quinta-feira, 10 de março de 2011
terça-feira, 8 de março de 2011
Paris Hilton
Porque hoje é Carnaval e precisamos de palhaços...
segunda-feira, 7 de março de 2011
Epigrama - Gregório de Mattos
Juízo anatómico dos achaques de que padecia o corpo da República em todos os membros, e inteira definição do que em todos os tempos é a Bahia
Que falta nesta cidade?... Verdade.
Que mais por sua desonra?... Honra.
Falta mais que se lhe ponha?... Vergonha.
O demo a viver se exponha,
Por mais que a fama a exalta,
Numa cidade onde falta
Verdade, honra, vergonha.
Quem a pôs neste rocrócio?... Negócio.
Quem causa tal perdição?... Ambição.
E no meio desta loucura?... Usura.
E que justiça a resguarda?... Bastarda.
É grátis distribuída?... Vendida.
Que tem, que a todos assusta?... Injusta.
Valha-nos Deus, o que custa
O que El-Rei nos dá de graça.
Que anda a Justiça na praça
Bastarda, vendida, injusta.
Substituamos o nome «Bahia» pelo de Portugal e o texto de Gregório de Mattos (Bahia, 1633-1696), também conhecido por Boca do Inferno, escrito no século XVII, aplica-se, sem a mais pequena alteração, à situação que se vive hoje no nosso rectângulo.
domingo, 6 de março de 2011
sexta-feira, 4 de março de 2011
Gomes Freire de Andrade
Embora nunca apareça em cena, Gomes Freire de Andrade - amado pelo povo e odiado pelos governadores - é a personagem central e constitui o elemento estruturador da acção:
- origina a sequência de episódios da peça;
- é o símbolo da luta pela Liberdade e pela Justiça;
- atrai a admiração e a esperança do povo miserável e oprimido;
- atrai, por oposição, a desconfiança e o ódio dos governadores.
- a sua prisão, condenação e execução constituem o centro das conversas e condicionam o comportamento das restantes personagens.
Apesar de estar fisicamente ausente (de facto, nunca surge em cena / palco), domina os pensamentos e as preocupações das restantes personagens, daí que o seu retrato seja traçado a partir do que elas nos dão a conhecer sobre ele.
1. Para o POVO:
- é considerado um mito / é mitificado ("Para esta cambada, o Freire é Deus." - pág. 24);
- é idolatrado (pelo povo);
- é carismático;
- é admirado ("Fala com entusiasmo." - pág. 20);
- representa a liberdade;
- é um amigo, «um homem às direitas»;
- é humano e corajoso («Não é um santo, é um homem como todos nós.»);
- é o único capaz de enfrentar «os senhores do Rossio».
2. Para o ANTIGO SOLDADO:
- é um militar - general ("No regimento de Freire d'Andrade" - pág. 18);
- defende / representa a liberdade ("No regimento de Freire d'Andrade / São cantadas com o estilo / De lá ré ó liberdade." - pág. 18);
- é "Um amigo do povo" (pág. 20);
- é justo, recto, honesto ("Um homem às direitas!" - pág. 20), sendo, pelas suas qualidades, único, diferente dos restantes ("Quem fez aquele não fez outro igual..." - pág. 20);
- é um herói ("Vê-se que Gomes Freire é o seu herói." - pág. 20);
- não é oportunista; é humano e um igual ao povo ("Não é um santo, é um homem como todos nós..."- pág. 23).
3. Para MANUEL:
- deposita no general a sua (única) esperança de enfrentar o poder instituído e lutar pela liberdade ("Se ele quisesse..." - pág. 21);
- é forte, corajoso, valente ("... é capaz de se bater com os senhores do Rossio..." - pág. 23);
- é o único "capaz de se bater com os senhores do Rossio" (pág. 23).
