Noutra parte
do castelo, Horácio é abordado por um par de marinheiros que lhe entregam uma
carta de Hamlet. Na missiva, o príncipe diz-lhe que o seu navio tinha sido capturado
por piratas dois dias apenas após o início da viagem e ele tinha sido feito
prisioneiro. Além disso, pede-lhe que conduza os marinheiros à presença do rei
e da rainha, pois eles têm outras cartas para lhes entregar, e depois deve ir busca-lo
imediatamente. Hamlet acrescenta que tem muito que contar-lhe, nomeadamente
acerca de Ronsencrantz e Guildenstern, que estão a viajar para Inglaterra.
Horácio leva os marinheiros até o rei e, posteriormente, segue-os ao encontro do
jovem príncipe.
quarta-feira, 7 de agosto de 2024
Resumo da cena 6 do ato IV de Hamlet
Análise da cena 5 do ato IV de Hamlet
Há algo
muito podre no reino da Dinamarca: Polónio morreu e foi sepultado em segredo;
Hamlet prepara-se para partir, forçado, para Inglaterra; Ofélia parece cada vez
mais ensandecida; o povo está perturbado e murmurando entre si. Para compor o
ramalhete, Laertes está de volta à Dinamarca e possui a legitimidade moral que
falta a Cláudio por vários motivos e a que Hamlet perdeu ao assassinar Polónio.
O regresso de
Laertes é muito significativo. Desde logo, intui que Cláudio é um assassino,
embora pelo ângulo errado, ou seja, supõe que o rei assassinou Polónio, o que
não é verdade, pois a sua vítima foi o velho rei Hamlet. Por outro lado, é
nítido o contraste que existe a sua figura e a do príncipe dinamarquês. De
facto, este é muito reflexivo e hesitante, daí as enormes dificuldades que
manifesta em agir, enquanto Laertes é ativo e menos reflexivo. Além disso, não
é atormentado pelas questões morais que inundam o jovem príncipe, daí que o seu
único pensamento seja o de vingar a morte do seu pai. Por outro lado, Laertes
parece uma figura desequilibrada e irrefletida, daí que o desejo de vingar o
pai a todo o custo será a sua ruína, arrastando consigo outras personagens para
o precipício. Ele só pensa em vingar o pai o mais rápido possível e considera
tal um dever e uma questão de honra, daí que se precipite, por exemplo, quando
tira conclusões apressadas sobre quem terá sido o homicida. Seja como for, é
quase certo que a sociedade dinamarquesa da época prefira a postura de Laertes
à de Hamlet, pois acreditava no castigar das injustiças.
Cláudio,
astuto, aproveita as circunstâncias para o manipular e cativar, tendo na mente
a possibilidade de o aproveitar para a sua trama com Hamlet, por isso comporta-se
como um amigo solidário e sensato de Laertes, procurando que este seja seu
aliado e um oponente do príncipe. Quando, mais tarde, o rei o questiona,
querendo saber até onde está disposto a ir para vingar o pai, o filho de
Polónio é claro e decidido, afirmando que está disposto a cortar a garganta de
Hamlet na igreja (ato IV, cena 7), o que contrasta com a postura do príncipe,
que se recusou a matar Cláudio enquanto este estava ajoelhado em oração. A
questão da religião e da religiosidade é muito importante na época.
Outro dos
temas que perpassa a peça, nomeadamente esta cena, é a loucura, nomeadamente a
de Ofélia, marcada pela perda do pai e do amor de Hamlet. Essa sua
instabilidade emocional manifesta-se de várias formas, concretamente da
distribuição de flores e das canções que entoa. Nesta cena, a jovem distribui
flores a várias pessoas, atribuindo-lhes vários significados: o alecrim
representa lembrança e os amores-perfeitos pensamentos. Dito isto, a
representatividade das flores é mais profunda, visto que se associam a várias
ideias e conflitos que atravessam a sua mente e o seu progressivo afastamento
da realidade e da razão. Por outro lado, como as suas canções estão conectadas
com amores e morte, as flores podem ser associadas à morte, concretamente à de
Polónio.
As canções
de Ofélia, embora possam parecer aos outros não ter sentido, na verdade
traduzem a sua obsessão com a morte do pai e do amor de Hamlet, bem como com um
desejo sexual algo ambíguo, com o qual ela parece lutar, depois de ter sido
desencorajada do desejo sexual pelo pai, pelo irmão e pela sociedade de forma
genérica. A temática das canções centra-se em homens infiéis: no início da
peça, parecia haver a possibilidade de se desenvolver uma relação amorosa entre
a jovem e Hamlet, no entanto a partir de certo momento vê-se confrontada com um
príncipe manipulador, desconcertante, aparentemente dominado pela loucura e
cruel. Quase em simultâneo, ela perde a figura paterna, sempre presente, e um
irmão preocupado e amoroso. Isto é tão mais importante quanto as mulheres, na
época, tinham pouca importância e valor, estando sistematicamente dependentes
dos homens. É também o caso de Ofélia. Todavia, neste momento, todas as figuras
masculinas morreram ou estão distantes, daí que ela esteja sem balizas e
apoios.
Por outro
lado, a temática das canções pode associar-se à decadência, não só dos corpos,
mas da situação política. Numa delas, refere-se a um homem que é levado para o
túmulo num caixão aberto, o que representa a ideia de que violência gera mais
violência, depravação moral gera mais depravação moral. Convém sempre recordar
as palavras de Marcelo, quando afirma que algo está podre no reino da
Dinamarca. Ora, a canção da jovem retoma esse tópico, visto que a letra fala da
morte como se esta estivesse em exposição em Elsinore. Assim sendo, é lícito
concluir que o desejo e a busca de vingança apodrecem a monarquia dinamarquesa,
acelerando a decadência moral já existente há muito.
Voltando à
loucura, é curioso observar que este tema faz contrastar Hamlet com outra
personagem: Ofélia. Com efeito, o príncipe tem fingido estar louco como estratégia
para atingir os seus objetivos, ao passo que a jovem é levada a esse estado por
um conjunto de circunstâncias externas.
Resumo da cena 5 do ato IV de Hamlet
A ação
retorna ao castelo de Elsinore. Ofélia solicitou uma audiência a Gertrudes,
porém a rainha está relutante em a receber, pois teve conhecimento de que a
jovem tem agido estranhamente desde a morte do pai. No entanto, Horácio diz-lhe
que Ofélia é merecedora de pena, explicando-lhe que a sua dor a deixou
enlouquecida e incoerente. A rainha consente, embora comente que a deterioração
da filha de Polónio poderá constituir o prenúncio de uma grande calamidade.
Ofélia
entra, entoando uma canção de amor e adornada de flores. Educadamente, a rainha
questiona-a sobre o significado da canção, porém a jovem prossegue cantando
sobre um homem falecido, enterrado e adornado com flores doces. Entrementes,
chega Cláudio e, ao ouvir a cantoria e o discurso desconexo de Ofélia, comenta
que a sua dor decorre da morte do pai. De facto, tudo em torno da jovem sugere
a sua loucura. Por exemplo, quando a cumprimenta e lhe pergunta como está, ela
refere-se a uma história enigmática sobre a filha de um padeiro que foi
transformada em coruja, querendo significar que as pessoas sabem quem são, mas
não necessariamente aquilo em que se tornam.
Ofélia
prossegue, interpretando músicas sobre amor não correspondido e mulheres
derrotadas por homens desleais. Subitamente, interrompe a canção para afirmar
que não consegue parar de pensar no seu pai, deitado no chão frio, e declara
que irá informar o irmão sobre estes acontecimentos. Seguidamente, despede-se
do casal real e sai do salão. Cláudio pede a Horácio que olhe pela jovem e o
homem sai também.
A sós,
Cláudio informa Gertrudes que Laertes regressou secretamente da França após ter
tomado conhecimento do passamento do pai. Enquanto dialogam, ouve-se uma grande
comoção no exterior, seguida da entrada de um mensageiro no salão. Este dá
conta que Laertes, acompanhado por uma multidão de plebeus, pegou em armas
contra Cláudio e que o povo está do seu lado, gritando pelas ruas que o filho
de Polónio deve ser rei. Gertrudes fica chocado com a notícia. Logo de seguida,
Laertes entra, furioso, no salão e declara que quer vingar a morte de seu pai. O
rei e a rainha procuram acalmá-lo: Cláudio reconhece que Polónio está morto,
enquanto a esposa, nervosa, esclarece que o marido não tem nada a ver com essa
morte. Entretanto, Ofélia retorna, cantado uma canção sobre um homem levado
para o túmulo num caixão exposto e oferecendo flores imaginárias (alecrim,
amores-perfeitos, erva-doce, margaridas), num estado claro de insanidade. Ao
observar o estado da irmã, Laertes, triste e enraivecido, jura vingança. O rei
aproveita o momento e convence-o a ouvir a sua versão dos factos e promete que
lhe entregará a sua coroa e o reino se se provar que ele ou a esposa tiveram
culpa na morte de Polónio. Uma vez provada a sua inocência, promete ajudar
Laertes a vingar-se do responsável pelo crime.
terça-feira, 6 de agosto de 2024
Análise da cena 4 do ato IV de Hamlet
Esta cena
recupera a personagem de Fortinbras, para o fazer contrastar com Hamlet,
fornecendo a este um exemplo da vontade de ação que lhe escasseia. De facto,
mostra-se espantado e impressionado com a obstinação com que o príncipe
norueguês mobiliza um exército, correndo o risco de condenar centenas ou
milhares de vidas e arriscando até a sua, para conquistar um pedaço de terra
sem valor. Esta constatação faz com que Hamlet se sinta fraco e inútil, porém a
mesma estimula-o a agir na sua busca de vingança contra Cláudio, encontrando
inspiração, portanto, na figura contrastante de Fortinbras, um homem decidido,
confiante e agressivo. Curiosamente, a sua situação presente parece a oposta da
que lhe possibilitaria tal desiderato, visto que ele está prestes a partir para
Inglaterra.
