. Fernão Lopes foi um dos mais
fecundos e poderosos criadores de caracteres tanto individuais como coletivos,
vindo, por este motivo, a influenciar poetas, romancistas e dramaturgos de
épocas posteriores.
1. Atores individuais
. As personagens individuais criadas pelo cronista são variadas e complexas, sendo devassadas na sua intimidade por um olhar incisivo.
. Na Crónica de D. João I, três personagens se destacam pelo seu
protagonismo: D. Leonor Teles, o Mestre de Avis e Nuno Álvares Pereira.
a) Leonor Teles é
caracterizada de forma profundamente negativa,
na medida em que é descrita como objeto de um ódio profundo por parte do povo, sendo, além disso, alvo das
acusações do partido que queria a independência do trono português e suspeita
de ter sido a responsável pela morte do marido, D. Fernando (cf. Cap. XI da Crónica). Apesar disto, Fernão Lopes não
oculta a sua grandeza e força, que lhe permitem manipular figuras masculinas, como D.
Fernando, D. João de Castro (filho ilegítimo de D. Pedro e de D. Inês de
Castro) e o próprio Mestre de Avis, e enfrentar, mesmo após a derrota, o rei de
Castela, recusando-se a ingressar num convento.
b) O Mestre de Avis é caracterizado como um homem vulgar, hesitante
e vulnerável às fraquezas, como é
possível verificar, por exemplo, pelas oscilações do seu comportamento aquando
da conjura contra o conde Andeiro (depois de se mostrar indeciso, adere à
conjura, fugindo em seguida para o Alentejo, de onde regressa quando se
apercebe de que a conspiração será inevitavelmente descoberta). Apesar destes
defeitos – que o tornam uma personagem profundamente realista –, D. João I mostra também ser capaz de atos espontâneos
de solidariedade, o que o converte
numa figura cativante.
c) Nuno Álvares Pereira é
caracterizado como um herói hagiográfico,
isto é, com traços de santidade, e, ao mesmo tempo, como um grande guerreiro.
2. Atores coletivos
. As personagens coletivas
(como, por exemplo, a população de Lisboa) têm um papel ativo e decisivos, determinando
o curso dos acontecimentos.
. Com efeito, sempre que é
narrado um evento importantes, o cronista faz questão de expor o que pensava dele a opinião pública, como sucede aquando do
cerco de Lisboa, momento em que a população da cidade oscila entre a esperança
de que a frota castelhana fosse derrotada e o receio de que os castelhanos
saíssem vitoriosos, exercendo uma vingança cruel sobre os sitiados.
. Esta expressão de
sentimentos da coletividade é, por vezes, resumida através de um dito que sai
de uma multidão – como sucede com as cantigas entoadas durante o cerco de
Lisboa, que mostram a profunda determinação dos habitantes da cidade.
. A importância conferida a uma entidade coletiva nos eventos
históricos (como sucede aquando da derrota dos castelhanos no cerco de Lisboa,
cujo mérito é atribuído à população da cidade) torna Fernão Lopes um cronista único entre os seus congéneres
medievais.
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