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sexta-feira, 15 de julho de 2022

A descoberta da Pedra da Roseta

     A escrita hieroglífica morreu no Egipto no século IV d.C. e com o tempo perdeu-se o conhecimento de como ler hieróglifos, até que a Pedra de Roseta foi descoberta, a 15 de julho de 1799. Com a mesma mensagem tanto em hieróglifos como em grego, a Pedra de Roseta foi a chave para decifrar hieróglifos anteriormente não traduzidos. De repente, três mil anos de escrita indecifrável tornaram-se legível.

    Em 1798, Napoleão zarpou rumo ao Egito com cerca de quatro centenas de navios: queria expulsar os ingleses do Mediterrâneo oriental e bloquear o seu lucrativo comércio com a Índia. Mas também estava fascinado com o próprio Egito, que o seu ídolo, Alexandre, o Grande, tinha conquistado 2000 mil anos antes. Porém, desiludiu-se, pois o Egito já não era a joia que tinha sido para Alexandre. Era um remanso de água quente, seco e pobre. "Nas aldeias", disse Napoleão, "eles nem sequer têm ideia do que são tesouras". Ainda assim, viam, a partir dos seus espantosos monumentos antigos – pirâmides e obeliscos perfurando as nuvens – e da sua estranha, indecifrável e bela língua-figurada, chamada hieróglifos, que esta tinha sido em tempos uma civilização formidável. Napoleão levou consigo cerca de cento e sessenta savants-cientistas, como lhes chamavam: estudiosos, e artistas, com as suas bússolas, réguas, lápis e canetas – para descrever o que podiam deste antigo reino lendário.


Vivant Denon, por Robert Lefevre
(1809)

    Entre eles encontrava-se Dominique Vivant Denon, que pode ser considerado o primeiro egiptólogo, embora fosse mais um artista. Um homem do mundo que frequentava os salões das diversas cortes europeias, juntou-se a Napoleão, já passava dos 50 anos de idade, para inventariar e desenhar os monumentos faraónicos descritos até então de forma fantasiosa.

    "Ao longo da campanha, Denon, indiferente aos perigos, madrugava para explorar monumentos e desenhar. Desenhava a cavalo, enquanto descansava, enquanto comia, no meio de uma batalha... registava tudo. O desenho de Denon é escrupulosamente fiel ao seu modelo, sem deformações poéticas. Fez um registo completo do que viu. Estima-se que gastou umas 40.000 folhas durante a viagem.

    Hoje algumas delas são de valor inestimável, porque são o único vestígio que resta de monumentos destruídos após a fuga de Napoleão – um exemplo disso é o desenho da capela de Amenhotep III em Elefantina." (Denon) A obra pioneira de Denon será completada, com o trabalho de eruditos de outras áreas na monumental Description de l'Egypte (1809-1822).



Frontispício da 1.ª edição de
Description de l'Egypte

    Os 1000 desenhos de Denon estão na origem da Egiptomania que tomou conta dos europeus nos séculos XIX e XX.

    Napoleão nomeou-o Diretor-Geral dos Museus e ele criou o Museu – mais tarde chamado Museu do Louvre – com as obras arrebanhadas pelo Império no Egito, Itália, Países Baixos, Alemanha e Espanha.

    "Em 1799, uma equipa a trabalhar sob um oficial francês para reconstruir um forte perto da cidade portuária de Rosetta – agora conhecida como Rashid – descobriu uma pedra tão grande que não a podia mover. Pierre-François Bouchard, um dos savants de Napoleão, treinado como cientista e como soldado, mandou que a retirassem inteira. Assim que a limparam, ele percebeu imediatamente a sua importância.

    Quando, dois anos mais tarde, os franceses finalmente se renderam aos britânicos, estes roubaram os roubos dos franceses como despojos de guerra – incluindo a Pedra de Roseta, que foi para o Museu Britânico."