Interiormente,
Hamlet sempre pareceu relutar relativamente ao uso da violência, daí o
constante adiamento da vingança, todavia a sociedade em que vive celebra os
jovens ambiciosos e determinados como Fortinbras. Nada disto é novo ou
surpreendente, pois são inúmeros os exemplos da História que celebram a
ambição, o poder, o desejo de conquista. Assim sendo, a determinação do
príncipe norueguês e a consciência de que a sua postura é amplamente celebrada
constituem uma pressão extra para Hamlet, para vingar o assassinato do seu pai.
À medida que
a peça se vai desenrolando, o jovem príncipe ganha consciência da sua fraqueza
e incapacidade de agir, e o solilóquio que finaliza esta cena mostra-o claramente,
quando constata que todos os acontecimentos da sua vida enfatizam a sua indecisão
e inação. Deste modo, não há grande distinção relativamente aos animais, pois a
linha que os separa prende-se com o sentido de propósito e motivação. Por outro
lado, Deus deu ao ser humano o uso da razão, que lhe permite viver de forma
elevada.
Estas
reflexões são, obviamente, espoletadas pelo encontro com o emissário de
Fortinbras, que reuniu vinte mil homens para conquistar a Polónia, um
território sem valor, porém ele, que tem razões para agir (o pai assassinado e
a mãe desrespeitada), nada fez, não obstante toda a sua ira e ressentimento. O
seu único ato foi o assassinato de Polónio, um alvo fácil e não intencional.
Resumo da cena 4 do ato IV de Hamlet
Fortinbras
marcha à frente do seu exército a caminho da Polónia, perto de Elsinore.
Chegado aí, envia um emissário ao castelo para transmitir os seus cumprimentos
ao rei da Dinamarca e lhe pedir permissão para atravessar as suas terras,
relembrando-lhe o acordo que permitia às suas tropas atravessar território
dinamarquês. No caminho, o emissário encontra Hamlet, Rosencrantz e
Guildenstern a caminho do navio com destino a Inglaterra. Questionado pelo
príncipe, o capitão informa-o que estão a caminho da Polónia sob o comando de Fortinbras
e acrescenta que o território que pretendem conquistar é insignificante e seu
valor. Hamlet evidencia o seu espanto com a possibilidade de se travar uma
guerra sangrenta por algo insignificante, de que se percam vidas humanas por
questões fúteis ou triviais. O enviado despede-se de Hamlet e segue em direção
a Elsinore.
Num
solilóquio, Hamlet reflete que, ao contrário de Fortinbras, ele tem muito a
ganhar com a sua vingança sangrenta contra Cláudio e, não obstante, passa o
tempo a adiar a sua execução. Dito de outra forma, ele falhou até ao momento na
procura de vingança por o seu pai ter sido assassinado, enquanto Fortinbras,
que perdeu igualmente o progenitor, está decidido à guerra por motivos de honra
por causa de um pedaço de terra sem valor. A encerrar este solilóquio,
compromete-se de novo com o ato de que o fantasma o incumbiu.
domingo, 4 de agosto de 2024
O Assassinato de Roger Ackroyd, de Agatha Christie
Capítulo I: Enquanto o Dr. Sheppard almoça
A obra é narrada pelo Dr. James Sheppard, o médico da pequena vila inglesa de King's Abbot.
A história começa com a apresentação de King's Abbot, um lugarejo onde todos se conhecem e os mexericos são o passatempo e a ocupação preferidos da maioria. O Dr. Sheppard é um dos habitantes e é uma figura bem integrada na comunidade que conhece bem os seus pacientes e vizinhos.
Uma notícia abala a localidade: a morte de Mrs. Ferrars, uma viúva rica bem conhecida que tinha a reputação de ser reservada, sobretudo depois de ter perdido o marido há cerca de um ano. A sua morte é inicialmente atribuída a uma overdose de soníferos, mas logo surgem especulações sobre se se tratou de um acidente ou de um suicídio.
A comunidade logo se enche de comentários e rumores, especialmente porque se diz à boca cheia que a mulher estaria num relacionamento com Roger Ackroyd, um dos homens mais influentes e ricos do lugar, graças aos seus negócios, proprietário de uma fábrica que vende rodas para comboios.
O Dr. Sheppard é chamado para atestar a morte. Quando regressa a casa, tem de enfrentar a sua irmã Caroline, uma personagem curiosa que adora coscuvilhar a vida alheia. De facto, ela é a principal fonte de coscuvilhices na vila, graças essencialmente a uma rede de informantes que a mantém informada sobre tudo o que acontece. Assim, ela interroga o irmão de imediato sobre o que aconteceu e especula que Mrs. Ferrars estaria a ser chantageada por alguém que sabia que a mulher teria envenenado o próprio marido. Caroline acredita que a defunta estaria prestes a confessar o seu crime a Roger Ackroyd na noite que antecedeu a sua morte e que a pressão de ser descoberta levou-a ao suicídio.
Capítulo II: O anuário de King's Abbot
O capítulo II começa por fazer uma apresentação genérica de King's Abbot, uma pequena localidade rural inglesa cuja principal ocupação são os mexericos. A população jovem sã parte para outras personagens na sua maioria; pelo contrário, a vila é procurada por solteirões e militares aposentados.
O narrador, de seguida, apresenta Roger Ackroyd, um homem rico, com cerca de 50 anos, íntimo do padre, generoso nas doações à igreja, mas com fama de forreta nos gastos pessoais. Com cerca de 21 anos, apaixonara-se e casara com uma mulher cinco ou seis anos mais velha, chamada Paton. Tratava-se de uma viúva com um filho pequeno, Rudolph, que possuía um lado negro - era alcoólica - e que faleceu quatro anos após o casamento, vitimada pelo álcool. Depois da morte da esposa, Ackroyd criou o enteado como seu filho, no entanto, presentemente, parecia ter-se dedicado à malandragem. O doutor Sheppard dá conta também da proximidade que se foi estabelecendo entre Ackroyd e a Sr.ª Ferrars após a morte do marido desta, há pouco mais de um ano. Ao longo dos tempos, Roger teve várias governantas, pois serviam-no durante pouco tempo. A exceção é a última, que se encontra ao seu serviço há aproximadamente cinco anos, tendo-se criado entre ambos um clima que poderia redundar numa relação amorosa e quiçá em matrimónio, não fosse a chegada súbita de uma cunhada viúva de Roger Ackroyd, juntamente com o seu filho, diretamente do Canadá, que termina com as veleidades da governanta.
Na véspera, o narrador vira Mrs. Ferrars a caminhar com Rudolph, quando o padrasto, segundo o Dr. Sheppard, o julgava em Londres. A finalizar o capítulo, Roger Ackroyd convida o médico para jantar essa noite em sua casa, pois tem algo para lhe contar.
Capítulo III: O cultivador de abóboras
Na realidade, Rudolph tinha chegado na véspera a King's Abbot e instalado no hotel Três Javalis. Entretanto, tinha-se encontrado com a prima (na verdade, não existe qualquer grau de parentesco entre ambos, pois Rudolph não era filho de Roger Ackroyd, portanto não era da família), Flora Ackroyd, sua noiva secreta.
Um forasteiro tinha arrendado a villa dos Lariços, a casa pegada à do Dr. Sheppard. Nessa tarde, o médico quase é atingido por uma abóbora lançada precisamente do jardim do lado. Esse forasteiro conhece Roger Ackroyd e sabe que o enteado deste está noivo da sobrinha do industrial, que tem conhecimento do facto e aprova a relação e o casamento. Aliás, o homem até terá feito pressão para que o matrimónio se concretize. Uma nota dissonante chega-nos pela boca do próprio Randolph: os seus negócios não correm bem e ele enfrenta dificuldades financeiras.
Capítulo IV: A villa Farnley
O Dr. Sheppard vai jantar à villa Fernley, a residência de Roger Ackroyd. Pelo meio, encontra Flora Ackroyd, que anuncia para breve o seu casamento com Rudolph. Pouco depois, faz a sua aparição Mrs. Ackroyd, que é retratada como uma mulher antipática de olhos azuis duros e olhar frio e calculista. Segue-se a entrada de Roger Ackroyd e do seu amigo, o major Blunt, um notável viajante e caçador, alguns anos mais velho do que o dono da casa e de temperamento oposto.
