“Composição VIII” é um quadro de
Kandinsky, pintor modernista russo, nascido a 4 de dezembro de 1866 e falecido
a 13 de dezembro de 1944, datado de 1923. Trata-se de uma pintura a óleo sobre
tela, de 140, 3 x 200, 7 cm, exposto atualmente no Museu Guggenheim de Nova
Iorque.
Este quadro é considerado pelo próprio
pintor como o auge das suas criações pós-Primeira Guerra Mundial. A obra é constituída
por diversas formas geométricas (círculos, semicírculos, triângulos e quadrados),
ângulos retos e agudos e linhas retas em várias direções, posicionadas em
locais estratégicos na tela, formando uma espécie de paisagem: os grandes
triângulos representam montanhas, enquanto o círculo do lado esquerdo superior
simboliza o sol.
Aparentemente caótica, por ser
assimétrica, a pintura estrutura-se a partir da técnica ponto, linha, plano,
isto é, o ponto constitui o «local» onde o objeto toca a tela, que são os
círculos. Quando o ponto se desloca, forma a linha e, sempre que esta se
desloca, forma o plano, que são as cores, que podem ser fluidas ou compactas,
como sucede com as formas geométricas. O conjunto constituído por cores e
linhas, forma três grandes triângulos, situados em planos diferentes.
Relativamente às cores, o fundo do
quadrado é claro e tripartido em tons que definem profundidade e conferem
dinamismo à pintura, provocando também um contraste de tonalidades entre esse
fundo e os elementos que se sobrepõem, todos eles com cores mais escuras. O
pintor usa tonalidades diferentes dentro das formas, dando energia à sua geometria,
como o círculo amarelo com uma auréola azul, em oposição ao círculo azul
contendo uma auréola amarela.
O uso dos círculos, retângulos, semicírculos,
triângulos e outras formas geométricas é consistente com a crença de Kandinsky
nas propriedades místicas das formas geométricas, enquanto as cores são
escolhidas pelo seu impacto emocional.
No canto superior esquerdo, encontramos
um círculo roxo dentro de um círculo preto envolvido por um halo de dupla
camada rosa e laranja. As bordas do halo, aparentadas à coroa em torno de um
sol eclipsado, contrastam fortemente com as linhas nítidas do círculo preto com
o seu núcleo roxo. Um círculo vermelho parcial, emergindo do canto inferior
direito da periferia do círculo preto e cortando o seu halo, é delimitado pelo
seu próprio nimbo amarelo, que se mistura com as coras rosa e laranja da forma
adjacente. Um círculo amarelo delimitado por uma linha preta fina, posicionado
no terço inferior da tela, possui um halo constituído por uma camada interna
azul e uma camada externa roxa. Outro círculo, azul com uma borda salmão,
localizado perto da parte inferior da tela, é rodeado por um anel de fogo
amarelo. Os círculos situados à direita da tela, ao contrário, não possuem halos.
O halo é um tema artístico
recorrente ao longo do tempo e em diversas culturas. Por seu turno, a luz,
nalgumas tradições espirituais e filosóficas, representa a consciência
superior, enquanto uma pessoa que se deleita na luz da razão pode ser
considerada iluminada. Cabeças de divindades gregas e romanas, como, por
exemplo, Hélios e Júpiter, eram circunstancialmente mostradas circundadas por
um nimbo de luz, uma representação que terá sido adotada pelos primeiros
cristãos que viviam no mundo greco-romano. Kandinsky, um apreciador do
cristianismo ortodoxo russo, cuja fé influenciava frequentemente os termos das
suas pinturas, deveria estar ciente da importância do halo na iconografia religiosa
russa.
Entre 1921 e 1923, tiveram lugar
seis eclipses lunares, coincidindo dois no ano da criação de “Composição VIII”,
o que poderá ter constituído uma inspiração para a composição do círculo preto
com a sua coroa rosa e laranja. O preto, de acordo com a teoria sónica da cor
de Kandinsky, significava silêncio externo, enquanto o laranja indicava a voz
masculina mais alta e os instrumentos musicais correspondentes na faixa de
contralto. O rosa, enquanto mistura de vermelho e branco, pode ser interpretado
como um amortecimento de sons cacofónicos ou uma suavização de tons mais
ásperos. O amarelo, formando um halo em torno dos círculos azuis e vermelhos, representa
perturbação e raiva, enquanto em termos musicais significa trombetas e fanfarras.
Uma das três grades, formadas por quadriláteros e dispostas numa forma que lembra um prédio alto, aparece no lado esquerdo da tela e aparece sob um triângulo preto forrado e parcialmente formado por azul claro que se funde com o fundo creme. Os círculos terão sido usados pelo pintor para representar o simbolismo planetário, o que se tornou comum durante o período abstrato da sua carreira.