4. Para VICENTE:
- é um general como os outros, que se serve do povo quando dele necessita e depois o abandona à sua sorte;
- ignorará o sofrimento do povo, não o retirando da opressão e da miséria
- é um estrangeirado ("O teu general, então, é perfeito: nem sequer é português... (...) Estrangeirado: estrangeirado é que ele é!" - pág. 23);
- é idolatrado pelo povo ("Para esta cambada, o Freire é Deus." - pág. 24; "... a ninguém tem o povo mais amor do que ao primo de V. Excelência." - p. 34), que nele deposita toda a sua esperança numa revolução ("Em ninguém põe o povo mais esperança do que no general..." - p. 34).
5. Para BERESFORD:
- é um oficial de patente elevada, com um grande passado militar (p. 64);
- considera-o inimigo natural dos governadores pelas suas qualidades ("Trata-se de um inimigo natural desta regência." - pág. 71);
- é seu inimigo pois receia ser substituído por ele e, assim, perder os privilégios de que disfruta, entre os quais se conta a tença que recebe por comandar o exército.;
- é incómodo porque «... devendo, por nascimento e posição, defender certos interesses, defende outros...» (p. 96).
6. Para D. MIGUEL:
- considera-o lúcido, inteligente, idolatrado pelo povo, um soldado brilhante, grão-mestre da Maçonaria e um estrangeirado (p. 71);
- considera-o um "inimigo natural desta regência" (p. 71);
- considera-o um traidor, daí a necessidade da sua morte: "Morte ao traidor Gomes Freire d'Andrade!" (p. 74);
- consciente de que não possui a capacidade de comunicação do primo, receia que este ponha em causa o seu lugar na regência e lhe retire a sua projecção como estadista.;
- considera-o incómodo, já que «... devendo, por nascimento e posição, defender certos interesses, defende outros...» (p. 96).
7. Para PRINCIPAL SOUSA:
- odeia os franceses, os maçons, porque os considera responsáveis pela falta de respeito a Deus e à Igreja ["São muitos os inimigos do Senhor (...). Fala-se de Deus com ironia e da sua Igreja como se de letra morta se tratasse. Os piores, Srs. Governadores, são os pedreiros-livres (...). Quem será o chefe da Maçonaria?" - pág. 67]. Por ser considerado estrangeirado, Gomes Freire de Andrade representa os franceses, cuja influência faz com que o povo cante "... pelas ruas subservivas." (pág. 40).
8. Para MATILDE:
- constitui uma ameaça ao Poder, mesmo que não tenha sido conspirador: «Olhe que nem saía de casa com medo que o povo o aclamasse. Juro-lhe que nunca conspirou.» (p. 95);
- é o seu homem;
- é o paradigma da honestidade, da verdade, da lealdade: «(...) dizem a verdade (...) vêem para além da cortina de hipocrisia com que os poderosos escondem a defesa dos seus interesses...» (p. 95);
- não é ambicioso nem adulador: «Vê para além das medalhas que usais no peito...» (p. 96);
- é ousado, corajoso e destemido: «... olha para vós de frente e sorri...» (p. 96);
- é valente, justo e leal;
- está inocente do crime que lhe procuram imputar, isto é, conspirar contra o Poder («... ele não cometeu qualquer crime.» - p. 95).
9. Para SOUSA FALCÃO:
- é o oposto de D. Miguel Forjaz: «É franco, aberto e leal...» (p. 117) e sabe perdoar, ao contrário do primo, que é «calculista e medíocre»;
- é um homem corajoso, o exemplo da luta por um ideal, um daqueles «... homens que obrigam todos os outros homens a reverem-se por dentro...» (p. 137).
10. Para FREI DIOGO:
- é um santo: «Se há santos, Gomes Freire é um deles...» (p. 126);
- «Foi um grande privilégio que Deus lhe concedeu - o de viver ao lado dum homem como o general Gomes Freire.» (p. 127).