O jantar não é agradável, pois o anfitrião está preocupado e abatido e quase não come. Pouco depois, fica a sós com o médico, usando dores estomacais como desculpa para fazer sair o criado. O diálogo que ambos travam esclarece o motivo do convite para jantar. Roger Ackroyd declara que Mrs. Ferrars lhe confessou no dia anterior ter envenenado o próprio marido. No entanto, havia alguém que conhecia esse segredo e que a chantageou por isso, mas a mulher não revelou a sua identidade. Ao ver o impacto que a revelação teve em Roger, a mulher pediu-lhe que não fizesse nada, não contactasse as autoridades durante vinte e quatro horas. O anfitrião acrescenta que, após o falecimento do marido da defunta, foi despertando uma relação afetiva entre ambos, que levou Roger a pedi-la em casamento havia três meses, tendo ela recusado. Passado algum tempo, reiterou o pedido e, desta vez, foi aceite, porém os dois mantiveram segredo do facto.
Seguidamente, o criado Parker entra na sala com o correio da tarde. No meio dos vários papéis, Roger avista um sobrescrito azul que o deixa petrificado, pois reconhece nele a letra de Mrs. Ferrars. O industrial abre-o e começa a ler a carta, onde a defunta promete revelar o nome da pessoa que a tem chantageado, contudo para a meio a leitura, afirmando que pretende ler o resto quando estiver sozinho, por isso repõe a missiva no sobescrito para concluir a leitura mais tarde. O médico ainda insiste que leia o que falta, mas Roger, bastante teimoso, não o faz. Pelas 21 horas, o Dr. Sheppard abandona a residência, apercebendo-se que Parker tinha estado a escutar a conversa entre ambos. À saía cruza-se com um desconhecido que procura o dono da casa.
Às 22 horas e 15 minutos, quando se prepara para dormir, o Dr. Sheppard recebe um telefonema de Parker a anunciar que Roger Ackroyd acaba de ser assassinado.
Capítulo V: O crime
O Dr. Sheppard desloca-se, de imediato, para a residência de Roger Ackroyd e é recebido por Parker, o criado, que, espantado, lhe diz que não foi ele quem telefonou ao médico e que tudo não deve passar de uma brincadeira, pois o patrão ainda está no escritório, portanto vivo. Os dois homens dirigem-se, então, para os aposentos do industrial, batem à porta repetidamente, porém não obtêm resposta. Tentam abri-la, todavia não conseguem, por isso espreitam pelo buraco da fechadura e verificam que aquela se encontra fechada por dentro. Arrombam-na e descobrem Roger Ackroyd sentado numa poltrona perto da chaminé, com punhal cravado nas costas. Ao observar o quarto, o médico constata que nada está remexido ou fora do lugar. A única coisa que, segundo o criado, falta é o sobescrito azul que continha a carta escrita por Mrs. Ferrars. Além disso, nada de valor foi levado, portanto não se tratou de um roubo. O criado revela que o secretário, Raymond, ouvir Roger a falar com alguém por volta das 21 horas e 30 minutos. A conversa versava dinheiro, nomeadamente pedidos de dinheiro feitos ao falecido, que declarara nessa conversa com pessoas desconhecida que não poderia continuar a satisfazer esses pedidos. Fica-se também a saber pelo mordomo que, nessa noite, ninguém entrou pela porta principal da villa, pelo que terá sido o próprio Roger a dar entrada ao assassino em sua casa. Parker acrescenta que Miss Flora, a sobrinha, viu o tio depois das nove e meia, isto é, após a conversa com o desconhecido. O inspetor interroga Flora, que confirma que foi a última pessoa a ver o tio, mas nada mais de significativo acrescenta sobre o caso.
Capítulo VI: O punhal
O inspetor questiona o médico a propósito da extorsão e este narra-lhe tudo o que sabe, incluindo a questão da carta.
Ao examinar o corpo, o Dr. Sheppard conclui que o punhal foi manobrado com a mão direita do assassino, que estava situado atrás de Roger Ackroyd, tendo a morte sido instantânea. Por outro lado, a expressão da vítima mostra surpresa. O inspetor aponta as suas baterias para Parker enquanto suspeito do crime. No cabo do punhal, são visíveis impressões digitais, desconhecendo-se a quem pertencem. O objeto tinha sido oferecido à vítima pelo major Blunt, que o trouxe de Marrocos, e estava guardado numa mesinha, concretamente aquela que o médico tinha ouvido abrir e fechar quando estivera previamente na residência. Depois de interrogarem a criadagem, recolhem as impressões digitais de Parker, do Dr. Sheppard e do major Blunt.
De regresso a casa, o médico confidencia à irmã que a polícia considera Parker o suspeito número um do crime, mas Caroline considera que se trata de um disparate.
Capítulo VII: A profissão do meu vizinho
Na manhã seguinte, Flora pede ao Dr. Sheppard que a acompanhe à villa dos Lariços para pedir ao seu ocupante, Hercule Poirot, um detetive reformado há cerca de um ano, que investigue a morte do tio. A jovem justifica o pedido, alegando que o médico esteve na cena do crime, observou o tio, portanto conhece todos os pormenores acerca do assassinato. Por outro lado, tem conhecimento de que, nessa manhã, chegou à localidade o inspetor Raglan, de Crunchester, que suspeita que o assassino seja Rudolph, o filho adotivo de Roger, tendo-se já deslocado até o hotel onde se havia hospedado, no entanto o hóspede tinha desaparecido sem deixar rasto.
Flora e o Dr. Shappard deslocam-se, pois, até à villa dos Lariços. Poirot, inicialmente, aconselha-a a confiar na polícia, porém acaba por aceitar a empreitada: investigar o caso. De seguida, o detetive e o médico deslocam-se até o posto da polícia local, onde são recebidos pelo inspetor Davis, pelo intendente - o coronel Melrose - e o inspetor Raglan. À exceção de Davis, os demais polícias recebem mal Poirot, por causa da inveja indisfarçável da fama que possui enquanto investigador com sucesso de diversos casos criminais. No entanto, a disposição muda um pouco após Poirot assegurar que todo o sucesso que resultar da sua investigação será creditado à polícia. Os agentes policiais contam então que as impressões digitais recolhidos não correspondem a nenhuma das pessoas testadas. De seguidas, deslocam-se até casa de Roger Ackroyd para verificar as pegadas detetadas na área exterior da casa e as comparar com dois pares de sapatos pertencentes a Rudolph. Por sua vez, Poirot analisa o gabinete onde foi cometido o crime e conclui que o morto deixou entrar o seu assassino pela janela do compartimento, pelo que seria alguém seu conhecido.
Entretanto, fica a saber-se que o telefonema que o Dr. Sheppard recebeu na noite anterior a anunciar o crime foi feito às 22 e 15 da estação de King's Abbot, tendo o comboio direto para Liverpool partido às 22 e 23.
Capítulo VIII: O inspetor Ragglan sabe o que faz
A polícia quer saber se alguém visitou Roger Ackroyd e Parker informa que, na quarta-feira, tinha vindo alguém representante de uma empresa de ditafones, pois a vítima queria adquirir um aparelho.
Entretanto, chega Mr. Hammond, um advogado. Raglan considera que foi Rudolph quem cometeu o crime, visto que as pegadas encontradas em volta da casa correspondem às salas dos seus sapatos de borracha, embora também sejam visíveis marcas de sapatos femininos. Além disso, a porteira, Mary Black, afirma ter visto passar Rudolph, quinze minutos depois, terá ouvido alguém no escritório a pedir dinheiro a Roger Ackroyd, que nega o pedido. De seguida, terá saído pela janela, entrado pela janela aberta da sala às 21 e 5, apoderado do punhal que estava na mesinha da sala, voltado ao escritório e cometido o crime. Depois, terá trepado o peitoril e fugido. No regresso ao hotel, terá ido pela estação de caminho de ferro e feito o famoso telefonema a anunciar o crime.
Quanto às outras personagens, à hora do crime, o major Blunt estava na sala de bilhar com Mr. Raymond; Mrs. Ackroyd, às 21 e 45, assistia à partida de bilhar e, dez minutos depois, foi dormir; Flora Ackroyd subiu do escritório do tio diretamente para o quarto; Parker foi para a despensa às 21 e 47, o que é confirmado pela governanta, Mrs. Russel, a governanta, que, por sua vez, falou com a criada Elsa Dale às 21 e 45, a qual se encontrava no andar superior, onde foi vista pela primeira e Flora; a criada Ursula Bourne ficou no seu quarto até às 21 e 5 e depois encaminhou-se para as dependências de serviços; Emma Cooper, a cozinheira, esteve sempre nas dependências de serviços, tal como outra criada, Mary Tripp. A cozinheira está ao serviço de Roger Ackroyd há seis anos, a primeira criada há dezoito meses, Parker há pouco mais de um ano e os demais há pouco tempo.
Poirot e o Dr. Sheppard caminham pelo local. O detetive mostra ao companheiro um pedaço de tecido e, pouco depois, apanha do chão um tubo de uma pena de pato.
