O grupo dos delatores / traidores (Vicente, Andrade Corvo e Morais Sarmento) funciona como uma espécie de grupo-sombra que age segundo os seus interesses e conveniências, obtidos através do exercício do Poder, não demonstrando quaisquer princípios ou valores éticos e morais em se vender ("Meu amigo: você desconhece o que se compra de respeitabilidade com uma pensão anual de 800$00..." - pág. 47). Com efeito, o seu papel na peça «resume-se» à provocação e à denúncia, pelo qual são premiados e não castigados, como seria desejável. No fundo, estas figuras corporizam o meio utilizado pelos governadores para alcançarem o seu fim: a condenação de Gomes Freire de Andrade (daí serem apelidados, ironicamente, de «patriotas»).
Andrade Corvo é um oficial do exército («Mau oficial, ignorante...»), «... promovido pela denúncia, já que o não pode ser por mérito.». Ex-maçon, ambicioso e materialista ("800$ por ano!" - pág. 45), é um delator que possui grande poder argumentativo, como o comprova o diálogo que mantém com Morais Sarmento, quando este aparenta alguns escrúpulos por estar a contribuir para a condenação de um inocente, em que vence esses receios e hesitações do companheiro. O seu nome liga-se à simbologia disfórica do corvo, ave de mau agouro. Dedicado à «causa» do Poder, representado pelos três governadores, que o consideram bem vestido (vaidoso) e «amigo dos prazeres») pretende ser promovido pela denúncia. É esta personagem que confirma aos três governadores a existência de uma conspiração e o nome do general Gomes Freire de Andrade como líder da mesma.
Por seu turno, Morais Sarmento é capitão do exército, inseguro e hesitante, aparentando ficar atormentado pelos remorsos e pela sua consciência e receando ser rotulado de traidor por causa do processo que levará à condenação à forca do general Gomes Freire ("O que vão dizer de nós" - pág. 46; "Muitos duvidarão."; "Chamar-nos-ão denunciantes" - pág. 47; "Não falarão connosco."; "Os nossos filhos..."). Todos estes pretensos rebates de consciência são ardilosamente desmontados pelo companheiro de denúncia, Andrade Corvo, que o convence, dessa forma, a prosseguirem a sua senda, facto que poderá significar que as preocupações e a sua consciência de culpa de Morais Sarmento são, meramente, aparentes.
Estas duas personagens, além das características que as individualizam, funcionam como um par, um «mini-grupo», pois comungam da maioria dos traços que constituem o seu retrato. De facto, ambos são denunciantes e corruptos, vendendo-se a troco de dinheiro e de uma promoção; ambos são tratados com superioridade pelos governadores, que os apelidam ironicamente, como atrás já ficou esclarecido, de «patriotas»; ambos surgem em cena exclusivamente no acto I, visto que a sua missão termina quando pronunciam o nome do general como o chefe da conjura. Por outro lado, nunca andam sozinhos, dado que, não sendo honestos, necessitam constantemente de testemunhas que comprovem os seus falsos testemunhos / depoimentos: «Defendem-se sempre, andando em grupo, tal é o conhecimento que têm de si mesmos...».
Pelo que acima ficou resgistado, pode concluir-se que as figuras em análise neste «post» representam os delatores por excelência, aqueles que não possuem qualquer escrúpulo em trair, em mentir, em abdicar de quaisquer ideais, para satisfazer os seus interesses e os obscuros «interesses patrióticos» dos governadores. Por outro lado, põem a nu o exército português, pela sua desorganização e pela ausência de qualidade(s) de alguns soldados, oficiais e capitães para desempenharem adequadamente os seus cargos.
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