Português

segunda-feira, 4 de abril de 2011

"Turn, Turn, Turn", The Byrds (1966)


Tema original dos Byrds, editado em 1966. O vídeo é composto por uma mescla de imagens de uma apresentação ao vivo do grupo musical e do filme Forrest Gump, dos anos 90, de cuja banda sonora fez parte.

domingo, 3 de abril de 2011

...

          Recuso-me a assistir, presencialmente ou via televisão ou Internet, a espectáculos de agressividade e violência.

          É-me indiferente quem ganha hoje, pois o desportivismo e o confronto sadio já perderam amargamente.

Penelope Cruz

sábado, 2 de abril de 2011

Beresford

          Se D. Miguel personifica o poder civil e Principal Sousa o religioso, William Carr Beresford representa o domínio britânico e o poder militar. De facto, ele é um marechal do exército britânico que veio para terras lusas para reorganizar o nosso exército.

          Não obstante, despreza Portugal, que considera um país insignificante e provinciano ("... quem não viu as árvores da minha terra, nunca viu árvores..."; "Esta situação é, em si mesma, uma crítica a Portugal, que ele, como se depreende, despreza." - pág. 56), «um país de intrigas e de traições», opiniões que as figuras dos restantes governadores e dos delatores (Vicente, Andrade Corvo e Morais Sarmento) exemplificam / concretizam. Não é, pois, de estranhar que assuma, sistematicamente, uma postura de arrogância e de superioridade relativamente ao reino e às suas gentes, contraponto a sua terra natal, uma «terra onde as leias são humanas, as pessoas cultas e a vida cheia de sentido» (depreende-se, por contraste, que em Portugal são desumanas), «as pessoas cultas» (em Portugal, incultas e ignorantes), «a vida cheia de sentido» (em Portugal, o oposto) e «um homem vive como um homem» (em Portugal, como um bicho / animal? - ou seja, em condições degradantes). Pelo contrário, o reino lusitano é um país de intrigas e traições (pág. 63) onde reina a desonra («Honras? E quem mas presta?» - pág. 57) e os títulos nobiliárquicos não têm valor («Títulos? Mas quem é o marquês de Campo Maior fora do botequim do Marrare?» - pág. 58).
          Dois dos traços característicos de Portugal com que mais antipatiza são o catolicismo caduco e o exercício incompetente do poder, mostrando-se, nos diálogos que trava com Principal Sousa, sistematicamente, sarcástico, irónico, jocoso, zombador, mordaz, trocista e profundamente crítico quer com aquela personagem, que com o país, quer com as suas instituições («O tom do marechal é sempre jocoso. Sente-se que não toma os Portugueses a sério, embora esteja disposto a  colaborar com eles na medida do necessário para a obtenção dos seus fins.» - pág. 55 - assim se revela um perfeito oportunista). Atente-se, por exemplo, nas opiniões que manifesta sobre o exército (considera-o pindérico), o Rei e a Igreja, que despreza.

          Homem prático e decidido («Excelências: não vim aqui para perder tempo com conversas filosóficas. Venho falar-lhes de coisas mais sérias.» - pág. 41) e objectivo («Beresford é um homem prático, que encara objectivamente a realidade» - pág. 42), as suas intervenções, nos diálogos travados com as demais personagens, denunciam um homem calculista, perspicaz, prático, objectivo, materialista e ambicioso, um mercenário, em suma: «Pretendo uma coisa de vós: que me pagueis - e bem!»; «Troco os meus serviços por dinheiro, Excelência.» - pág. 58).

          Relativamente ao General, assume que é seu inimigo por razões pessoais: «... é meu inimigo, portanto, quem me dificulte esta missão.» - pág. 63  o General; «quem me possa substituir na organização do exército»  o General; «sou um grande sargento e um mau oficial» (o oposto do General); «sei organizar um exército, mas que não o sei comandar em campanha.»  a falta de liderança (o oposto do General). À semelhança de D. Miguel, apresenta-se como uma personagem que segue os princípios do maquiavelismo, ou seja, alguém para quem os fins justificam os meios («Tragam-nos a proclamação... obtenham-na seja como for...» - pág. 52; «Senhores, afirmo-vos em nome dos meus 16 000$00 anuais que farei tudo o que for necessário para os continuar a receber!» - pág. 59). Dito de outra forma, a condenação de Gomes Freire - a condenação de um inocente - visa a conservação do seu poder, da sua tença, do seu prestígio e dos seus privilégios. Assim, fomenta a denúncia e o suborno no sentido de encontrar o responsável pela conspiração («Comprem quem for preciso, vendam a alma ao diabo, mas tragam-nos o nome dos chefes...» - pág. 69).