Capítulo IX: O lado dos peixes dourados
Poirot e o médico passeiam pela propriedade de Roger Ackroyd. Em determinado ponto da passeata, avistam uma jovem alegre e bem-disposta: Flora. Pouco depois, surge o major Blunt e os dois conversam: a rapariga fala com ele de forma zombeteira, mas, quando o ex-militar lhe anuncia que tenciona regressar em breve a África, perde o ar feliz e trocista. Gera-se um silêncio entre ambos e, para o quebrar, Flora manifesta a sua preocupação pelo facto de o suspeito principal do assassinato do tio ser o seu noivo e ter desaparecido. O major procura tranquilizá-la, dizendo-lhe que tal suposição é absurda. De seguida, a jovem informa-o que de Roger lhe deixou vinte mil libras de herança, o que lhe garantirá a liberdade de que nunca dispôs até ao presente e a desobriga da necessidade de um casamento forçado e por interesse, acrescenta Blunt. Subitamente, este corta o fio da conversa, porque lhe parece ter avistado algo no fundo do lago de que estão próximos. De imediato, Poirot sai do seu esconderijo e dirige-se ao par, questionando o major sobre a última vez que esteve com Roger Ackroyd. Blunt responde que o último encontro entre ambos ocorreu ao jantar, mas acrescenta que o ouviu a falar mais tarde com alguém enquanto passeava no exterior e que, pouco depois, viu passar entre os arbustos um vulto branco. Acrescenta ainda que é possível que a pessoa com quem a vítima conversava era Raymond, pois tinha-os ouvido combinar um encontro por causa de uns papéis, mas clarifica que ouviu apenas a voz de Roger. De seguida, o detetive pergunta a Flora se, no dia anterior, tinha visto o punhal dentro da mesinha onde era habitual estar guardado e ela responde negativamente. Então, Poirot enfia a mão dentro do lado para apanhar o objeto que o major vislumbrara, mas, quando retira a mão, esta vem vazia. De seguida, Flora convida-os para almoçarem na villa.
Quando o detetive e o médico ficam sós, o detetive belga mostra-lhe uma aliança de mulher com a seguinte inscrição no seu interior: R - 13 de março. Sorrateiramente, quando retirara a mão da água, tinha trocado o objeto para o outro, de modo que Flora e o major não se apercebessem de que tinha encontrado algo.
Capítulo X: A criada
No vestíbulo, encontram Mrs. Acroyd e Mr. Hammond, o seu advogado. A cunhada do falecido afirma que não se tratou de um crime, mas, sim, de um mero acidente, pois Roger Ackroyd era bastante desastrado com os objetos, portanto, ao manejar o punhal, deverá ter-lhe escorregado da mão e cravado no corpo. O advogado pronuncia-se sobre Rudolph, dizendo que era um dissipador de dinheiro e que o pedia constantemente ao padrinho, Roger. Interrogado por Poirot acerca de como obteve essas informações, o advogado responde que foi Mrs. Ackroyd quem o informou acidentalmente. O detetiva questiona-o também acerca das disposições do testamento: Roger deixou mil libras para a governanta, 50 para a cozinheira, 500 para Raymond e vários donativos a hospitais. Além disso, Mrs. Ackroyd ficará com o ususfruto de dez mil libras em ações enquanto for viva; Flora receberá a quantia de 25 mil libras e o remanescente, incluindo a propriedade e as ações da firma Ackroyd & Filho, será para o filho adotivo e sobrinho, Rudolph Paton.
Novamente a sós, Poirot faz um estranho pedido ao Dr. Sheppard: o médico deverá perguntar-lhe, quando estiverem de novo juntos, se o major Blunt se encontrava em King's Abbot quando o marido de Mrs. Ferrars faleceu, e observar a reação do homem nesse instante. Quando questionado, o major responde que tinha ido visitar a mulher na terça-feira anterior e que a considerara fascinante, bela, mas misteriosa, sendo muito difícil adivinhar o que ela estaria a pensar. Acrescenta que conhecia os Ferrars desde o tempo em que o casal se instalara naquele local, coincidente com a época em que ele, Blunt, estivera ali pela última vez. O major, falando sobre si, afirma que perdera bastante dinheiro obtido por meio de herança na bolsa, todavia possui ainda o suficiente para viver desafogadamente. Por sua vez, Mrs. Ackroyd manifesta o seu descontentamento pelo facto de o cunhado ter deixado 25 mil libras a Flora em vez de a si.
Continuando-se a falar em dinheiro, a propósito do pagamento das despesas da casa, Raymond confirma que Roger tinha levantado, na manhã do dia anterior, 100 libras para pagar salários e outros encargos financeiros. De imediato, encaminham-se todos para o escritório para verificar se o dinheiro se encontra aí. Quando abrem a bolsa onde o defunto tinha guardado a quantia, constatam que faltam quarenta libras. Poirot questiona se o pessoal da casa é de confiança e asseveram-lhe que sim. No entanto, dá-se o caso de uma criada, Elsa Dale, se ter despedido no dia anterior. A governanta, quando questionada, afirma nada saber sobre esse assunto, acrescentando que se devem estar a referir a Ursula Bourne, que foi despedida por ter mexido e desarrumado uns papéis de Roger Ackroyd. A própria criada confirma o seu despedimento por ter alterado a ordem dos papéis que o patrão tinha sobre a secretária quando efetuou a limpeza do local. Inquirida sobre se esteve no local onde foi guardado o dinheiro, mostra-se perturbada, embora afirme que não sabe nada sobre a pecúnia. Acerca do despedimento, declara que ocorreu na tarde do dia anterior e que demorou entre vinte minutos a meia hora. De seguida, vão falar com Elsa Dale, uma rapariga loura, algo apatetada, que se mostra aflita quando lhe mencionam o desaparecimento do dinheiro.
Mais tarde, Poirot pergunta ao clínico o que pensa de Ursula Bourne e acrescenta que lhe parece estar na presença de uma criada demasiadamente bem educada, que fala corretamente inglês e aparenta uma elegância e um aspeto físico assinaláveis, o que significa que a considera alguém que deveria possuir uma posição bem distinta de uma mera criada. Poirot acrescenta que Ursula é a única criada cujo alibi não foi confirmado.
O detetive convida o médico a visitar Marby, no dia seguinte, domingo, e falar com Ada Folliot acerca de Ursula, pois esta teria trabalhado anteriormente na sua casa.
Capítulo XI: Uma visita de Poirot
Cumprindo o pedido de Poirot, o médico fala com a Sr.ª Folliot, mas estas mostra-se hostil e reticente em responder às perguntas que aquele lhe dirige, por isso nada de relevante se fica a saber sobre a criada Ursula.
De regresso a casa, fica a saber pela irmã que Poirot esteve em sua casa e lhe falou de um príncipe da Mauritânia que casara com uma bailarina, que supostamente estaria a fugir de assassinos bolcheviques. Além disso, trocaram impressões sobre o assassinato de Roger Ackroyd, tendo-a o detetive questionado a propósito de doentes do irmão. Ela enumera os que o consultaram no dia do crime e, dentre a lista, focam-se sobretudo em Mrs. Russel, na qual o protagonista vislumbra algo equívoco.
Capítulo XII: Uma reunião íntima
Na segunda-feira seguinte, realizou-se o inquérito público. O inspetor Raglan continua a suspeitar de Rudolph, que parece ter parece ter-se evaporado da face da Terra, pois ninguém o consegue encontrar sem sítio nenhum. No que diz respeito às impressões digitais presentes no punhal, o detetive belga desvaloriza-as, dizendo que até podem pertencer ao próprio Roger, ou seja, é possível que o assassino, consumado o crime, tenha limpado o cabo da arma e, de seguida, impresso os dedos da vítima no mesmo. Para sustentar a sua ideia, acrescenta que essas mesmas impressões mostram que quem empunhou a adaga o fez como quem pega num talher e não como quem pretende cravá-lo nas costas de alguém.
Pouco depois, reunem-se na alsa de jantar da villa Fernley Poirot, Mrs. Ackroyd, Flora, o major Blunt, Raymond e o Dr. Sheppard. O detetive solicita aos presentes que lhe indiquem onde se encontra o capitão Paton, mas recebe como resposta apenas silêncio. Flora diz que, no dia seguinte, anunciará publicamente o seu casamento. O capítulo termina com a acusação de Poirot de que todos lhe estão a esconder algo.
Capítulo XIII: A pena de pato
Nessa noite, após o jantar, o médico desloca-se à residência do detetive, correspondendo ao seu convite, e os dois conservam sobre a misteriosa personagem que o Dr. Sheppard vira na noite do crime. Poirot informa-o de que esse homem pediu informações sobre o caminho a seguir para a villa Fernley a uma criada, Mrs. Ganett, o que significa que desconhecia a área e, por outro lado, não procurava ocultar a sua figura nem a sua visita. Acrescenta que o indivíduo esteve hospedado no hotel Três Javalis, que possuía sotaque norte-americano e que afirmava ter chegado dos Estados Unidos.
Poirot puxa da pena de pato e, subitamente, o médico recorda que os cocainómanosse serviam usualmente de uma pena de pato para cheirarem cocaína, algo comum nos EUA e no Canadá. Outra questão prende-se com a pessoa com quem o desconhecido se terá vindo encontrar. Convém não esquecer que Mrs. Ackroyd e Flora vieram precisamente do Canadá antes de se instalarem em King's Abbot. Além disso, há o pormenor do tempo referente ao despedimento da criada: meia hora é um período excesso para proceder a uma dispensa. Por outro lado, Poirot considera que a razão apontada para o despedimento - a arrunação de uns papéis importantes - é pouco verosímil. Relativamente à pessoa que estaria a extorquir Mrs. Ferrars, é possível tratar-se de Rudolph, já que, de acordo com o advogado Hammond, havia algum tempo que não recorria aos pedidos de dinheiro a Roger Ackroyd, o que indicia que teria outra fonte de angariação monetária. No entanto, Poirot não acredita na sua culpabilidade.