A Porta Denon, do Louvre
    Vários estudiosos tentaram decifrar os hieróglifos da Pedra, mas foi Jean-François Champollion quem o conseguiu. Champollion cresceu no sudoeste de França, o mais novo de sete. O seu pai era livreiro; a sua mão não sabia ler nem escrever. Ele tinha pouco dinheiro. Já ia na meia-idade, já tinha, mais ou menos, fundado a Egyptologia, mas não tinha dinheiro para ir ao Egito. Foi mais tarde, depois da fama. desde muito cedo, tinha mostrado um dom extraordinário para as línguas. Ainda na adolescência, aprendeu não só grego e latim, mas também hebraico, árabe, amárico, sânscrito, siríaco, persa e caldeu. Começou a aprender Coptic, a língua da Igreja Ortodoxa Egípcia, que se pensava (corretamente, como se veio a verificar) ser descendente do Antigo Egito." [Pedra de Roseta]

Champollion encontrou alguma correspondência entre as imagens hieroglíficas e a representação gráfica dos sons, semelhante, mas não igual, ao que chamamos de letras. No seu estudo da Pedra de Roseta, descobriu grupos de sinais dentro de anéis chamados cartuchos. Teorizou que este relevo tipográfico era digno dos nomes de reis e descobriu que correspondia aproximadamente à altura em que estes foram citados no texto grego. Os dois nomes de reis que lhe deram a chave foram os de Ptolomeu e Cleópatra.

    Afinal o que diz a Pedra de Roseta? Nada de excitante.

    "Diz-nos que a pedra deveria ser instalada num muro do templo em honra do governante Ptolomeu V Epifanes Eucharistos e o seu propósito cerimonial é, presumivelmente, responsável pelo seu tom. O texto foi inscrito em 196 a.C., para celebrar a coroação de Ptolomeu. (Ele tinha-se tornado faraó cerca de nove anos antes, mas, como na altura tinha apenas cinco anos, uma série de regentes tratou inicialmente dos assuntos de Estado). Começa com uma longa invocação do rei:

    «O senhor do sagrado uraeus-cobras cujo poder é grande, que assegurou o Egito e o fez prosperar, cujo coração é piedoso para com os deuses, aquele que prevalece sobre o seu inimigo, que enriqueceu a vida do seu povo, senhor de jubileus como Ptah-Tanen [o deus de Memphis], rei como Pre [o deus Sol], governante das províncias superiores e inferiores, o filho dos deuses que amam o seu pai, que Ptah escolheu e a quem o Sol deu a vitória, a imagem viva de Amon, o filho do Sol, Ptolomeu, que vive para sempre, amado de Ptah, o deus cuja beneficência é perfeita.»


Fonte: IP AZUL

sexta-feira, 10 de junho de 2022

Resumo da Conclusão de Amor de Perdição


            No camarote, Simão lê a última carta que Teresa lhe escrevera, na qual esta se despede dele e lhe afirma que não é mais possível viver. Depois de ler a missiva, pede ao comandante da embarcação, que o acompanha juntamente com Mariana, que o deixe ir ao convés, onde se senta a contemplar o convento de Monchique.

            De madrugada, Simão adoece e arde em febre, tendo momentos de delírio. Após ser examinado a bordo, é-lhe diagnosticada febre maligna e aventada a possibilidade de morrer antes de chegar ao destino. Pede, então, a Mariana que, caso morra, todas as suas cartas sejam atiradas ao mar.

            A doença agrava-se: o fidalgo continua a delirar e cai numa letargia total, sinal de que o seu fim se aproxima. Efetivamente, nove dias depois, Simão morre. Mariana beija a sua face pela primeira vez.

            Quando os marinheiros se preparam para atirar o cadáver ao mar, Mariana prende as cartas de Simão à cintura. De seguida, quando o corpo é finalmente lançado à água, a filha de João da Cruz atira-se também, bracejando até abraçar o cadáver que a ondulação faz chegar até si. Morrem, assim, os dois juntos. A correspondência entre Simão e Teresa é recolhida pelos marujos que se lançaram à água, em vão, para tentar salvar Mariana.

            No último parágrafo da Conclusão, o narrador informa que Manuel Botelho, irmão de Simão, é opai do autor da obra.

Resumo do capítulo XX de Amor de Perdição


             No dia 17 de março de 1807, Simão sai da cadeia e embarca do Douro para a Índia, acompanhado por Mariana. O desembargador Mourão Mosqueira, que vai a bordo da nau, entrega um cartucho com moedas de ouro ao condenado, enviado por D. Rita Preciosa. Simão aceita, mas pede ao comandante que distribua o dinheiro pelos companheiros de degredo.

            O fidalgo pergunta a Mariana onde é o convento de Monchique e vai observá-lo. Avista o mirante onde está Teresa, cujo vulto vê.