          Já o diálogo mantido com Matilde mostra-nos um Beresford egoísta, insensível e frio que não se deixa comover pelas súplicas desesperadas da companheira do general. Pelo contrário, usa com ela uma linguagem trocista, irónica e arrogante, que se destina a agredi-la moralmente e a humilhá-la.

quarta-feira, 30 de março de 2011

"A Portugal", Jorge de Sena

                    Esta é a ditosa pátria minha amada
                    Não, nem é ditosa porque o não merece,
                    nem minha amada, porque é só madrasta
                    nem pátria amada, porque eu não mereço
                    a pouca sorte de ter nascido nela.
                    Nada me prende ou liga a uma baixeza tanta
                    Quanto esse arroto de passadas glórias.
                    Amigos meus mais caros tenho nela
                    Saudosamente nela,
                    Mas amigos são por serem meus amigos
                    e mais nada.
                    Torpe dejecto de romano império,
                    Babugem de invasões,
                    Salsujem porca de esgoto atlântico,
                    Irrisória face de lama, de cobiça e de vileza,
                    De mesquinhez, de fátua ignorância.
                    Terra de escravos, de cu para o ar,
                    Ouvindo ranger no nevoeiro a nau do Encoberto.
                    Terra de funcionários e de prostitutas,
                    Devotos todos do Milagre,
                    Castos nas horas vagas, de doença oculta.
                    Terra de heróis a peso de ouro e sangue,
                    E santos com balcão de secos e molhados,
                    No fundo da virtude.
                    Terra triste à luz do Sol caiada,
                    Arrebicada, pulha,
                    Cheia de afáveis para os estrangeiros,
                    Que deixam moedas e transportam pulgas
                    (Oh!, pulgas lusitanas!) pela Europa
                    Terra de monumentos
                    em que o povo assina a merda
                    o seu anonimato.
                    Terra-museu em que se vive ainda
                    com porcos pela rua em casas celtiberas.
                    Terra de poetas tão sentimentais
                    Que o cheiro de um sovaco os põe em transe.
                    Terra de pedras esburgadas,
                    Secas como esses sentimentos,
                    De oito séculos de roubos e patrões,
                    Barões ou condes.
                    Oh! Terra de ninguém, ninguém, ninguém!
                    Eu te pertenço.
                    És cabra! És badalhoca!
                    És mais que cachorra pelo cio!
                    És peste e fome, e guerra e dor de coração!
                    Eu te pertenço!
                    Mas seres minha, não!

O Cheque

Roubado do blogue Portugal dos Pequeninos:


          «A imagem, por si, é a mensagem e a massagem. Uma escritora de livros infantis, ainda ministra da educação do Portugalório, contempla a aventura por vir. A seu lado, duas raparigas e dois rapazes - os "melhores" alunos do secundário -, em vez de exibirem livros, mostram réplicas de cheques que lhes devem ter sido entregues pelos "resultados". A educação não pode ser tratada como uma prostituta notória à semelhança do que ainda ontem aconteceu no parlamento. Agora é que sim. Agora é que não. Que lindo futuro.»

Semana Académica Coimbra 2011

quinta-feira, 24 de março de 2011

"Nevoeiro", Fernando Pessoa

          O primeiro-ministro (em minúsculas) demitiu-se; a dívida pública e privada é gigantesca; os juros exigidos pelos empréstimos que contraímos são descomunais; a crise está aí em todo o seu esplendor.