Capítulo XIV: Mrs. Ackroyd
Mrs. Ackroyd solicita a presença do Dr. Sheppard a pretexto de se encontrar doente, na sequência da conversa do dia anterior com o investigador belga. A velha senhora conta que, na sexta-feira, à tarde, fora ao escritório de Roger e dera por si a procurar o testamento do dono da casa, mas acabara surpreendida pela criada Ursula Bourne. Pouco depois, aparecera Roger e ela abandonara o espaço, deixando patrão e empregada a sós, Na sequência, Mrs.Ackroyd comenta com o clínico que a criada possui algo que a distingue das demais (por exemplo, é muito instruída), e confessa que foi ela quem deixou a mesinha da sala aberta,que abrira para retirar uma peça de prata que pretendia levar a um leilão em Londres. Porém, ao aperceber-sedo ruído de passos no terraço, precipitou-se a sair dali, deixando o móvel aberto. Em suma, estas confissão da mulher comprovam que o estratagema de Poirot (acusar várias personagens de estar a ocultar algo) começa a resultar.
Capítulo XV: Godofred Raymond
Raymond procura Poirot para lhe confessar que possuía dívidas, por isso a herança de 500 libras recebida de Roger o tinha tirado de apertos financeiros.
O detetive revela desconfiar que o extorsionista seja Parker, mas foi ele quem assassinou Ackroyd, porém provavelmente será o responsável pelo desaparecimento da carta de Mrs. Ferrars.
De seguida, desloca-se até à villa Fernley, para falar com Flora e, a seu pedido, recriam uma cena ocorrida na noite do crime e que envolvia Parker e a jovem.
Capítulo XVI: Uma partida em família
Nessa noite, um casal amigo junta-se ao Dr. Sheppard e a Caroline para jogarem Mah Jong. Inevitavelmente, enquanto jogam, conversam sobre o assassinato de Roger Ackroyd, trocando diversas informações: a criada da villa Fernly que foi despedida chora muito à noite; os talentos de Poirot; o local onde poderá estar Rudolph (talvez em Cranchester, de onde viram regressar o detetive de automóvel).
Capítulo XVII: Parker
No dia seguinte, têm lugar as exéquias de Mrs. Ferrars e Mr. Ackroyd. Enquanto isso, Poirot confessa ao Dr. Sheppard que tem de interrogar e infundir terror em Parker.
Já na villa dos Lariços, o detetive diz-lhe que é uma extorsionista, pois a última pessoa para quem tinha trabalhado, o major Ellerby, havia estado envolvido no assassinato de um homem nas Bermudas. O criado estava ao corrente do envolvimento do seu patrão, que se vira forçado a pagar o seu silêncio. Parker confirma as palavras de Poirot, mas jura nada ter a ver com o assassinato de Roger Ackroyd. De seguida, explica que, quando o defunto se reunira com o Dr. Sheppard, lhe chegara aos ouvidos a palavra «extorsão», por isso tinha escutado à porta do escritório na esperança de ficara saber algo que lhe rendesse proveitos em termos financeiros, isto é, que lhe permitisse extorquir alguém, provavelmente o próprio patrão atual.
A seguir, vão visitar o advogado Hammond, que revela que Mrs. Ferrars gastou, no último ano, 20 000 libras, sendo que a herança que o major Blunt proclama ter recebido equivale sensivelmente a essa quantia, o que o torna suspeito de chantagear a velha senhora.
Poirot explica, então, a sua teoria: um homem comum, sem ideias criminosas, mas com algum defeito moral, vê-se certo dia em dificuldades económicas. Nesse ponto, fica a conhecer o segredo de alguém e acaba por, necessitado de dinheiro, chantagear essa pessoa. A passagem do tempo faz crescer a avidez por pecúnia e, inebriado, quer mais e mais, até ultrapassar os limites. Receando o escândalo de se ficar a saber do seu crime, caso a vítima se canse de ser explorada e ameace expô-lo publicamente, mata-a. O telefone toca em casa do Dr. Sheppard: a polícia prendeu um indivíduo em Liverpool, chamado Charles Kent,que se crê ser o desconhecido que foi avistado em Fernly na sexta-feita à noite, e quer o médico na cidade para o identificar.
Capítulo XVIII: Charles Kent
Meia hora depois, Poirot, o inspetor Raglan e o Dr. Sheppard apanham o comboio para Liverpool. De acordo com o inspetor, o indivíduo é um cadastrado e consumidor de estupefacientes. Além disso, confirma que o detetive está certo relativamente às impressões digitais encontradas no punhal: efetivamente, pertencem a Roger Ackroyd.
Charles Kent tem cerca de 22 ou 23 anos. O médico, ao escutar a sua voz, confirma que se trata da pessoa que efetivamente encontrou perto do portão da villa Fernly.O detetive confronta-o com a pena de pato encontrada no quiosque do jardim, que lhe pertencia e que ele perdeu no dia em que se deslocou até à propriedade. O rapaz indaga sobre o motivo da sua prisão e, ao ser esclarecido, afirma-se inocente, pois à hora en que se deu o crime, entre as 21 e 45 e as 22 horas, encontrava-se na taverna Coroa Larga,que dista cerca de dois quilómetros de Fernly.Questionado sobre a razão da sua presença na villa, responde que se foi encontrar com alguém, mas não o identifica.
Capítulo XIX: Flora Ackroyd
Na manhã seguinte, o inspetor Raglan encontra o D. Sheppard quando este regressa das suas consultas e informa-o de que o alibi de Charles Kent foi confirmado por uma criada da Coroa Larga, chamada Salvina Jones,que estabelece que eram precisamente 21 horas e 45 minutos quando o suspeito entrou na taberna, acrescentando que estava bem provido de dinheiro.
O ponto de paragem seguinte é a villa dos Lariços, onde Poirot toma conhecimento das novidades. A encenação promovida pelo detetive teve como finalidade provar que Parker viu Flora no exterior do escritório do tio. De facto, ele viu-a com a mão na maçaneta da porta e não no interior do cómodo. Provavelmente, a rapariga não estava a sair de dentro do escritório, mas da escada, proveniente do quarto do tio, ao qual se terá deslocado para lhe roubar dinheiro que nele houvesse, em virtude das dificuldades que passava, juntamente com a mãe. Assim, em desespero, terá entrado no quarto de Mr. Ackroyd, descido as escadas e, surpreendida pelo tilintar de copos no vestíbulo (era Parker dirigindo-se ao escritório), precipita-se para a sua porta, agarra a maçaneta e finge que vem a sair do compartimento, exatamente no momento em que o criado surge na soleira do corredor. De seguida, diz o que lhe ocorre à cabeça e sobe para o seu quarto. Posteriormente, quando toma conhecimento de que houve um furto e que a polícia chegou para investigar, Flora conclui que o descobriram o seu roubo e decide sustentar a história que engendrou para proteger o seu crime.
De seguida, na villa Fernly, entrevistam a jovem, na sala de bilhar. Ela está acompanhada do major Blunt e o inspetor Raglan narra-lhe as deduções de Poirot: Flora não entrou no escritório do tio, pelo que não pode ter visto o tio para lhe desejar boa noite. Quando ouviu Parker a atravessar o vestíbulo, encontrava-se na escada que conduzia ao quarto do tio.
Flora, confrontada desta forma, confirma o seu furto e mostra-se aliviada por ter sido descoberta. O major intervém, dizendo que o dinheiro em questão lhe tinha sido dado por Roger para deterninado fim e que a rapariga nunca lhe mexeu, tendo inventado aquela mentira para proteger o namorado, o capitão Paton. Na verdade, o major está apenas a tentar defender Flora por amor. Poirot diz-lhe que sabe que ele está apaixonado pela jovem e que lhe deve manifestar os seus sentimentos, pois ela não está enamorada de Rudolph Paton, tendo-o aceitado unicamente para agradar ao tio e para, através do casamentio, abandonar uma situação insustentável.
Capítulo XX: Mrs. Russel
Poirot marca um encontro com Mrs. Russel no consultório do Dr. Sheppard. Num breve diálogo que trava com o médico, observa que esteve atento à sua fisionomia aquando da revelação da autoria do furto, acrescentando que notou que Sheppard não ficou surpreendido com a novidade, ao contrário do inspetor. De seguida, dá nota da publicação, no dia seguinte, de uma notícia que rezaria o seguinte: "Há dias que a polícia procura o capitão Paton, residente na villa Fernly, em King's Abbot, sobrinho de Mr. Ackroyd, morto, como se sabe, na sexta-feira,em trágicas circunstâncias. O capitão foi visto em Liverpool, onde estava para embarcar com destino à América.". O detetive não clarifica o que espera alcançar com a publicção de semelhante notícia falsa.
