Português: Análise da cantiga "Digades, filha, mha filha velida"

quinta-feira, 12 de outubro de 2017

Análise da cantiga "Digades, filha, mha filha velida"

· Assunto: diálogo entre mãe e filha, em que esta se desculpa da demora na fonte culpando os veados, mas a mãe descobre a mentira, pois os veados não vêm às fontes da aldeia.

         De facto, estamos na presença de uma situação em que a mãe pretende saber a razão por que a filha se demorou na fonte quando aí foi buscar água. Questionada, a donzela responde que a sua demora se ficou a dever ao facto de ter encontrado veados que turvaram a água, por isso teve de esperar. No entanto, a mãe, sábia e experiente, conclui que a sua filha mente, pois os veados não revolvem a água das fontes / do rio, e acusa-se de se ter demorado porque esteve com o namorado.


· Tema: a mentira amorosa.


· Estrutura interna

s 1.ª parte (estr. 1-2) - Interpelação da donzela pela mãe:
. razão da demora da donzela.

s 2.ª parte (estr. 3-4) - Resposta simbólica da donzela, para iludir a pergunta:
. os veados revolveram e turvaram a água;
. a donzela teve de esperar que a água ficasse clara.

s 3.ª parte (estr. 5-6) - Desconfiança e acusação de mentira:
. a mentira é detectada por dois motivos:
- o veado, como animal selvagem, não vem às fontes da aldeia;
- como animal ágil, o veado não turva a água.



· Caracterização da donzela

         Esta cantiga retrata uma donzela calculista e manhosa, que se desculpa pela demora na fonte, mentindo.
         a) Ingénua: muitas cantigas mostram o contraste entre donzelas ingénuas que vivem convencidas de que o amigo morre de amores por elas, e a experiência da mãe, que lhe atribui sempre segundas intenções.
         b) Martirizada.
         c) Indiferente.
         d) Vingativa.
         e) Narcisista.
         f) Jovem.
         g) Bela.
         h) Apaixonada.
         i) Pronta a mentir pelo amigo.


· Caracterização da mãe:
- severa;
- experiente;
- esperta / sábia;
- vigilante e atenta;
- protetora;
- controla a vida amorosa da filha;
- funciona como opositora ao romance da filha.


· Função / papel da mãe: ela encarna a figura da mãe protetora que vigia a filha, para a proteger, e dela desconfia, procurando, assim, evitar que tome opções erradas na vida.


· Natureza

         A natureza é um potencial de recantos convidativos ao encontro amoroso. Nas fontes, por exemplo, os namorados refrescavam o seu amor, ouvindo o suave murmúrio das águas que lhes despertavam o sonho de um futuro tranquilo.
         Nesta cantiga, a Natureza é o lugar onde os apaixonados se encontram (local de encontro amoroso). De facto, o cenário campestre, constituído por uma fonte e vegetação (de onde surgiu o cervo), é o local propício ao amor.


· Personagens

         . Donzela, que tardou na fonte.
         . Mãe, que a interroga sobre essa demora.
. A ausência do pai, que se encontra normalmente no fossado com o rei. A mãe é, assim, o único juiz das acções da filha enamorada.



· Recursos estilístico-poéticos

         1. Nível fónico

. Estrofes: cantiga constituída por 6 estrofes heterométricas (um dístico e um refrão monórrimo).
. Rima: - AAR / BBR;
- emparelhada;
- toante ("velida" / "fria") e consoante ("louçana" / "fontana");
pobre ("velida" / "fria") e rica ("fria" / "volviam");
grave ou feminina.
. Métrica: versos decassílabos + refrão pentassílabo.
. Ritmo binário.
. Refrão: era uma espécie de coro que se cantava no fim de cada estrofe. Por vezes, eram mulheres que acompanhavam o jogral cantando e dançando. O facto de estar entre parêntesis pode interpretar-se como aparte dito pela donzela, que se recusa a dizer a verdade à mãe. Enquanto aparte, não é pronunciado em voz alta, antes representa o pensamento da donzela e traduz a verdadeira razão do seu atraso: está apaixonada e esteve com o amigo. Assim, a ausência do parêntesis na última estrofe traduz a revelação da verdade, confirma-a, após a mãe ter clarificado que não se deixou enganar pela mentira da filha. O refrão revela, em suma, o verdadeiro motivo por que a donzela tardou na fonte: "ei amores" = tenho amores / amigo.
         Por outro lado, combinando o refrão com outros elementos, chegamos à conclusão que esta cantiga contém elementos dos três géneros literários:
- género lírico:  - uso do verso;
                         - paralelismo;
                         - ritmo;
                         - predomínio do sentimento;
- género dramático:   - refrão (= aparte);
                                - carácter dialogado;
                                - interrogações;
- género narrativo:    - existência de uma ação, vivida por personagens num tempo e num espaço.
. Aliterações em f, t, m.
. Assonância: alternância i / a (nas palavras rimantes).