          Sobre a CRISE, ou crises, escreveu Pessoa na Mensagem o poema «Nevoeiro», precisamente o que encerra a obra:


NEVOEIRO

Nem rei nem lei, nem paz nem guerra,
Define com perfil e ser
Este fulgor baço da terra
Que é Portugal a entristecer –
Brilho sem luz e sem arder,
Como o que o fogo - fátuo encerra.

Ninguém sabe que coisa quer,
Ninguém conhece que alma tem,
Nem o que é mal nem o que é bem.
(Que ânsia distante perto chora?)
Tudo é incerto e derradeiro.
Tudo é disperso, nada é inteiro.
Ó Portugal, hoje és nevoeiro...

É a hora!


          O poema aponta claramente para um clima de degradação da pátria, de melancolia e tristeza, enfatizado pelo recurso a palavras e expressões que revelam negatividade ("Nem rei nem lei"; "Brilho sem luz", etc.), em suma, um ambiente de crise a vários níveis: político ("Nem rei nem lei, nem paz nem guerra"); moral ("Ninguém sabe que coisa quer, / (...) nem o que é mal, nem o que é bem"); de identidade ("ninguém conhece que alma tem"). A situação de Portugal era, portanto, de incerteza e indefinição. Ontem, tal como hoje: "Ó Portugal, hoje és nevoeiro...".

          Assim sendo, as circunstâncias exigem um golpe de asa, um esforço conjunto de resgate da situação disfórica que se vive. Parafraseando Pessoa, «É a hora!».

Populares

          O povo / os populares configura(m) uma personagem colectiva relevante na peça, como não poderia deixar de acontecer.
          O povo não possui qualquer poder nem um líder - embora deposite enormes esperanças no general -, o que faz com que surja na peça oprimido e completamente indefeso.
          O seu espaço privilegiado é a rua, retrato da sua miséria - fome, desemprego, ausência de habitação condigna ["Tens sete filhos com fome e com frio e vais para casa com as mãos a abanar. (...) E tu, qu enão comes desde ontem (...) Nenhum de vocês tem um tecto que os abrigue no Inverno, nenhum de vocês tem onde cair morto (...)"] -, da ignorância e do analfabetismo ("Talvez, se o ensinassem a ler..." - p. 36), da opressão e do terror, da desilusão e ausência de perspectivas.
           Nas palavras de Vicente, a sua miséria é tal que dirige a sua preocupação para o quotidiano e para a sobrevivência diária ("Interessa-lhe mais o preço do pão... Talvez, se o ensinassem a ler, tomasse conhecimento do «Eclesiastes»..." - p. 36), escasseando-lhe tempo para questões da filosofia política ou religiosa ("... e pouco se preocupa com a origem do poder." - p. 36).
          Não obstante todas as circunstâncias que marcam o seu quotidiano, o povo tem um grande sentido de justiça e de dignidade e uma elavada consciência. À semelhança do que sucede com Manuel, vê no general Gomes Freire o libertador da opressão, do medo e da miséria em que vive, depositando na sua acção toda a esperança, daí não ser de estranhar o desespero e a desilusão que o assalta quando toma conhecimento sua prisão e posterior condenação à morte.

          Por outro lado, esta personagem desempenha diferentes funções ao longo da peça:



  1. Coro, dado que as suas falas têm o valor de informação ou comentário dos acontecimentos;
  2. Inicia os dois actos, estabelecendo, no I, a ligação entre a acção e o espectador e relatando, no II, a prisão de Gomes Freire e o desespero de Matilde;
  3. Situa o espectador no tempo histórico, através das suas interrogações ("Onde aprendeu vocessemecê isso? Em Campo d'Ourique - já lá vão dez anos..." - pág. 18);
  4. No acto II, as falas populares revestem o carácter de informação / comentário sobre os episódios ao nível da acção dramática: "Passaram toda a noite a prender gente por essa cidade..."; "É por pouco tempo, amigo, espera pelo clarão das fogueiras..." (pág. 80).
          Em suma, o povo é uma personagem colectiva que representa o «grupo dos deserdados pela sorte e pelo berço», dos que servem e são explorados, que recebem esmola e são tratados indignamente pela classe dominante, que trabalham e são explorados.
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