O detetive observa a paixão que o médico possui pela mecânica, quando a governanta chega. Poirot começapor a informar que prenderam Charles Kent em Liverpool, mas a mulher fica impassível perante a informação. O detetive acrescenta que Roger Ackroyd foi assassinado entre as 20 e 50, quando o Dr. Shppard o deixou, e as 21 e 45, o que causa nervosismo e palidez em Mrs. Russel. Declara ainda que Kent é o indivíduo que procuram, visto que esteve em Fernly na altura do assassinato e não apresenta qualquer justificação para a sua presença. A governanta, em pânico, declara que o rapaz se foi encontrar com ela no quiosque, onde lhe deixou previamente uma nota escrita a avisá-lo da hora do encontro: 21 e 10. No regresso do quiosque, encontrou o médico. Poirot, para maior surpresa da governanta, diz-lhe que ela é mãe de Charles Kent e a mulher confirma. Quando o deu à luz, era solteira, por isso deu-lhe o nome da província em que nasceu. Mrs. Russel acrescenta outros dados ao pronunciamento do detetive, nomeadamente que nunca lhe disse que era mãe dele e que o filho cresceu vicioso e mau, tendo-se entregado ao álcool e à toxicodependência, apesar de ter feito tudo o que pôde pelo rapaz, inclusivamente enviá-lo para o Canadá. Durante cerca de dois anos, não teve qualquer notícia de Charles, que, entretanto, descobriu onde a mãe se encontrava a trabalhar e escrever-lhe a pedir dinheiro. Posteriormente, a mulher deslocara-se a casa do Dr. Sheppard para saber se era possível fazer algo pelo filho, nomeadamente no que dizia respeito aos seus vícios. Mãe e filho encontram-se: ele tratou-a muito mal, tendo recorrido inclusive ao insulto, e levou todo o dinheiro que ela possuía. Por último, estabelece que a partida do rapaz terá ocorrido entre as 21 e 20 e as 21 e 25. Deste modo, o invidíduo que, pelas 21 e 30, foi ouvido a dialogar com Roger Ackroyd não poderia ser Charles Kent.
Capítulo XXI: A notícia do jornal
No dia seguinte, o jornal local publica a notícia inspirada por Poirot. Caroline observa que chegou alguém à residência do detetive. Por seu turno, este comunica ao Dr. Sheppard que, nessa noite, pelas 21 horas, terá lugar uma pequena reunião em sua casa, onde deseja que marquem presença o próprio médico, Mrs. Ackroyd, Flora, o major Blunt e Mr. Raymond.
Entretanto, fica a saber-se pela mãe que Flora Ackroyd estánoiva de Hector Blunt. Além disso, a velha senhora dá nota de que a polícia de Liverpool, quando contactada por Raymond, desmentiu a prisão de Rudolph.
Ursula Bourne desloca-se a casa do médico para falar com Poirot. Quando entram na sala onde ela os espera, o detetive diz que estão na presença de Ursula Paton, a legítima esposa de Rudolph Paton.
Capítulo XXII: As vicissitudes de Ursula
Ursula era uma das muitas filhas de uma família nobre irlandesa arruinada de nome Folliot que, após o falecimento do pai, teve de encontrar uma forma de subsistência, empregando-se como criada, dando como referência o nome da irmã. Nesse interém, conheceu Rudolph, com quem casou secretamente, porque ele lhe dissera que o seu padrinho era contrário a que desposasse uma mulher pobre. O rapaz prometeu-lhe pagar todas as suas dívidas e, quando fosse independente de Roger Ackroyd, assumir publicamente o casamento entre ambos. Para que tal fosse possível, confiava que o industrial lhe acudisse e saldasse as suas dívidas, porém, quando tomou conhecimento da quantia avultasda que o afilhado devia, ficou tão furioso que lhe recusou qualquer auxílio financeiro. Passados alguns meses, chamou-o a Fernly e propos-lhe que desposasse Flora Ackroyd. Os futuros noivos concordam com a proposta e combinam manter o noivado secreto, todavia Mr. Ackroyd resolve torná-lo público, mas comunica a sua intenção somente a Flora, que se mostra indiferente perante tal resolução. Já Ursula ficou absolutamente estupefacta e chamou Rudolph da cidade. Os dois encontraram-se no bosque e o rapaz pediu à esposa que mantivesse secreto o casamento de ambos por mais algum tempo, mas a esposa procura Roger Ackroyd e conta-lhe a verdade. O homem fica furioso com os dois,considerando que Ursula está a dar o golpe do baú, procurando desposar alguém com acesso a riqueza. Ambos trocam palavras violentas entre si e tudo termina com o despedimento dela. Ursula encontra-se novamente com o marido, porém o encontro é tumultuoso: Rudolph censura-a por ter ido falar com o padrinho e ela censura-o pela sua falta desinceridade. Meia hora depois de terminado o encontro, um pouco antes das 21 e 45, é descoberto o cadáver de Roger Ackroyd. Além disso, desde essa noite, a jovem não voltou a ter notícias do esposo.
Ursula decidiu fazer esta confissão depois de ter lido a notícia falsa publicada por Poirot, considerando que já nada tinha a perder; pelo contrário, talvez pudesse contribuir para a salvação do marido.
Capítulo XXIII: Uma reunião em casa de Poirot
O Dr. Sheppard tem vindo a fazer um registo do caso, dividido em 20 capítulos e culminando com a visita de Mrs. Russel, que forneceu a Poirot para este o ler.
A reunião inicia-se às 21 horas na casa de Poirot e nela marcam presença Mrs. Ackroyd, Flora Ackroyd, o major Blunt, Mr. Godofred Raymond, Mrs.Ursula Paton, John Parker e Elisabeth Russel, além do Dr. Sheppard. Poirot começa por revelar que Ursula e Rudolph são casados. Flora reage muito bem à notícia e as duas mulheres apoiam-se mutuamente.
De seguida, o detetive informa que, na noite do crime, tiveram lugar dois encontros perto do quiosque: entre Mrs. Russel e o filho e entre Rudolph e Ursula. Sabendo-se que os dois últimos são um casal, está encontrada a explicação para a aliança encontrada no local com os dizeres gravados: um R e uma data, a do casamento entre ambos. Este encontro foi motivado, como sabemos, por Ursula ter ficado a saber nesse mesmo dia do noivado entre o seu marido e Flora Ackroyd. Ora, assim sendo, o assassino não poderia ser o capitão Paton, pois às 21 e 30, quando se deu o crime, estava a falar com a esposa. Por outro lado, também não poderia ser Charles Kent, uma vez que já se havia afastado do local.
As palavras ouvidas a Roger Ackroyd pouco antes de ser assassinado são muito semelhantes às que usava por vezes em cartas ditadas, o que leba Poirot a deduzir que, efetivamente, o homem não estava a falar com ninguém, mas talvez a ler uma carta em voz alta. O detetive recorda que, na quarta-feira anterior, tinha estado na villa um representante da firma Ditaphone Company,o qual vendeu ao industrial um ditafone. Às 21 e 30, Roger ainda estava vivo, visto que falava ao dito aparelho, enquanto Rudolph e Ursula conversavam no exterior e Charles Kent já se encontrava bem distante do local.
O capítulo encerra com Poirot a fazer um gesto teatral, apontando para o umbral da porta, onde se encontra Rudolph Paton, de mão dada à esposa.
Capítulo XXIV: A narrativa de Rudolph Paton
Hercule Poirot recoda a sessão, semelhante àquela que fizera anteriormente, na qual acusara os cinco presentes de lhe ocultarem algo: quatro revelaram o seu segredo entretanto, mas o Dr. Sheppard não. O médico explica-se: naquele dia, fora visitar Rudolph, de quem se diz amigo, e este contara-lhe do seu casamento e da embrulhada em que se envolvera. Após a descoberta do crime, Paton tornara-se suspeito e o Dr. Sheppard escondera-o numa casa de saúde para alienados. O detetive, entretanto, através de Caroline, obteve o nome de dois sanatórios próximos de Cranchester para onde o irmão costumava enviar alguns pacientes. Num deles, no sábado de manhã, Poirot descobriu que o clínico tinha internado um doente sob um nome falso, porém rapidamente descobriu que se tratava de Rudolph, por isso trouxe-o para a villa dos Lariços no dia anterior. Está assim explicado quem era o indivíduo que Caroline dissera ter visto em casa de Poirot.
De seguida, o detetive declara que o assassino se encontra entre eles e que, para salvar Rudolph, terá de confessar o crime. Ora, quem é que estaria disposto a salvá-lo, incriminando-se? A esposa ou um amigo, dirá o leitor. De imediato, entra a criada com um cabograma para Poirot, proveniente de um transatlântico que se dirige para os Estados Unidos. Ele lê-o e diz que, a partir desse momento, tem a certeza de quem é o assassino. A seguir, dá por encerrada a reunião e anuncia que, no dia seguinte, comunicará a verdade ao inspetor Raglan.