            Na véspera, Teresa pedira os sacramentos e despedira-se das freiras, que tentaram dar-lhe alento. Ao início dessa manhã, a fidalga tinha lido todas as cartas que Simão lhe havia escrito, tinha-as atado com fitas de seda, envoltas em raminhos de flores e pedido depois à mendiga de Viseu que as fosse entregar ao seu amado. Pedira ainda à sua criada que a levasse ao mirante. Aí, quando vê Simão na nau, Teresa desfalece. Nesse momento, atraca na nau um bote com a mendiga, que lhe leva as cartas da sua amada.

            A nau parte e Simão contempla novamente o mirante, quando passa junto ao convento. Vê, então, Teresa, que lhe acena com um lenço, com os braços suspensos através das grades de ferro da janela. Simão responde ao aceno de Teresa, que é levada em braços e desaparece da sua vista. A nau é forçada a parar pouco depois, por isso a saída é adiada para o dia seguinte. Nessa noite, o comandante da nau dá ao condenado a notícia da morte de Teresa, que, antes de falecer, se despedira da vida da seguinte forma: “Adeus, Simão, até à eternidade!” O fidalgo afirma: “Eis-me livre… para a morte…”.

            O comandante promete proporcionar-lhe as melhores condições possíveis durante a sua estadia na Ásia. O condenado pede-lhe, então, que ampare Maria como sua irmã, caso ele morra. Na câmara do comandante, Simão e a filha do ferrador cismam na morte.

quinta-feira, 9 de junho de 2022

Provas de aferição 2021-2022: enunciados e critérios de classificação

 ● 2.º ano

        ▸ Educação Física - código 28:

                . Guião - Versão 1;

                . Guião - Versão 2;

                . Critérios de Classificação.

        ▸ Educação Artística - código 27:

                . Guiões - Versão 1:

                        - Guião 1;

                        - Guião 2;

                        - Guião do Aplicador.

                . Guiões - Versão 2:

                        - Guião 1;

                        - Guião 2;

                        - Guião do Aplicador.

                . Critérios de Classificação.


5.º ano

        ▸ Matemática e Ciências Naturais - código 58:

                . Prova;

                . Critérios de Classificação;

                . Prova adaptada;

                . Critérios de Classificação.

        ▸ Educação Visual e Educação Tecnológica - código 53:

                . Prova - Versão 1;

                . Prova - Versão 2;

                . Guião do Aplicador;

                . Critérios de Classificação.


8.º ano

        ▸ História e Geografia - código 87:

                . Prova;

                . Critérios de Classificação;

                . Prova adaptada;

                . Critérios de Classificação.

        ▸


INSTRUÇÕES DE REALIZAÇÃO, COTAÇÕES E CRITÉRIOS GERAIS DE CLASSIFICAÇÃO - EXAMES NACIONAIS 2021-2022

    Em baixo, apresentam-se as ligações que dão acesso às instruções de realização, cotações e critérios gerais de classificação das provas de exame nacional do ano letivo de 2021-2022.

 

Manuais de aplicação da componente oral

sábado, 4 de junho de 2022

A ação de O Delfim


             Antes de mais, convém distinguir entre ação e intriga. A primeira pode ser considerada como a sucessão de factos e acontecimentos em que as personagens participam, enquanto a segunda consiste na organização dos elementos narrativos, de modo a criar um enredo que se desenvolve segundo uma relação de causa-efeito.

            Feita a distinção, poderemos considerar que a intriga de O Delfim é uma história de adultério e de morte: o adultério de Maria das Mercês e Domingos e a morte de ambos. Esta história, porém, não é o motivo da narrativa. Note-se, por outro lado, que a versão oficial dos acontecimentos é conhecida somente pelo Regedor e pelo Padre Novo e nunca é divulgada, pois há a tendência para considerar o oficial como sinónimo de verdadeiro, e não é a verdade o que Cardoso Pires pretende esclarecer com a sua obra.

            Se se estabelecesse uma verdade, o leitor tranquilizar-se-ia, prestando talvez menos atenção aos factos, aparentemente secundários, que envolvem a ação. Note-se, todavia, que é precisamente nesse segundo plano da narrativa que se encontra a ação principal. Qual é ela? A decadência do regime feudal imposto pela personagem Palma Bravo e a consequente transição do simbólico poder da lagoa para os Noventa e oito. É essa a ação principal do livro.