Em suma, o general Gomes Freire de Andrade é apresentado como:
- um homem culto, educado e letrado (um estrangeirado");
- o símbolo da luta pela liberdade e pela defesa dos ideais contrários à prática dos "reis do Rossio";
- o símbolo da modernidade e do progresso, adepto das novas ideias liberais, por isso considerado pelos governantes subversivo e perigoso, daí que preencha todos os requisitos para ser o bode expiatório do ambiente de revolta;
- símbolo da integridade e da recusa da subserviência, da capacidade de liderança e de coragem na defesa dos ideais em que crê;
- culpado (pelos detentores do poder) porque "... é lúcido, é inteligente, é idolatrado pelo povo, é um soldado brilhante, é grão-mestre da Maçonaria e é, senhores, um estrangeirado..." (p. 71);
- um homem cuja morte remete para a manutenção de uma ideologia fossilizada, num país estagnado e assolado pelo medo, pela denúncia e pela suspeição (p. 63);
- um homem cuja morte é duplamente aviltante enquanto militar, pois é enforcado e depois queimado, quando a sentença adequada para ele na qualidade de elemento do exército seria o fuzilamento; por outro lado, a morte pretende ser uma lição para todos aqueles que ousarem afrontar o poder político.
Vicente
Vicente integra o grupo dos traidores e delatores, o equivalente aos «bufos» da época do Estado Novo. Este grupo move-se pela conveniência, isto é, representa todos aqueles que se aproximam do poder para obter favores e que não têm qualquer pejo em se vender aos governantes. São, no fundo, os verdadeiros traidores que não têm qualquer ética ou valores morais e que passam impunes, alcançando os seus objectivos.
Vicente é, na peça, o maior representante desta «classe». Ele é um elemento do povo / popular que surge, pela primeira vez, investido na função de provocador e agitador, procurando denegrir a imagem do general Gomes Freire de Andrade junto do povo através de diversos «argumentos»: a guerra e as feridas e mágoas que deixou na lembrança das pessoas ("Vocês ainda não estão fartos de generais?" - pág. 21); as miseráveis condições de vida em que vivem [a fome que atinge as famílias, muitas numerosas, procurando apelar ao sentimento de pai ("Tens sete filhos com fome e com frio e vais para casa com as mãos a abanar. Julgas que o Gomes Freire os vai vestir?" - pág. 21); a ausência de vestuário; a ausência de habitação ("Nenhum de vocês tem um tecto que o abrigue no Inverno..." - pág. 21)]; o desprezo a que são votadas as pessoas quando deixam de ter utilidade, abandonadas à miséria e à condição de pedintes, por contraste com os generais, que obtêm glória ("... para eles se encherem de medalhas..." - pág. 22) através do seu sacrifício e vivem confortavelmente("Matas a fome com os cinco réis e com a recordação da campanha. Mas eles... eles vão para casa encher a pança!" - pág. 22 - notar o recurso a uma linguagem rude, sinónimo da sua origem social), indiferentes à desgraça alheia. Depois, concentrando-se directamente no seu alvo, acusa-o de ser um «estrangeirado» (pág. 23) e ser igual aos outros, de estar conluiado com o poder ("Porque está feito com eles, porque essa gente é toda igual." - pág. 24). Nessa sua tarefa, socorre-se por vezes do sarcasmo e da ironia ("É um santo, o teu general..." - pág. 23).
Durante o diálogo com os dois polícias, Vicente autocaracteriza-se como mentiroso ("... digo-lhes metade da verdade." - pág. 25) e revela toda a sua astúcia, manha e inteligência ("Lembro-lhes que o Gomes Freire é general e falo-lhes da guerra. Haverá alguém que se não lembre da guerra?"; "Odeiam os Franceses e os Ingleses? Chamo estrangeirado ao Gomes Freire..." - pág. 25), todo o seu materialismo, oportunismo e ambição, afirmando que se vende a quem lhe pagar: "Só acredito em duas coisas: no dinheiro e na força. O general não tem uma nem outra." (pág. 25). Ora, estas afirmações permitem deduzir que Vicente poderia perfeitamente aliar-se ao general caso este fosse detentor de dinheiro ou poder, o que quer dizer que não há qualquer ideologia que sustente as suas acções, apenas o seu interesse imediato.
