"Toda a saúde, pública, privada ou social TEM QUE ser repensada." OU "Toda a saúde, pública, privada ou social TEM DE ser repensada."? Qual é a construção correta?
O uso da construção 'ter que' em vez de 'ter de' é frequentíssimo, mas, como é habitual noutro casos e noutras circunstâncias, a generalização não invalida que se trata de um 'erro'.
Repare-se como, neste edição do programa «Bom Português» [aqui], da RTP, se sustenta, precisamente, a utilização errada da primeira construção.
Sem mais delongas, citamos a explicação da professora Regina Rocha [aqui], com a qual concordamos em absoluto, considerando, no entanto, outras possibilidades [aqui e aqui, por exemplo]:
Em síntese:
Ter de: obrigatoriedade
O uso da construção 'ter que' em vez de 'ter de' é frequentíssimo, mas, como é habitual noutro casos e noutras circunstâncias, a generalização não invalida que se trata de um 'erro'.
Repare-se como, neste edição do programa «Bom Português» [aqui], da RTP, se sustenta, precisamente, a utilização errada da primeira construção.
Sem mais delongas, citamos a explicação da professora Regina Rocha [aqui], com a qual concordamos em absoluto, considerando, no entanto, outras possibilidades [aqui e aqui, por exemplo]:
1. Ter de
Ter de é uma
expressão utilizada quando se pretende dizer que se tem o desejo, a
necessidade, a obrigação ou o dever em relação a uma qualquer acção: «tenho de
me ir embora» (= sou obrigado a ir-me embora, devo ir-me embora, tenho
necessidade de me ir embora), «ele tem de arrumar o quarto» (= ele deve
arrumar, tem o dever de arrumar o quarto), «temos de nos ouvir uns aos outros»
(= temos o dever ou a obrigação de nos ouvir).
Nesta situação, o verbo «ter» é um verbo auxiliar
da conjugação perifrástica: auxiliar ter + preposição de + verbo no infinitivo.
Assim, «ter de», por si só, significa «ter necessidade de», «precisar de», «ser
obrigado a», «dever», designando, pois, a necessidade de praticar a acção
expressa pelo verbo que se segue, que é o verbo principal.
2. Ter que
Nesta situação, o verbo «ter» não é um auxiliar; é
um verbo com a plena significação de «possuir», «ser detentor de», «estar na
posse de», «desfrutar», «usufruir», «poder dispor de».
Por exemplo, se alguém quiser dizer que «tem muito
trabalho», poderá utilizar a expressão «que fazer» para substituir a palavra
«trabalho»: «Tenho muito que fazer.» Do mesmo modo, se quiser dizer que tem uma
série de histórias ou aventuras para nos contar, pode utilizar a expressão «que
contar» para referir esse conjunto de relatos: «Ele viveu muito, tem muito que
contar.» Se quiser, ainda, dizer que tem em casa muita matéria para estudar,
assuntos sobre os quais se debruçar, poderá utilizar a expressão «que estudar»:
«Tenho tanto que estudar!» E também podem surgir frases sem esse antecedente,
subentendendo-se «coisas», «alguma coisa», «algo» (na negativa, «nada») a que o
relativo se refira: «ele não tem que fazer» (= não tem coisas que fazer, não
tem nada que fazer), «ele não tem que comer» (= não tem nada que comer), «ele
não vai ter que dizer» (= não vai ter nada que dizer).
Por outro lado, esses sintagmas «que fazer», «que
contar», «que estudar», «que comer», «que dizer» assumem, pois, força
substantiva, como se pudessem ser substituídos por «trabalho» ou «afazeres»,
«relatos», «estudo», «comida», «palavras», etc.: «ele tem que fazer» = ele tem
trabalho, tem afazeres; «ele tem que comer» = ele tem comida; «ele não tem que
dizer» = ele não tem palavras. E entre o verbo «ter» e o pronome relativo «que»
poderá ser colocado um indefinido (tanto, muito, pouco).
3. Ter de distingue-se,
pois, de ter que,
porque no primeiro caso está presente a ideia da obrigação, da necessidade, do
dever, enquanto no segundo está presente a de dar uma informação sobre o que o
emissor possui ou tem em mãos.
Vou construir duas frases semelhantes, em que
apenas substituo a preposição «de» pelo pronome relativo «que», de modo a
mostrar como o sentido é diferente.
a) «Ele
não vai sair, porque tem de estudar.» – Com esta construção pretende dizer-se
que ele precisa de estudar, deve estudar, tem a obrigação ou a necessidade de
estudar, está obrigado a estudar; e a necessidade de estudar impede-o de sair.
b) «Ele
não vai sair, porque tem que estudar.» – Com esta construção pretende dizer-se
que ele tem matéria para estudar. Não é do dever de estudar que se pretende
falar, mas da quantidade de estudo que há para fazer. Não é o dever de estudar
que o impede de sair, mas a quantidade desse estudo: não é o que «deve», aquilo
de que «precisa», mas o que «tem», o que «possui».
Em síntese:
Ter de: obrigatoriedade
- Tenho de estudar.
Ter que: estar relacionado com
- Este assunto tem que ver com o tema da conversa de ontem.
Ter que: ter algo para (com verbos transitivos cujo c. direto não está explícito)
- Tenho (algo/coisas) que fazer.
- Tenho o que fazer.
- Tenho mais que fazer.
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