoço pela mesma pessoa, de máscara de coiote, que liquidara a dançarina e que lança o seu corpo ao Nilo, onde é devorado pelos crocodilos, e leva os eu livro.
     A "Glória de Anúbis", uma ametista do tamanho de um punho masculino, é roubada e o guarda responsável por ela, fechado na capela, é encontrado morto com uma faca espetada no coração. A porta do compartimento é trancada por dentro e a chave fica na posse do guarda. Assim sendo, como correu o crime?
     Entretanto, Amerotke é convocado pela rainha-faraó para investigar o caso. Entrementes, Snefru, um dos enviados mitánios é assassinado de forma semelhante. Uanef, princesa mitânia, meia-irmã de Tuchratta, manobra na sombra. Enviados seus procuram um serralheiro, amnistiado pelo juiz Amerotke para lhes prestar auxílio na lida com algumas fechaduras, mas aquele recusa.
     Passados alguns dias, alguém atrai Ueni, um dos arautos de Hatusu, a uma armadilha no fosso dos cães selvagens e é morto por estes. Ao analisar os aposentos de Ueni, Amerotke encontra aí pistas que apontam o arauto como o assassino de Sinuhe e o autor do roubo do manuscrito.
     Um estranho visita Kheti e Ita, amantes e, respetivamente, sacerdote e sacerdotisa do Templo de Anúbis. A misteriosa personagem aponta Kheti como o autor do roubo da "Glória de Anúbis" e combina com ele a sua venda, a troco de diversas riquezas. A figura ataca também Mareb, outro dos arautos, e só foge quando é interrompida por Chufoi, o servo de Amerotke.
     Um grupo de mutilados da aldeia dos Rinocerontes ataca o serralheiro Belet e a mulher, raptando-os e assassinando o seu cão e a sua criada.
     Entretanto, Amerotke prova que foram os sacerdotes Kheti e Ita que, comprados por Ueni, ao serviço dos Mitânios, cometeram assassínios e roubaram a "Glória de Anúbis". Ita seduziu o guarda do colar, que a deixou entrar; depois ela assassinou-o com o punhal e a chave do sacerdote foi substituída por outra semelhante, para dar a sensação de que nunca tinha saído da sua posse e que ele se mantivera sempre fechado à chave por dentro.
     Hunro e Menso, mensageiros mitânios, aparecem mortos também, da mesma forma que os anteriores crimes foram cometidos.
     Afinal, o "grande" criminoso é Mareb. De facto, matou Ueni por vingança, pois este assassinara a mulher e o seu amante, amigo de Mareb. E cometeu a maioria dos outros crimes, porque estava a ser chantageado pelos Mitânios, que têm como prisioneiros o seu pai e o seu irmão. Mareb é condenado à morte, mas antes fornece a Amerotke uma lista de espiões mitânios que atuam em Tebas. Revela também que se prepara um assalto ao túmulo de Tutmés II, pai de Hatusu, onde existirá um diário que prova a impotência do faraó, logo que Hatusu não tem origem divina.
Related Posts Plugin for WordPress, Blogger...