Por outro lado, esta personagem não tem qualquer rebuço em confessar que trai os seus por dinheiro ("Ias perguntar-me se foi por dinheiro que eu me virei contra os meus..." - pág. 26), mostrando-se descontente, frustrado e revoltado com a sua condição social, revelando igualmente vergonha das suas origens ("´É verdade que nasci aqui e que a fome desta gente é a minha fome, mas... é igualmente verdade que os odeio, que sempre que olho para eles me vejo a mim próprio: sujo, esfomeado, condenado à miséria por acidente de nascimento." - pág. 27). O modo que encontra para ultrapassar a sua condição e o seu sentimento de inferioridade passa pela ascensão político-social rápida, obtida através da denúncia e da traição e concretizada com a obtenção do cargo de chefe de polícia ("... sou capaz de acabar com uma capela... ou chefe de polícia..." - pp. 30-31). Esse sentimento de inferioridade e de vergonha pelas suas origens leva-o a desprezar os seus semelhantes, os elementos da sua classe ("Rindo-se com desprezo" [do 1.º Polícia] - pág. 31). Por outro lado, em determinado momento denuncia a incapacidade de o povo se fazer ouvir pelo Poder ("Bem vistas as coisas, que pode a voz do povo contra a voz d'el-rei?" - p. 35). A sua origem social fica patente na sua linguagem, quando recorre a provérbios populares: "Há quem diga que a voz do povo é a voz de Deus..." (p. 35).
No seu percurso, marcado por várias etapas - provocador e agitador (início do acto I), procurando denegrir a imagem do general; espião (vigia a casa de Gomes Freire); delator (denuncia o general, acto pelo qual espera uma recompensa); acusador (confirma a existência das reuniões e indica o nome dos conspiradores) - ficam bem patentes as suas características mais marcantes: a hipocrisia, o servilismo, a adulação, o materialismo, o oportunismo dos que não olham aos meuos para atingir os seus fins. No diálogo entabulado com os governadores, nomeadamente com D. Miguel, demonstra toda a sua adulação ("Avançando e fazendo uma vénia prolongada" [para D. Miguel] - pág. 33; "Francamente adulador" - p. 34), todo o seu calculismo e hipocrisia, visto que age e fala de acordo com aquilo que pensa poder agradar ao seu interlocutor. Dito de outra forma, as respostas que Vicente dá ao governador são, inicialmente, dúbias até ter a certeza da sua posição em relação ao general ("Fixa atentamente D. Miguel porque não tem a certeza de estar a agradar. A meio da frase faz uma pausa para estudar a reacção do governador, e recomeça." - p. 34).
Após a denúncia e condenação do general, Vicente é recompensado pelos seus «bons» serviços ao ser promovido a chefe de polícia, afinal a sua grande ambição, passando, a partir daí, a ignorar e maltratar os seus conhecidos e os da sua classe social: «Olhou para mim como se nunca me tivesse visto. Estendi-lhe a mão e deu-me uma cacetada na cabeça.». Ele é, em definitivo, aquele que se vende ao poder de forma pouco escrupulosa.
