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segunda-feira, 18 de novembro de 2019

Origem e evolução do conceito de Romantismo

            A palavra romantismo, tal como o adjetivo «romântico», é usado habitualmente para designar um tipo de sensibilidade. Quando se afirma que determinada pessoa é «romântica», queremos dizer que é sentimental, idealista, propensa ao devaneio, revelando por vezes um sentido pouco prático da realidade. O mesmo se diz de um local ou de uma cena que leva ao despertar do sonho, do sentimento, da emoção.
            Neste caso concreto, estamos a falar de um período literário e artístico que se iniciou nos finais do século XVIII, em oposição ao Classicismo, e constitui uma viragem na conceção de arte de da própria vida.

            O vocábulo "romântico", tal como "barroco" ou "clássico", apresenta uma história complexa. Do advérbio latino romanice, que significava «à maneira dos romanos», derivou em francês o vocábulo romanz, que evoluiu para a forma rommant depois do século XII e roman a partir do século XVII. A palavra rommant designou primeiramente a língua vulgar, por oposição ao latim, tendo vindo depois a designar também uma certa espécie de composição literária escrita em língua vulgar, em verso ou em prosa, cujos temas consistiam em complicadas aventuras heróicas ou corteses.
           No século XVII, surgiu o adjectivo inglês romantic a significar «como os antigos romances», podendo qualificar uma paisagem, uma cena ou um monumento, ou podendo oferecer um significado estético-literário.
           Não admira que na atmosfera racionalista que envolve a cultura europeia desde os finais do século XVII, o vocábulo romantic passe a significar quimérico, ridículo, absurdo – qualidades (ou defeitos) que se atribuíram precisamente aos romances e poemas romanescos, quer na literatura medieval, quer de Ariosto (poeta italiano – 1474-1533 –, autor de Orlando Furioso), de Boiardo (poeta italiano – 1441-1494), etc. Tal como "gótico", romântico designa, na época do Iluminismo, tudo o que é produzido pela imaginação desordenada, aquilo que é inacreditável e que reflecte um gosto artístico irregular e mal esclarecido.
           No entanto, a par deste significado pejorativo, a palavra oferece no século XVIII um outro sentido: à medida que a imaginação adquire importância e à medida que se desenvolvem formas novas de sensibilidade, romantic passa a designar o que agrada à imaginação, o que desperta o sonho e a comoção da alma, aplicando-se às montanhas, às florestas, aos castelos, etc. Nesta acepção – que, como foi dito acima, já remonta ao século XVII –, foi-se desvanecendo a afinidade do vocábulo com o género literário do romance, tendo vindo romantic a exprimir sobretudo os aspectos melancólicos e selvagens da natureza.
           O vocábulo inglês romantic era vertido para francês ora por romanesque, ora por pittoresque. Em 1776, porém, Letourneur, no prefácio da sua tradução da obra de Shakespeare, distingue romantique de romanesque e de pitoresque, analisando os respectivos matizes semânticos e expondo os motivos que levaram a preferir romantique, «palavra inglesa»: o vocábulo, segundo Letourneur, «encerra a ideia dos elementos associados de uma maneira nova e variada, própria para espantar os sentidos», evocando, além disso, o sentimento de terna emoção que se apodera da alma perante uma paisagem, um monumento, uma cena, etc. Em 1777, o marquês de Girardin, na sua obra De la composition des paysages, usa igualmente o adjectivo romantique, mas a palavra adquire definitivamente direito de cidadania na língua francesa, quando Rousseau, num passo famoso das suas Rêveries d'un promeneur solitaire, escreve que «as margens do lago de Bienne são mais selvagens e românticas do que as do lago de Genebra»; ou seja, estabelece a distinção entre “romantique” (romântico) e “romanesque” (romance). Através do francês, o vocábulo penetrou depois noutras línguas, como o espanhol e o português.
           Voltemos, todavia, ao significado literário da palavra romântico, que, como ficou acima exposto, está já documentado no século XVII. O vocábulo romantic reaparece, com um sentido similar ao que apresenta no texto já mencionado de Rymer, na History of english poetry (1774) de Thomas Warton, cuja introdução se intitula «The origin of romantic fiction in Europe». Para Warton, o termo romantic designa a literatura medieval e parte da literatura que se afasta da literatura renascentista (Ariosto, Tasso, Spenser), isto é, uma literatura que se afasta das normas e convenções vigentes na literatura greco-latina e no neoclassicismo.
            A par deste conceito, aparece também, no início do século XIX, um conceito tipológico de romantismo, corporizado principalmente na oposição clássico-romântico. Goethe reivindicou a paternidade desta famigerada distinção, mas foi indubitavelmente August Wilhelm Schlegel quem, inspirando-se em boa parte na oposição estabelecida por Schiller entre poesia ingénua e poesia sentimental, elaborou a mais sistemática e mais influente exposição sobre as diferenças existentes entre a arte clássica e a arte romântica. Na décima terceira lição do seu Curso de literatura dramática, Schlegel caracteriza a arte clássica como uma arte que exclui todas as antinomias, ao contrário da arte romântica, que se compraz na simbiose dos géneros e dos elementos heterogéneos: natureza e arte, poesia e prosa, ideias abstractas e sensações concretas, terrestre e divino, etc.; a arte antiga é uma espécie de «nomos rítmico, uma revelação harmoniosa e regular da legislação – fixada para sempre – de um mundo ideal em que se reflectem os arquétipos eternos das coisas», ao passo que a poesia romântica «é expressão de uma misteriosa e secreta aspiração pelo Caos incessantemente agitado a fim de gerar novas e maravilhosas coisas»; a inspiração da arte clássica era simples e clara, diferentemente do génio romântico que, «apesar do seu aspecto fragmentário e da sua desordem aparente, está contudo mais perto do mistério do universo, porque, se a inteligência jamais pode apreender em cada coisa isolada senão uma parte da verdade, o sentimento, em contrapartida, ao abranger todas as coisas, compreende tudo e em tudo penetra». De igual modo, ainda durante o séc. XIX, Mme de Stäel (autora alemã, casada com um cidadão francês) estabelece semelhante distinção entre “Romântico” e “Clássico”.

