Esta cena
volta a enfatizar uma diferença comportamental entre Cláudio e Hamlet: o
primeiro age rapidamente, aproveitando de imediato a oportunidade fornecida
pelo assassinato de Polónio para não só enviar o príncipe para Inglaterra, mas
também o executar; o segundo passou a peça toda a hesitar e a protelar a
concretização da vingança sobre o tio.
Por outro
lado, o leitor / espectador está plenamente consciente de que o assassinato
impulsivo de Polónio veio dificultar a vingança da morte do velho rei Hamlet, o
que é exclusivamente da responsabilidade do jovem príncipe. De facto, foi ele
quem matou Polónio de forma precipitada e impulsiva e, por outro lado, hesitou
constantemente se deveria ou não assassinar Cláudio. Curiosamente, quando
decide agir, fá-lo sem pensar e acaba por matar a pessoa errada.
Todos estes
acontecimentos colocam o monarca numa posição vantajosa. Por um lado, ninguém,
exceto Hamlet, suspeita que Cláudio tenha assassinado o anterior rei. Em
segundo lugar, ele é o rei da Dinamarca, por isso encontra-se numa posição
privilegiada e de grande poder. Em terceiro lugar, ao declarar que vai enviar o
sobrinho para Inglaterra porque está preocupado com o seu bem-estar, o que lhe
granjeia simpatia por se mostrar um homem atencioso, empático e preocupado com
a família. Na verdade, tudo não passa de uma construção astuta e dissimulada,
visto que se trata de mera encenação destinada a executar Hamlet. Porém, como
ninguém tem conhecimento dos seus planos maquiavélicos, a imagem de Cláudio é a
de um rei atencioso, afetuoso e benevolente, extremamente preocupado com o
sobrinho e que só quer o seu bem.
Apesar de
agir como um louco há algum tempo já, Hamlet continua a ser amado pela
população, o que indicia que é percecionado como uma pessoa íntegra e honrada.
Porém, para o leitor, essa imagem pode estar a mudar, visto que ele acabou de assassinar
uma pessoa sem culpa e não parece preocupado quer com o crime que acabara de
cometer, quer com o destino que deu ao corpo, troçando de tudo com jogos de
palavras.
Outra
curiosidade relativa à questão do corpo de Polónio prende-se com os comentários
feitos pelo príncipe. De facto, este declara que o cadáver está a ser comido,
ou seja, está a deteriorar-se e a ser consumido por vermes. Isto recorda-nos a
afirmação de Marcelo na cena do ato I: algo está podre no reino da Dinamarca.
Nesse instante, a personagem está a falar figurativa e metaforicamente, no
entanto, presentemente, a frase adquire literalidade: o corpo de Polónio está a
apodrecer em Elsinore.
Por último,
convém atentar num pormenor: Cláudio pede aos ingleses que executem eles mesmos
Hamlet. Ora, por um lado, isto mostra o quanto receia o sobrinho, por isso
necessita dele morto. Por outro lado, Hamlet era amado na Dinamarca, por isso
teria de morrer fora do território local. Em suma, todos estes dados
caracterizam Cláudio como um rei astuto, falso e extremamente ambicioso,
preocupado unicamente com o fortalecimento do seu próprio poder, eliminando as ameaças
ao seu poder e manipulando os que o rodeiam para daí retirar vantagens.
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