Vicente é, na peça, o maior representante desta «classe». Ele é um elemento do povo / popular que surge, pela primeira vez, investido na função de provocador e agitador, procurando denegrir a imagem do general Gomes Freire de Andrade junto do povo através de diversos «argumentos»: a guerra e as feridas e mágoas que deixou na lembrança das pessoas ("Vocês ainda não estão fartos de generais?" - pág. 21); as miseráveis condições de vida em que vivem [a fome que atinge as famílias, muitas numerosas, procurando apelar ao sentimento de pai ("Tens sete filhos com fome e com frio e vais para casa com as mãos a abanar. Julgas que o Gomes Freire os vai vestir?" - pág. 21); a ausência de vestuário; a ausência de habitação ("Nenhum de vocês tem um tecto que o abrigue no Inverno..." - pág. 21)]; o desprezo a que são votadas as pessoas quando deixam de ter utilidade, abandonadas à miséria e à condição de pedintes, por contraste com os generais, que obtêm glória ("... para eles se encherem de medalhas..." - pág. 22) através do seu sacrifício e vivem confortavelmente("Matas a fome com os cinco réis e com a recordação da campanha. Mas eles... eles vão para casa encher a pança!" - pág. 22 - notar o recurso a uma linguagem rude, sinónimo da sua origem social), indiferentes à desgraça alheia. Depois, concentrando-se directamente no seu alvo, acusa-o de ser um «estrangeirado» (pág. 23) e ser igual aos outros, de estar conluiado com o poder ("Porque está feito com eles, porque essa gente é toda igual." - pág. 24). Nessa sua tarefa, socorre-se por vezes do sarcasmo e da ironia ("É um santo, o teu general..." - pág. 23).
Durante o diálogo com os dois polícias, Vicente autocaracteriza-se como mentiroso ("... digo-lhes metade da verdade." - pág. 25) e revela toda a sua astúcia, manha e inteligência ("Lembro-lhes que o Gomes Freire é general e falo-lhes da guerra. Haverá alguém que se não lembre da guerra?"; "Odeiam os Franceses e os Ingleses? Chamo estrangeirado ao Gomes Freire..." - pág. 25), todo o seu materialismo, oportunismo e ambição, afirmando que se vende a quem lhe pagar: "Só acredito em duas coisas: no dinheiro e na força. O general não tem uma nem outra." (pág. 25). Ora, estas afirmações permitem deduzir que Vicente poderia perfeitamente aliar-se ao general caso este fosse detentor de dinheiro ou poder, o que quer dizer que não há qualquer ideologia que sustente as suas acções, apenas o seu interesse imediato.
Por outro lado, esta personagem não tem qualquer rebuço em confessar que trai os seus por dinheiro ("Ias perguntar-me se foi por dinheiro que eu me virei contra os meus..." - pág. 26), mostrando-se descontente, frustrado e revoltado com a sua condição social, revelando igualmente vergonha das suas origens ("´É verdade que nasci aqui e que a fome desta gente é a minha fome, mas... é igualmente verdade que os odeio, que sempre que olho para eles me vejo a mim próprio: sujo, esfomeado, condenado à miséria por acidente de nascimento." - pág. 27). O modo que encontra para ultrapassar a sua condição e o seu sentimento de inferioridade passa pela ascensão político-social rápida, obtida através da denúncia e da traição e concretizada com a obtenção do cargo de chefe de polícia ("... sou capaz de acabar com uma capela... ou chefe de polícia..." - pp. 30-31). Esse sentimento de inferioridade e de vergonha pelas suas origens leva-o a desprezar os seus semelhantes, os elementos da sua classe ("Rindo-se com desprezo" [do 1.º Polícia] - pág. 31). Por outro lado, em determinado momento denuncia a incapacidade de o povo se fazer ouvir pelo Poder ("Bem vistas as coisas, que pode a voz do povo contra a voz d'el-rei?" - p. 35). A sua origem social fica patente na sua linguagem, quando recorre a provérbios populares: "Há quem diga que a voz do povo é a voz de Deus..." (p. 35).
