Os provérbios contribuem para o
enriquecimento da linguagem do romance. Alguns deles, pelo seu uso constante,
colam-se às personagens, tipificando-as. É o que sucede, por exemplo, com a
frase “Para a cabra e p’ra mulher, rédea curta é o que se quer”, que traduz o
marialvismo de Tomás Manuel.
Outros, quando aplicados a Tomás
Manuel da Palma Bravo, caracterizam-no indiretamente como o burguês sem
lucidez, opressor e poderoso que não merece possuir esse poder: “Estes tipos
quanto mais nos olham menos nos querem ver”; “tal senhor, tal cão”, “um homem
dá tudo menos os cães e os cavalos”; “quem trata mal os criados é porque não me
pode tratar mal a mim.”
Outro conjunto de provérbios
aplicados a esta personagem, de caráter social, comprova que a grande maioria
dos mesmos é adulteração do narrador, imitando os genuínos. Os que Tomás Manuel
usa são todos inventados, o que atesta uma falsa erudição da personagem.
Pelo já exposto, estes provérbios
contribuem para a crítica de cariz social e económico, para a construção de um
retrato da sociedade da época. Por exemplo, no que diz respeito à mulher, essas
frases retratam-na de forma depreciativa. Atentemos nos seguintes: “Rédea curta
e porrada na garupa”; “Fazer filhos em mulher alheia é perder tempo e feitio.”
Os mesmos sugerem o machismo da época, bem como a prepotência, a falta de
liberdade e a violência a que a figura feminina estava sujeita. Por outro lado,
apontam para a prepotência de Palma Bravo face a Maria das Mercês, apenas
contrariado por um dito do Cauteleiro: “quem muito fornica acaba fornicado.”
A falta de vocabulário do Engenheiro
é especialmente evidenciada pelo recurso frequente ao advérbio «positivamente»,
que funciona como uma espécie de muleta, na qual ele se apoia sempre que lhe
faltam as palavras ou como suporte de uma afirmação, à partida insustentável, e
que ele procura instituir concluindo como o referido advérbio.
A linguagem popular de Tomás Manuel
é evidenciada também pelas expressões que usa para se referir às suas regras de
ouro para a caça e a pesca: “na caça cão e batedor”, “os cães são a memória dos
donos”, “Água para os Peixes, Vinho para os Homens (y mierda si no te gusta”).
O caráter pitoresco da linguagem
estende-se a todas as personagens, visível nos seguintes exemplos: “cala-te
boca”; “quem se mata leva destino”; “preparou a cama deitou-se nela”; “toda a
abundância traz castigo”; “quem não se sente não é filho de boa gente”;
“mexericos do povo que onde não vê põe ouvidos”; “imaginação e velhacaria fazem
boa companhia”. Pela observação destes exemplos, facilmente se comprova que
muitos dos provérbios introduzidos na obra são adulterados e/ou parodiados,
todavia respeitam a estrutura que lhes é inerente.
Por seu turno, o povo, no seu
conjunto, acredita em lendas, mitos, parábolas e outras historietas povoadas de
fantasmas, lobisomens, cães-manetas e almas penadas. Essa crença permite ocupar
o tempo, que se arrasta e demora a passar, tardando em trazer a tão ansiada
mudança, a acabar com as profecias e maldições que pairam sobre a aldeia, tal
como consta na Monografia do Dom Abade.
Deste modo, podemos concluir que,
por detrás da aparente simplicidade da linguagem, há uma mensagem só acessível
aos leitores mais atentos, àqueles a quem o narrador se dirige, uma forma de
ironizar com a censura.
Por outro lado, o coloquialismo (“se
me permitem”, “mas continuemos”, “fiz-me entender leitor benigno? fui claro
monge amigo? e nós minha hospedeira?”) tem uma dupla função. Por um lado, aproxima
o leitor do texto; por outro, alerta-o para a mistura de planos, para a ironia
fina que está presente ao longo das páginas e para a necessidade de saber ler
nas entrelinhas e não ser “alguém desprevenido”. Expressões como “a dar com um
pau”, “a pata que o pôs”, “atrás de saias”, “quem o mandou ser parvo”, “que me
tem feito a vida negra”, etc., tornam-se clandestinas e constituem um ferrete
para o leitor que as partilha com o narrador.