Capítulo XXV: Toda a verdade
Terminado o encontro, saem todos, à exceção de Poirot e do Dr. Sheppard, que questiona o motivo pelo qual o detetive não expõe de imediato a verdade ao inspetor Raglan. Poirot expõe-lhe as suas deduções. Primeira: o telefonema feito para casa do clínico significa que o assassino pretendia que o crime fosse descoberto nessa mesma noite e não apenas no dia seguinte, ou seja, desejava que a descoberta ocorresse a uma hora em que o criminoso estivesse presente quando a porta do escritório fosse aberta. Segunda: a poltrona desencostada da parede relaciona-se com a mesinha com livros e revistos que se encontrava junto à janela do escritório, a qual ficava oculta pelo espaldar da cadeira. O detetive supõe que houvesse nela algo que o assassino desejava ocultar que não tinha podido levar consigo após o crime, mas que deveria desaparecer antes que alguém o encontrasse. Ora, antes da chegada da polícia só haviam entrado no gabinete de Roger Ackroyd o médico, Parker, o major Blunt e Raymond. O criado, com o seu olhar treinado, foi quem assinalou a deslocação da poltrona, pelo que foi eliminado como suspeito. Terceira: que objetos eria o que a mudança de lugar da poltroba pretendia ocultar? O ditafone, algo que não poderia ser transportado numa algibeira, por exemplo. As pessoas creem que a voz ouvida antes de ocorrer o crime era a de Roger Ackroyd a ditar para o gravador de voz, mas também poderia dar-se o caso de a máquina estar a fazer o oposto, ou seja, a reproduzir a voz do homem. Poirot coloca ainda outra hipótese: a adaptação de um instrumento de relojoaria ao ditafone, de maneira a pô-lo a funcionar após a saída do assassino. Quem tem interesse por mecanismos? Quarta: as marcas de sapatos no peitoril da janela. Alguém retirou do hotel Três Javalis um par de sapatos de Rudolph Paton. Quem o foi procurar à hospedaria?
Finalizando o seu discurso, Hercule Poirot recapitula os factos: o assassino é alguém que conhecia bem Roger Ackroyd; sabia que adquirira um ditafone; tinha certa prática com engenhos mecânicos; tirara o punhal da mesinha antes de Flora chegar; levara consigo uma maleta para transportar o ditafone; pôde permanecer sozinho uns minutos no gabinete, após a descoberta do crime, enquanto Parker telefonava à polícia. Quem poderia ser essa pessoa? O Dr. Sheppard.
Capítulo XXVI: ... E nada mais do que a verdade
O médico ri-se do detetive e chama-o louco, mas este não se detém. Para percorrer a distância entre a estarada e a villa gastavam-se no máximo cinco minutos. Ora, o Dr. James Sheppard partira da moradia às 20 e 50 e atingira o portão da estrada às 21 horas, ou seja, tinha gasto o dobro do tempo no trajeto. Nesses dez minutos, teve tempo de correr em volta da casa, mudar de sapatos, entrar no gabinete através da janela, matar Roger Ackroyd e sair pelo portão. Esta tese apresenta, no entanto, uma dificuldade: o industrial tê-lo-ia ouvido galgar o peitoril, por isso Poirot coloca outra hipótese, isto é, o médico cometeu o crime antes de sair do escritório, tirou da sua maleta de médico os sapatos de Rudolph, calçou-os, passou-os sobre a lama e reentrou no gabinete saltando pela janela, na qual deixou as marcas do calçado enlameado. A seguir, fechou a porta do cómodo pelo lado de dentro, saiu pela janela, deslocou-se até ao quiosque, descalçou os sapatos furtados, colocou os seus e saiu pelo portão. De seguida, foi para casa descansado, pois ajustara o ditafone para as 21 e 30. O detetive esclarece que já tinha feito a reconstituição da cena que acabara de narrar e demorara exatamente dez minutos.
O que teria o médico a ganhar com o crime? Impunidade, pois fora ele quem chantageara Mrs. Ferrars. De facto, o Dr. Sheppard tinha tratado do marido da senhora, pelo que era a única pessoa que poderia saber a verdade sobre a sua mpprte, daí ter começado a extorqui-la, porém, quando a extorsão se tornou asfixiante, Mrs. Ferrars resolveru contar a Mr. Ackroyd. Se este tomasse conhecimento dos factos, o médico ficaria arruinado para sempre.
Falta, porém, esclarecer ainda uma questão: o telefonema feito para casa do médico na noite do crime. Um dos seus pacientes era criado num transatlântico americano que estava fundeado em Liverpool na altura do assassinato. Ora, o Dr. Sheppard pedira-lhe que telefonasse da estação para sua casa. Foi isso que o cabograma recebido por Poirot confirmou. A ideia era genial: o médico recebia o telefonema na sua residência, na presença da irmã, mas, quanto ao conteúdo, só se teria a versão do clínico.
Finda a exposição, Hercule Poirot sugere ao Dr. Sheppard que finalize o seu manuscrito e, depois, recorra ao suicídio, caso não deseje ser preso.
Capítulo XXVII: Apologia
Cinco horas da manhã: o médico concluiu o manuscrito, que, no início, tencionava publicar como anarrativa de um desaire de Poirot.
Nele, o clínicp acrescenta alguns dados: quando viu Rudolph Paton e Mrs. Ferrars a conversar, receou que a viúva lhe tivesse confiado o seu segredo. Na noite do crime, Roger Ackroyd tinha contado ao Dr. Sheppard o que conhecia do caso referente a Mrs. Ferrars, isto é, da chantagem a que esta estava sujeita, ignorando ainda, no entantom a identidade do extorsionista. O ditafone tinha avariado e o médico induzira-o a confiar-lho para o compor. O médico adaptou-lhe um mecanismo que o fizesse funcionar às 21 e 30. A poltrona tinha sido deslocada para o ocultar por completo.
O Dr. Sheppard confia que Poirot conseguirá «compor as coisas» junto do inspetor Raglan, de modo a poupar a irmã, Caroline, à vergonha da verdade, de ter um irmão assassino.
Concluído o manuscrito, veronal.
domingo, 28 de julho de 2024
Análise da cena 3 do ato IV de Hamlet
Esta cena
volta a enfatizar uma diferença comportamental entre Cláudio e Hamlet: o
primeiro age rapidamente, aproveitando de imediato a oportunidade fornecida
pelo assassinato de Polónio para não só enviar o príncipe para Inglaterra, mas
também o executar; o segundo passou a peça toda a hesitar e a protelar a
concretização da vingança sobre o tio.
Por outro
lado, o leitor / espectador está plenamente consciente de que o assassinato
impulsivo de Polónio veio dificultar a vingança da morte do velho rei Hamlet, o
que é exclusivamente da responsabilidade do jovem príncipe. De facto, foi ele
quem matou Polónio de forma precipitada e impulsiva e, por outro lado, hesitou
constantemente se deveria ou não assassinar Cláudio. Curiosamente, quando
decide agir, fá-lo sem pensar e acaba por matar a pessoa errada.
Todos estes
acontecimentos colocam o monarca numa posição vantajosa. Por um lado, ninguém,
exceto Hamlet, suspeita que Cláudio tenha assassinado o anterior rei. Em
segundo lugar, ele é o rei da Dinamarca, por isso encontra-se numa posição
privilegiada e de grande poder. Em terceiro lugar, ao declarar que vai enviar o
sobrinho para Inglaterra porque está preocupado com o seu bem-estar, o que lhe
granjeia simpatia por se mostrar um homem atencioso, empático e preocupado com
a família. Na verdade, tudo não passa de uma construção astuta e dissimulada,
visto que se trata de mera encenação destinada a executar Hamlet. Porém, como
ninguém tem conhecimento dos seus planos maquiavélicos, a imagem de Cláudio é a
de um rei atencioso, afetuoso e benevolente, extremamente preocupado com o
sobrinho e que só quer o seu bem.
Apesar de
agir como um louco há algum tempo já, Hamlet continua a ser amado pela
população, o que indicia que é percecionado como uma pessoa íntegra e honrada.
Porém, para o leitor, essa imagem pode estar a mudar, visto que ele acabou de assassinar
uma pessoa sem culpa e não parece preocupado quer com o crime que acabara de
cometer, quer com o destino que deu ao corpo, troçando de tudo com jogos de
palavras.
Outra
curiosidade relativa à questão do corpo de Polónio prende-se com os comentários
feitos pelo príncipe. De facto, este declara que o cadáver está a ser comido,
ou seja, está a deteriorar-se e a ser consumido por vermes. Isto recorda-nos a
afirmação de Marcelo na cena do ato I: algo está podre no reino da Dinamarca.
Nesse instante, a personagem está a falar figurativa e metaforicamente, no
entanto, presentemente, a frase adquire literalidade: o corpo de Polónio está a
apodrecer em Elsinore.
Por último,
convém atentar num pormenor: Cláudio pede aos ingleses que executem eles mesmos
Hamlet. Ora, por um lado, isto mostra o quanto receia o sobrinho, por isso
necessita dele morto. Por outro lado, Hamlet era amado na Dinamarca, por isso
teria de morrer fora do território local. Em suma, todos estes dados
caracterizam Cláudio como um rei astuto, falso e extremamente ambicioso,
preocupado unicamente com o fortalecimento do seu próprio poder, eliminando as ameaças
ao seu poder e manipulando os que o rodeiam para daí retirar vantagens.
Resumo da cena 3 do ato IV de Hamlet
Cláudio está
ciente de que, embora represente uma ameaça para si e para os seus propósitos,
Hamlet é adorado pela população, pelo que o rei não poderá tomar qualquer ação
contra o príncipe que irrite o povo, daí que pretenda que o seu envio para
Inglaterra seja visto como um plano de longa data.