No seu percurso, marcado por várias etapas - provocador e agitador (início do acto I), procurando denegrir a imagem do general; espião (vigia a casa de Gomes Freire); delator (denuncia o general, acto pelo qual espera uma recompensa); acusador (confirma a existência das reuniões e indica o nome dos conspiradores) - ficam bem patentes as suas características mais marcantes: a hipocrisia, o servilismo, a adulação, o materialismo, o oportunismo dos que não olham aos meuos para atingir os seus fins. No diálogo entabulado com os governadores, nomeadamente com D. Miguel, demonstra toda a sua adulação ("Avançando e fazendo uma vénia prolongada" [para D. Miguel] - pág. 33; "Francamente adulador" - p. 34), todo o seu calculismo e hipocrisia, visto que age e fala de acordo com aquilo que pensa poder agradar ao seu interlocutor. Dito de outra forma, as respostas que Vicente dá ao governador são, inicialmente, dúbias até ter a certeza da sua posição em relação ao general ("Fixa atentamente D. Miguel porque não tem a certeza de estar a agradar. A meio da frase faz uma pausa para estudar a reacção do governador, e recomeça." - p. 34).
Após a denúncia e condenação do general, Vicente é recompensado pelos seus «bons» serviços ao ser promovido a chefe de polícia, afinal a sua grande ambição, passando, a partir daí, a ignorar e maltratar os seus conhecidos e os da sua classe social: «Olhou para mim como se nunca me tivesse visto. Estendi-lhe a mão e deu-me uma cacetada na cabeça.». Ele é, em definitivo, aquele que se vende ao poder de forma pouco escrupulosa.
quinta-feira, 3 de março de 2011
quarta-feira, 2 de março de 2011
Piscator
Piscator foi um actor e encenador, portanto um homem do teatro, que trabalhou com Brecht e que esteve na origem da revolução dramatúrgica encetada por este último.
Piscator considerava que uma peça de teatro serve para que se compreenda o mundo e a história e que o público deve manter-se afastado da acção, não se deixando encantar ou enfeitiçar por ela. Além disso, defendia encenações com poucos recursos técnicos, mas recorrendo a linguagens muito diversificadas. Para ele, o teatro era um veículo de actuação, de intervenção, de educação, muito próximo do teatro épico posteriormente teorizado por Bertold Brecht.
John Osborne
Logo a seguir à dedicatória e antes da apresentação das personagens, encontramos um excerto de uma peça de John Osborne, dramaturgo inglês dos anos 50 e 60 que se caracteriza por um estilo muito crítico relativamente aos valores sociais mais tradicionais.
A referida citação foi retirada de uma peça do dramaturgo, televisionada em 1960.
O seu teatro é caracterizado pelo enquadramento individual do herói num contexto de época, reflectindo um drama de consciência. Ora, um dos problemas focados por Osborne é o do confronto do liberalismo, proclamado por uma voz individual, e do tradicionalismo em vigor numa sociedade ultrapassada, o qual pode ser encontrado também na peça de Sttau Monteiro. De facto, nesta, um indivíduo, Gomes Freire, que preconiza o futuro, o progresso, é marginalizado e perseguido por uma ordem inquestionável, a do regime figurado nas personagens Beresford, D. Miguel e Principal Sousa. Por outro lado, se Osborne pretende atingir criticamente a sociedade inglesa da sua época, nomeadamente a monarquia, Sttau procura reflectir sobre o silenciamento, levado a cabo pelo regime autoritário de Salazar, de uma voz de protesto e inconformismo: a do general Humberto Delgado.
Tal como em Osborne, vamos encontrar em Sttau tiradas monologais (por exemplo, de Manuel e de Matilde) em que toda a riqueza interior das personagens surge desnudada perante o olhar do leitor ou do público.
As personagens do dramaturgo inglês são figuras sós, excluídas, que falam e não são compreendidas pelos que as rodeiam. No entanto, não se deixam vergar pela ordem instituída a que se opõem, tal como sucede com Gomes Freire, Matilde e Sousa Falcão, verdadeiros rebeldes perante um poder instituído, mas não revoltosos ou revolucionários.