Explicação do título de O Delfim


            O nome «delfim» pode significar várias coisas:

• animal da família dos golfinhos;

• filho varão;

• senhor feudal da França; Luís XV;

• peça do jogo de xadrez: bispo.

            Para compreendermos o seu significado, temos também de prestar atenção às palavras do próprio narrador da obra, que nos diz o seguinte: “Depois, se quisesse escrever, passaria apenas o dedo na capa encarquilhada do livro que o acompanha (ou numa tábua de relíquia, ou numa pedra) e sulcaria o pó com esta palavra: Delfim. Seria uma dedicatória. Um epitáfio, também. Seis letras que, de qualquer maneira, não teriam mais do que a justa e exata duração que a poeira consentisse até as cobrir de novo.”

            A partir do excerto, podemos concluir que o título da obra é «pó que ao pó há de voltar”, é dedicatória e epitáfio que se resume a seis letras.

            Por outro lado, o título é profundamente irónico, dado que o termo «delfim» remete para a ideia de uma personagem que é uma espécie de príncipe, mas uma pessoa podre por dentro, isto é, com uma aparência exterior esplendorosa, mas a apodrecer por dentro. O «delfim» é um engenheiro, uma espécie de latifundiário parasita, um «playboy» que passeia o seu automóvel de marca, que é muito rico e sustentado pelo regime, mantendo, por exemplo, os seus trabalhadores reprimidos. Em suma, a obra coloca-nos perante o retrato de uma pessoa que, no fundo, é um país: Portugal.

quarta-feira, 1 de junho de 2022

Quando surgiram as línguas?


             A resposta é óbvia: não sabemos. Certamente, não foi algo imediato, antes um processo gradual que levou milhares ou milhões de anos. O que sabemos é que todos os animais comunicam entre si, incluindo os irracionais, embora as formas de comunicação humanas sejam especiais. Por exemplo, os seres humanos comunicam quando choram ou coram, isto é, sem soltar um som que seja.

            As línguas humanas têm características muito específicas: não estão inscritas nos genes, são extremamente flexíveis, adaptam-se facilmente a novas realidades (todos os dias surgem novas palavras para designar algo novo que surge), permitem falar do passado e do futuro (note-se como podemo-nos referir ao futuro sem usar o respetivo tempo verbal; é possível fazê-lo – e fazemo-lo – usando o presente: “Volto amanhã.” = “Voltarei amanhã.”), despertam e interferem com a imaginação. Por outro lado, as línguas humanas fazem uso da chamada dupla articulação, ou seja, um conjunto limitado de sons conjuga-se para criar unidades com significado.

            No seu sítio Certas Palavras (www.certaspalavras.pt), o professor Marco Neves, perante a total falta de dados que nos permitam saber como surgiu a linguagem humana, imagina uma história explicativa do processo.

            De acordo com essa explicação, a linguagem teria tido origem em sons que o Homem usava em certas situações de forma instintiva ou na imitação de animais e que, a partir de certo momento, conseguiu desligar o símbolo do seu significado. E prossegue nos seguintes termos: “Imaginemos um grupo de seres humanos, na savana, a caçar. Um deles vê, à frente, uma gazela. Habitualmente, usam um som dito em surdina, para que todos reparem. Com o tempo, encontram vários sons para diferentes animais. Estamos perante sinais, que vão sendo aprendidos pelas novas gerações. Estes sinais, a certa altura, começam a ser usados noutros contextos, para «conversar» sobre os animais. Nascem as palavras. Um som poderia representar um tigre, mas também pode ter passado a significar um animal, usando-se outro som (ou uma conjugação de sons) para representar o tigre em si. Alguém, à noite, refere vários tigres, usando, provavelmente, uma duplicação dos sons usados para se referirem àquele animal.

            Com o tempo, ganham-se hábitos de ordenação desses símbolos sonoros – seria possível dizer «gazela» «caçar» «eu», mas nunca «eu» «caçar» «gazela». Nasce a gramática. A língua é criada a partir de necessidades práticas, ganha características gramaticais particulares, que mais não são do que a cristalização de hábitos linguísticos adquiridos sem grande lógica, e conhecer essas características (essa gramática) torna-se essencial para viver na comunidade que usa essa língua. Quem falava para caçar também era capaz de falar para impressionar a vizinha – e se não fizesse, teria menos hipóteses de ter filhos com a vizinha.