Rosencrantz
informa Cláudio que Hamlet não dirá onde está o corpo de Polónio, e o soberano
ordena-lhe que traga o príncipe à sua presença. Pouco depois, Rosencrantz e
Guildenstern surgem acompanhados de Hamlet. Pressionado pelo tio no sentido de
revelar a localização do corpo, o príncipe responde-lhe de forma enigmática e
desafiadora. Por exemplo, diz-lhe que o cadáver está a servir de jantar aos
vermes e, mais tarde, que o soberano poderia enviar um mensageiro para
encontrar Polónio no céu ou poderá procura-lo ele mesmo no inferno. Por fim,
Hamlet revela que o corpo se encontra debaixo das escadas, junto ao saguão do
castelo. De seguida, o rei diz-lhe que está preocupado com o seu bem-estar e,
por isso, vai enviá-lo para Inglaterra, algo com que Hamlet parece concordar
entusiasticamente. O príncipe sai e Cláudio instrui os seus assistentes a
assegurar-se de que Hamlet entra no navio nessa mesma noite.
Só, o
monarca da Dinamarca expressa a sua esperança de que o rei de Inglaterra
obedeça às ordens que ele enviou, numa carta selada, ou seja, que Hamlet seja
executado.
Análise da cena 2 do ato IV de Hamlet
Esta cena é,
tal como a anterior, curta e a ação célere, o que permite manter a atenção do
leitor / espectador, não criando momentos aborrecidos de arrastamento.
As máscaras
usadas pelas personagens começam a cair. Rosencrantz e Guildenstern fingiram
até aqui estar ao lado de Hamlet, porém agora deixam claro que estão
integralmente ao serviço de Cláudio, o que leva o príncipe a criticá-los por
isso. De facto, não custa compreender o sentir de Hamlet, ao constatar que os
seus antigos amigos, afinal, não o eram e o traíram, colaborando com o
assassino do seu pai em seu desfavor. Não custa igualmente imaginar a deceção
que sente ao tomar consciência do facto.
Resumo da cena 2 do ato IV de Hamlet
Quando
Hamlet acaba de se desfazer do corpo de Polónio, surgem Rosencrantz e Guildenstern,
que o questionam acerca do destino do cadáver, para que o possam transportar
para a capela. No entanto, o príncipe recusa dar-lhes uma resposta direta,
optando antes por os provocar e chega inclusive a acusá-los de serem espiões ao
serviço de Cláudio. Além disso, chama «esponja» a Rosencrantz, pois tanto este
como Guildenstern absorvem o favor do rei, acatando e executando as suas ordens
e deixando que ele os esprema até secar. Após nova recusa em esclarecer onde
esconder o corpo de Polónio, concorda em acompanhar os velhos amigos até à
presença de Cláudio, todavia desata a correr, desafiando-os a apanhá-lo.
Análise da cena 1 do ato IV de Hamlet
A cena
inicial do quarto ato é breve e foca-se numa espécie de traição que Gertrudes
comete relativamente ao seu filho, concretamente por ter contado a Cláudio o
encontro que tivera com Hamlet, quando lhe havia prometido não o fazer. A
rainha mostra-se, pois, desleal para com o filho, ao contar ao atual marido que
aquele assassinara Polónio, embora não lhe dê conta que o jovem príncipe estava
a fingir ser louco. O que significa esta atitude da rainha? Acredita que Hamlet
está efetivamente louco, ou, astutamente, reflete e reconhece que o seu
interesse reside em se aliar ao marido? Por outro lado, não nos podemos
esquecer que Gertrudes é a rainha da Dinamarca, o que implica um conjunto de
deveres. Assim sendo, tendo em conta que Polónio era um nobre conhecido e, até
certo ponto, respeitado, pelo que esconder a notícia da sua morte poderia ser
considerado um ato de traição relativamente aos seus deveres enquanto soberana.
Por seu turno,
Cláudio esforça-se por aparentar calma enquanto ouve o relato da esposa, mas
claramente reconhece que os últimos acontecimentos constituem a oportunidade perfeita
para exilar Hamlet para Inglaterra. Cláudio é um rei oportunista, ambicioso e
egoísta, preocupado apenas em conservar o seu poder a todo o cisto, evitando
tudo o que possa constituir uma ameaça a essa ambição. Afinal, ele não hesitou
em assassinar o próprio irmão para conquistar a coroa e o poder que lhe está
inerente. Deste modo, mais do que nunca, Hamlet deve ser enviado para
Inglaterra, não para o punir por ter assassinado Polónio, mas porque a sua
presença na Dinamarca representa um perigo para o próprio Cláudio.
O leitor /
espectador facilmente se apercebe que o rei se está a aproveitar da situação
para dar andamento aos seus planos sinistros relativamente ao sobrinho, mas
também apreende uma diferença comportamental entre ambos: Cláudio age
rapidamente, enquanto Hamlet é uma figura hesitante. No entanto, apesar de não
perder tempo em pôr em marcha o seu plano, o rei não descura o modo como o
concretizar, preocupando-se em controlar os danos. É por isso que, após a saída
do Rosencrantz e Guildenstern, sugere que ele e Gertrudes procurem os seus mais
próximos para lhes narrar o que aconteceu. De facto, no seu pensamento, ao
divulgar os acontecimentos segundo a sua visão e interesses, evitará que o
crime de Hamlet o manche a si e justificará a premência da partida do sobrinho.
O seu caráter fingido e dissimulado acentua-se quando não tem pejo em afirmar
que não mandou Hamlet embora mais cedo por razões sentimentais, procurando transmitir,
desta forma, a imagem de alguém atencioso e generoso. Dada disto, obviamente,
corresponde à verdade.
No que diz
respeito a Hamlet, o assassinato de Polónio constitui um momento de viragem no
seu percurso e na sua caracterização. De facto, antes de ter matado um homem
inocente, era possível olhá-lo com olhar benévolo, compreensivo e até
solidário, pois estávamos na presença de alguém profundamente marcado pela
morte do pai e pelo confronto e as exigências do seu fantasma. Contudo, após o
assassinato de Polónio, essa imagem é fortemente afetada. A sua natureza
sensível e reflexiva – os traços de caráter que interferem, fazendo-o hesitar,
na capacidade de se vingar de Cláudio – dá lugar a uma atitude exatamente
oposta, concretizada num ato precipitado e extremamente violento. É verdade que
Hamlet age dessa forma por estar convencido de que é Cláudio quem se encontra
atrás da cortina, porém, seja como for, o seu gesto põe em xeque a sua
superioridade moral sobre o tio. Ambas as personagens assassinaram outras
pessoas; a única diferença reside no facto de o crime do príncipe não ter sido
premeditado, ao contrário do do tio, que foi planeado e motivado pela ambição.
Todavia, as consequências dos dois atos são semelhantes: Laertes e Ofélia
perderam o seu pai, tal como tinha sucedido com Hamlet.
Por outro
lado, toda esta sucessão de acontecimentos suscita a abordagem de questões como
a violência e o assassinato. Inicialmente, esses aspetos foram abordados de
forma algo abstrata, visto que a única violência que teve lugar – o assassinato
do velho rei Hamlet – é anterior ao início da peça. Porém, no momento em que o
seu filho assassina Polónio, a violência estrema e o assassínio concretizam-se,
presentificam-se aos olhos do leitor / espectador. Por outro lado, não podemos
esquecer que a morte de Polónio decorre do assassinato de Hamlet pai, o que
permite concluir que a violência e o crime só geram mais violência e mais sangue.
Por último,
não se pode deixar de dar uma palavra ao comportamento de Rosencrantz e
Guildenstern. Os dois são amigos de Hamlet, porém não revelam qualquer prurido
em se voltar contra ele, o que mostra, no mínimo, falta de lealdade e de uma
amizade verdadeira e autêntica. Se tivermos em consideração, porém, que a sua
obediência é devida a Cláudio, o rei, independentemente das suas crenças e
afetos, é natural que tenham de fazer aquilo que o monarca lhes ordenar, mesmo
que tal signifique trair um amigo de longa data. Regra geral, o ser humano tem
sempre uma opção e é da sua responsabilidade fazer essa escolha.
Resumo da cena 1 do ato IV de Hamlet
Após o
diálogo com o filho, Gertrudes corre ao encontro de Cláudio. Encontra-o
acompanhado de Rosencrantz e Guildenstern e pede-lhe para falarem a sós. A
rainha narra, então, ao marido o encontro que acabara de ter com Hamlet,
detalhando a sua insanidade e o assassinato de Polónio. Horrorizado, Cláudio
observa que, se fosse ele a estar escondido atrás da tapeçaria, teria sido
morto pelo sobrinho, e conclui que este é um perigo para todos, pelo que
deverão enviá-lo, de imediato, para Inglaterra. Em simultâneo, terão de encontrar
uma explicação credível de explicar à corte e ao povo as ações de Hamlet.
De seguida,
convoca Guildenstern e Rosencrantz, conta-lhes acerca do assassinato de Polónio
e instrui-os a localizar Hamlet e levar o corpo do falecido para a capela.
Posteriormente, diz à esposa que é necessário revelar publicamente a verdade
sobre o jovem príncipe e encontrar uma forma de lidar com ele.
quinta-feira, 25 de julho de 2024
Decreto-Lei n.º 48-B/2024, de 25 de julho
O decreto que estabelece os princípios da recuperação do tempo de serviço docente.
Em 2018, a fraude que dá pelo nome de António Costa e que andou quase uma década a fazer de contas que era primeiro-ministro afirmou que nem daí a dez anos haveria condições para devolver o tempo que foi surripiado aos professores. Estamos em 2024, passaram, portanto, seis anos.
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