Holyoake, a personagem de Osborne que consta do excerto transcrito na obra de Sttau Monteiro, defende o direito à opinião («What's the morality of a law wich prohibits the free publication of an opinion?») e auto-proclama-se um homem honesto sobre o qual impende uma única acusação: ir contra a opinião vigente («... I'm here for having been more honest than the law happens to allow.»; «But these weapons are denied only to those who attack the prevailing opinion.»). Assim sendo, esta figura pode ser entendida como uma outra versão de Gomes Freire, o defensor de uma liberdade que o poder autocrático não reconhece e que acaba por ser vítima desse mesmo valor que defende e que o condena.
Manuel
A primeira personagem a ocupar a cena é Manuel, apresentado na didascália que «informa» sobre as personagens da peça como «o mais consciente dos populares». De facto a personagem está plenamente consciente da situação que a rodeia, marcada pela miséria, pelo medo, pela ignorância, pela repressão, pelo autoritarismo.
As suas vestes denunciam, desde logo, a miséria em que vive e que é extensível ao resto da classe a que pertence. Por outro lado, as atitudes revelam a impotência para alterar a situação vivida, bem como um certo conformismo e resignação, não obstante a esperança inicial depositada no general Gomes Freire de Andrade. Exemplo desse estado de espírito é o início paralelo dos dois actos da peça, em que no surge um Manuel interrogando-se: «Que posso eu fazer? Sim, que posso eu fazer?».
Logo de seguida, ainda no seu monólogo inicial, Manuel denuncia o sacrifício do orgulho nacional, vítima das invasões francesas, da opressão dos militares ingleses e da ausência do rei no Brasil, fugido precisamente em resultado daquelas.
(em actualização...)
Estrutura externa
A peça é constituída por dois actos, que não estão divididos em cenas. Estas são sugeridas pelo movimento das luzes, que vão remetendo para espaços diferentes e dando conta da entrada e saída de personagens. Pode, contudo, tentar gizar-se quadros em que as personagens monologam ou dialogam, marcando as suas entradas ou saídas de cena.
Obra
● Narrativa:
● Teatro:
- estreia: Um Homem não chora (1960, Milão);
- Angústia para o Jantar (1961, Lisboa)
- Chuva na Areia (1982), adaptação televisiva de um romance que ficou inédito: Agarra o Verão, Guida, Agarra o Verão.
● Teatro:
- Felizmente há Luar! (1961), obra que obtém grande êxito e esgota rapidamente;
- Todos os Anos pela Primavera (1963, Lisboa);
- O Barão (1964, Lisboa) - adaptação teatral da novela com o mesmo nome, da autoria de Branquinho da Fonseca;
- Auto da Barca do Motor Fora de Borda (1966, Lisboa);
- Duas Peças em um Acto (1967, Lisboa);
- A Estátua (1966, Lisboa);
- A Guerra Santa (1966, Lisboa, prisão do Aljube - a sua publicação valeu-lhe mais seis meses de cárcere em Caxias);
- As Mãos de Abraão Zacut (1968 - escrita na prisão de Caxias);
- adaptação de A Relíquia de Eça de Queirós (1971, Lisboa);
- Sua Excelência (1971, Lisboa);
- E se for Rapariga chama-se Custódia (1978 - escrita na prisão do Aljube).
Destas peças, poucas foram representadas em Portugal antes do 25 de Abril, devido ao seu conteúdo crítico e ideológico. Após a publicação das peças A Estátua e A Guerra Santa, que criticavam a ditadura e a guerra colonial, foi preso pela PIDE em 1967.
● Jornalismo:
- colaborou com várias publicações (Diário de Lisboa, Almanaque, O Jornal, Se7e, Expresso, agências de publicidade);
- redacções da Guidinha (Lisboa, 1971 - O Jornal e Diário de Lisboa - suplemento «A Mosca»;
- escreveu também sobre gastronomia com o pseudónimo de Manuel Pedrosa, para O Jornal (Lisboa, década de 80).