            As línguas são sistemas simbólicos muito complexas, com base em sons ou gestos. Com esses símbolos, comunicamos e criamos pensamentos na cabeça dos outros (obrigamo-los a pensar em tigres). Trabalhamos a pensar em conjunto, nem que seja para saber como caçar o tigre – ou atacar a tribo do lado. Quanto mais o cérebro aumentava, mais capacidade tínhamos para manipular símbolos.”

            […]

            Imaginemos, por exemplo, um conjunto de arbustos que precisam de ter exposição ao sol para sobreviver. Ora, se um arbusto em particular sofre uma mutação no seu ADN que o torna ligeiramente mais alto e com mais folhas no topo, vai conseguir receber mais luz do sol e, ao mesmo tempo, vai impedir que os arbustos do lado recebam tanta luz. Vai viver mais e reproduzir-se mais. Em breve, […], os genes deste arbusto vão começar a espalhar-se mais do que os arbustos um pouco mais baixos. Os arbustos mais baixos passam a ter uma desvantagem que não existia antes. Os arbustos com mutações que os tornam mais altos ganham. O gene que leva a uma maior altura começa a ser preponderante – e assim surgem as árvores. Todos os arbustos viviam felizes e contentes antes desta guerra. Não há uma vantagem inerente à maior altura: a única vantagem é conseguir ganhar aos arbustos do lado.”

            No caso do ser humano, o uso do símbolo permitia o ganha de vantagens relativamente a quem não o domina, pois permite perceber melhor os outros, ganhar mais poder, ser bem-visto, seduzir.

            A linguagem não é essencial para a sobrevivência do ser humano, como o prova o facto de a humanidade ter vivido e evoluído ao longo de milhares de anos sem ter uma linguagem como a entendemos hoje. Assim sendo, qual terá sido a razão que fez com que se tornasse tão preponderante? O professor Marco Neves responde: “Há duas grandes correntes. Alguns linguistas sublinham que a linguagem é uma ferramenta cultural, inventada ao longo da nossa História. No fundo, o uso da linguagem será como a roda: uma vez inventada, tornou-se tão útil que ninguém a dispensa. Mas não nascemos – segundo esta perspetiva – com algum tipo de mecanismo linguístico impresso no cérebro. Outros linguistas sublinham o caráter biológico da linguagem: temos aparelhos fonadores e cérebros adaptados ao uso da linguagem – as nossas gargantas seriam diferentes se não fosse a necessidade de falar.” Assim sendo, é lícito concluir que a linguagem humana é um facto cultural e biológico.

            Para se adaptar à nova necessidade que era a linguagem, tudo no ser humano evoluiu: o corpo em geral, o cérebro, o aparelho fonador, a boca, a garganta. Aprender a falar é algo natural ao ser humano, como é caminhar, ao contrário do que sucede com outras competências, como, por exemplo, a leitura ou a escrita. Por exemplo, uma criança de 3 ou 4 anos não necessita que os adultos a ensinem a falar; basta a convivência diária para que ela aquira e desenvolva essa competência. Porém, o mesmo não sucede com a leitura. Se dermos a essa mesma criança um livro, não conseguirá lê-lo sozinha, sem ajuda, sem quem a ensine.

            Embora não existam certezas, é possível que, há cerca de 40 000 anos, os seres humanos já falassem línguas com características semelhantes às que hoje possuímos. No entanto, há indícios que sugerem que a linguagem humana já existia na era do Homo erectus, que surgiu há 2 000 000 de anos, conseguiu controlar e usar o fogo, se expandiu por um território vastíssimo e navegou até ilhas tão afastadas no mar que tal empresa implicou um grau acentuado de organização e comunicação, bem como o uso de embarcações com algum alcance e robustez. Em 2004, descobriram-se na Ilha das Flores, na Indonésia, ferramentas que datam de há 800 000 anos. Daniel Everett, na sua obra How Language Began, sustenta que o Homo erectus já falaria um tipo de língua simbólica algo parecida com a nossa. Dado que a ilha já na época distava muito de terra continental, certamente foi necessário construir barcos que levassem seres humanos até lá, sendo difícil imaginar que tudo teria sido feito sem o uso da fala.

            Deste modo, é possível que pelo menos há 40 mil anos já existissem línguas na Terra com características parecidas às das atuais, sendo que há quem alargue o período de surgimento das mesmas até há cerca de dois milhões de anos.

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