         2. Nível morfossintático

. Paralelismo:
- anafórico e semântico: os pares de estrofes apresentam versos com palavras diferentes, mas sentidos semelhantes;
- estrutural: alternância entre a vogal tónica i no primeiro dístico do par e a no segundo dístico.
. Paralelismo imperfeito.
. Sinais de pontuação:
- ponto de exclamação: revela emoção (linguagem / função expressiva);
- no refrão:
. parêntesis: indicação do aparte (espécie de coro interior, desabafo da alma);
. travessão: característica do discurso directo;
. ponto final: informação.
. Vocativos.
. Predomínio do discurso da mãe: a figura da mãe domina a cantiga, quer como interlocutora da donzela, quer como opositora. De facto, é este um mundo que desconhece a autoridade paterna. Nem uma só vez a sombra do pai vem perturbar este universo estritamente feminino, que apenas se excita com as proibições e concessões da mãe, único juiz das acções da filha enamorada. Uma das justificações para a ausência do pai é a sua estada no fossado.
                Por outro lado, a mãe, por vezes propícia aos amores da filha, é-lhes na maioria dos casos hostil, embora de nada sirva contrariar essas inclinações sentimentais.
. Substantivos: filha, o sujeito do amor;
  mãe, a oponente aos amores da filha;
                         
água, a causa (inventada) da demora da donzela, pois foi revolvida e suja pelos cervos;
simboliza também a pureza e inocência da jovem.
. Adjectivos velida, louçana: elementos encarecedores da donzela.
. Verbos no modo imperativo: traduzem a interpelação da donzela pela mãe, que procura conhecer a razão da sua demora.
. Anáfora.
. Sinonímia: amigo / amado;
 rio / alto.


         3. Nível semântico

. Símbolos / metáforas:
Elementos
Nível literal
Nível simbólico
Fontana
local onde a donzela lava a roupa e os cabelos
. local de encontros amorosos
. símbolo da maternidade, da origem da vida, do poder, da felicidade e da própria vida
Cervos
veados
. amigo, namorado
. símbolo da potência viril, da fecundidade e renascimento
. anunciador da luz do dia, símbolo da velocidade, do amor impetuoso
Volviam a água
turvavam a água
. a perturbação da donzela, que encontrou o amigo e se demorou a conversar com ele
Áugua
água
. a causa inventada da demora da jovem
. a pureza e inocência da donzela
. Antítese verdade (procura) / mentira.
. Apóstrofe: "filha, mha filha velida":
- acentua o caráter dialogado da cantiga e
- a presença de dois interlocutores (a mãe e a filha).
. Sinédoque: "Nunca vi cervo que volvess' o alto".


· Classificação

1. Cantiga de amigo.

1.1. Formal: cantiga de refrão;
cantiga dialogada / tenção;
cantiga paralelística imperfeita:
- constituída por 3 pares de dísticos, seguidos de refrão;
- o 2.º dístico repete a ideia do primeiro, alternando apenas a palavra rimante;
- a rima alterna em “i” (nas estrofes ímpares – “velida”, “fria”, “volviam”, “amigo”, “frio”) e “a” (nas estrofes pares – “louçana”, “fontana”, “áugua”, “amado”, “alto”).


2 comentários :

  1. muito obrigado salvou me umas boas 3 horas que iria demorar fazer isto. Ja esta tarde e doime o coxis e quero deitar me por isso obrigado e tenha um bom dia ou noite nao sei chau obrigado

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  2. mano do seu ainda bem que a minha professora não gosta da internet

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