● Prémios literários: Grande prémio de Teatro, em 1962, para a peça Felizmente há Luar!.
Vida
● NOME: Luís Infante de Lacerda Sttau Monteiro.
● NASCIMENTO: 3 de Abril de 1926, em Lisboa, na Rua Liverpool.
● FILIAÇÃO:
● ESTADA em LONDRES:
● FORMAÇÃO:
● PAIXÕES:
● CARACTERÍSTICAS:
não Chora, por exemplo);
-» Nikias Skapinakis, pintor que vivida escondido da PIDE numa casa de Sttau
Monteiro, incentivou-o à escrita de Felizmente há Luar!;
● MORTE: Lisboa, a 23 de Julho de 1993.
● ACTIVIDADES:
- correu no Team Cooper, ao lado de figuras lendárias como Stirling Moss;
- desistiu da actividade porque esta causava um grande desassossego à família.
● NASCIMENTO: 3 de Abril de 1926, em Lisboa, na Rua Liverpool.
● FILIAÇÃO:
- PAI: Armindo Monteiro, jurista e diplomata (embaixador);
- MÃE: Lúcia Rebelo Cancela Infante de Lacerda (descendente de D. Afonso Henriques?).
● ESTADA em LONDRES:
- partiu aos dez anos, acompanhando o pai, que aí desempenhou as funções de embaixador;
- aí conheceu a dura realidade da Segunda Guerra Mundial;
- a estada permitiu-lhe o contacto com movimentos de vanguarda da literatura anglo-saxónica, decisivos para a sua formação intelectual;
- regressou a Portugal em 1943, após a demissão do pai, ordenada por Salazar, em virtude das simpatias que nutria pelo governo inglês no contexto da guerra;
- manteve sempre uma ligação afectiva e um fascínio por Londres.
● FORMAÇÃO:
- Colégio de Santo Tirso (Lisboa), de onde foi expulso;
- Liceu Pedro Nunes (onde teve como colega João Pulido Valente e João Abel Manta);
- Licenciatura em Direito (apesar do gosto pela Matemática), na Faculdade de Direito de Lisboa.
● PAIXÕES:
- as corridas de automóveis (foi corredor de Fórmula 2 em Inglaterra);
- a pesca;
- a gastronomia;
- a literatura.
● CARACTERÍSTICAS:
- não gostava de ser conhecido;
- considerava Portugal um país demasiado pequeno e limitado ("Nunca encontrei nada em Portugal que não encontrasse melhor lá fora.");
- era profundamente religioso (encarava a morte como «apenas uma maneira de ir a Deus»);
- defendia as liberdades individuais e colectivas - o seu lema era «A única coisa sagrada é ser livre como o vento»;
- a sua relação com a escrita não era fácil e foi o estímulo dos que lhe eram mais próximos que o conduziu à produção literária e o conseguiu afastar da inércia que o levava a deixar inacabados vários manuscritos:
não Chora, por exemplo);
-» Nikias Skapinakis, pintor que vivida escondido da PIDE numa casa de Sttau
Monteiro, incentivou-o à escrita de Felizmente há Luar!;
- opositor do regime salazarista e preservando a liberdade como valor máximo, sofreu perseguições que culminaram com a sua detenção e prisão no Aljube, por alegado envolvimento na revolta de Beja;
- um dos traços da sua personalidade foi a dispersão e o desbaratar de um talento multiforme.
● MORTE: Lisboa, a 23 de Julho de 1993.
● ACTIVIDADES:
- Advocacia: exerceu a profissão apenas durante dois anos.
- Corridas de automóveis:
- correu no Team Cooper, ao lado de figuras lendárias como Stirling Moss;
- desistiu da actividade porque esta causava um grande desassossego à família.
domingo, 27 de fevereiro de 2011
Subscrever:
Mensagens
(
Atom
)