Ao contrário das religiões contemporâneas, os deuses gregos incorporam em si as mesmas paixões e falhas dos seres humanos e interagem com estes frequentemente. A diferença entre uns e outros é que as entidades divinas são eternas, enquanto a humanidade é mortal. A imortalidade divina transforma os seus conflitos em algo trivial e até algo caricato, em contraste com o sofrimento, a dor e a morte que marcam a existência terrena. Como não existem consequências para si, os deuses encontram até prazer nos conflitos em que se envolvem, o que pode ajudar a explicar o facto de Hera e Atenas não aceitarem a trégua entre Troianos e Aqueus, que poderia significar o fim daquela guerra interminável e a instauração da paz, e tudo fazerem para a batalha prosseguir, para vingarem o seu orgulho ferido com a questão do pomo de ouro.
Deste modo, a guerra é retomada, havendo
referências à morte de personagens menores e a confrontos individuais entre
figuras bem mais notáveis. As descrições dos ferimentos que os lutadores vão
sofrendo são terríveis, baseadas numa fórmula característica. Esses ferimentos
são provocados por espadas, lanças, flechas e pedras, que cortam, dilaceram,
esmagam diferentes partes do corpo, com a exposição ocasional de um ou outro
órgão interno. Tudo isto é apresentado pelo poeta com diferentes detalhes
específicos, no sentido de criar uma panóplia diversificada de mortes no campo
de batalha.
Retirar a armadura ao inimigo
derrotado ou apossar-se do seu cavalo constituem prémios valiosos cuja reivindicação
aumenta a honra do vencedor e desonra o derrotado. Só que a ânsia de obter
estas recompensas por vezes têm consequências fatais para quem as deseja
alcançar, dado que o coloca numa situação de alguma vulnerabilidade. É
exemplificativa disto a referência à primeira morte na obra: um soldado, após a
morte do inimigo, procura imediatamente retirar a armadura do corpo do morto,
«distrai-se» e acaba por ser assassinado.
Por outro lado, nem o partido Aqueu
nem o Troiano são apresentados no poema como melhores do que o outro. Tal é
demonstrado pela imagem de dois soldados, um grego e outro troiano, jazendo
mortos um ao lado do outro, enquanto companheiros seus prosseguem a luta e vão
tombando à sua volta. Este facto não pode ser dissociado de outra questão, a da
inexistência de vilões propriamente ditos no poema. De facto, se é verdade que
o poeta narra os eventos na ótica grega, de modo algum vilaniza os Troianos,
até porque, noutros momentos, os contendores foram aliados e combateram pelo
mesmo objetivo. Foi o que aconteceu, por exemplo, com a aliança que dois povos
estabeleceram para combater as Amazonas. A violência, o sofrimento, a dor e a
morte recaem sobre ambos os exércitos de forma semelhante; o alívio sentido no
momento em que se acorda que o duelo entre Menelau e Páris porá fim ao conflito
é o mesmo para uns e outros; os combatentes das duas fações desejam que o
culpado pela eventual quebra da trégua seja massacrado e as suas mulheres
estupradas; quando o cessar-fogo é efetivamente rompido, fica claro que nenhum
dos partidos é o culpado, dado que o tiro de Pândaro sobre Menelau só é dado
porque Atenas a tal conduz. Assim sendo, é perfeitamente lícita a conclusão de
que os únicos que, verdadeiramente, retiram prazer da guerra e a quem prolongar
são os deuses, que manipulam os seres humanos para atingir os seus propósitos.