O motor de Hamlet
é a vingança: o príncipe da Dinamarca procura vingar a morte do seu pai.
Estamos na presença de um tópico presente em inúmeras obras ao longo dos
tempos, no entanto esta apresenta uma inovação: a personagem que deve executar
a vingança não consegue fazê-lo, pois debate-se com as implicações morais desse
gesto. É essa inquietação moral que o leva a hesitar e a refletir longamente
sobre a questão, pretendendo antes de agir, talvez para justificar a si próprio
a sua inação, certificar-se da autoria do assassinato do pai e até da
genuinidade do fantasma. Em simultâneo, várias personagens vivem os seus
conflitos, lutam e morrem. Tendo em conta o final da peça, caracterizado por
uma sucessão de mortes, é lícito concluir que, em última análise, a morte
acabará por encontrar todos, independentemente das suas ações (ou inações).
A vingança
é, de facto, um catalisador da ação da peça, desde logo porque são várias as
personagens que a procuram: o fantasma do pai de Hamlet quer que o filho vingue
a sua morte; Laertes quer vingar a morte de Polónio, seu pai, e de Ofélia, sua
irmã; Fortinbras buscar vingar a morte do pai e as derrotas militares.
Curiosamente, de todas as que se movem por esse sentimento, é esta última a
única que não perde a vida no final da peça; pelo contrário, vem triunfante da
guerra e prepara-se para ocupar o trono da Dinamarca.
Quanto a
Hamlet, defronta-se com duas decisões: vingar o seu pai, matando Cláudio, ou
atentar contra a própria vida para não ter de assassinar o tio / padrasto.
Inicialmente, procura concretizar o desejo do pai, mas logo tem de se
confrontar com as suas indecisões e questionamentos morais e não age. Quando,
finalmente, se decide a agir, é demasiado tarde e acaba ele próprio morto, embora
nos seus instantes finais tenha concretizado a vingança, assassinando Cláudio.
Porém, a morte do protagonista não resulta propriamente da sua própria ação,
embora se tenha tornado inevitável, visto que é consequência da necessidade de
Cláudio proteger a sua posição e o seu poder e que desencadeou toda uma série
de eventos. Ou seja, a morte de Hamlet resulta das ações do rei,
independentemente da decisão do príncipe acerca do pedido do fantasma do pai.
O contraste
com Fortinbras é claro e marcante. O jovem príncipe sucede ao seu pai no trono
da Noruega e manifesta desde logo a intenção de recuperar as terras perdidas
pelo progenitor no campo de batalha, por isso marcha pela Europa para atingir
esse desiderato. Quando Hamlet toma conhecimento desses planos, toma
consciência da sua fraqueza em tomar medidas decisivas para vingar a morte do
pai. No final da peça, Fortinbras é recompensado com o poder e o todos os
demais são castigados com a morte. Não obstante, é possível pôr a hipótese de
ambos terem crescido ao longo da peça, apesar das vinganças que empreendem ou
tentam empreender, ao contrário do que sucede com Laertes.
O desfecho
da peça é caracterizado pela morte de todas as personagens centrais. Como
interpretar esta carnificina? Por um lado, a vingança é inútil, pois nada traz
de bom, apenas morte, sofrimento e dor; por outro, independentemente do que
qualquer pessoa faça, não faça ou planeie fazer, a morte é inevitável.
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