           Nas literaturas espanhola e portuguesa, aparecem os primeiros grupos românticos durante a terceira década do século XIX (Garrett, Herculano, etc.), concomitantemente com a instauração de regimes liberais nos dois países da Península Ibérica e com o regresso de exilados que, na França e na Inglaterra, haviam conhecido as novas tendências estético-literárias.
Aguiar e Silva, Vítor Manuel de, TEORIA DA LITERATURA, 4.ª edição, Coimbra, Livraria Almedina, 1982


segunda-feira, 11 de novembro de 2019

Carta a Adolfo Casais Monteiro sobre a génese dos heterónimos


Carta a Adolfo Casais Monteiro

1. A partir da leitura da carta de Fernando Pessoa a Adolfo Casais Monteiro, complete o esquema apresentado.

Heterónimos
Fernando Pessoa
Alberto Caeiro
Ricardo Reis
Álvaro de Campos
Nascimento
(local e data)
. 1888
. Lisboa
.
.
. morreu em
.
.
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Formação académica
. Durban High School
. Frequência do Curso Superior de Letras de Lisboa
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Profissão
. Tradutor
. Escritor
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Características físicas
. Estatura média
. Cabelo preto
. Bigode
. 1, 73 m (mede menos 2 cm do que Álvaro de Campos)
.
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Características da escrita
. Escreve bem o inglês e o português
.
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Obra
. Mensagem
. Escritos diversos
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.
Surgimento
. Poesia e escritos diversos
.
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2. Assinale as opções verdadeiras (V) ou falsas, de acordo com o texto.
a) Fernando Pessoa afirma na carta que a tendência para criar seres imaginários começou na infância. _____
b) O mundo ficcionado é radicalmente diferente do mundo real. _____
c) Com o passar do tempo, os amigos inventados desapareceram todos da memória do seu criador. _____
d) Pessoa não tem a certeza absoluta de que foi em 1912 que esboçou Ricardo Reis. _____
e) Na noite em que afirma ter criado os três heterónimos, Pessoa não conseguiu escrever em seu próprio nome. _____
f) Os heterónimos foram criados em relação uns com os outros. _____
g) Alberto Caeiro impôs-se naturalmente como Mestre do seu criador. _____
h) Álvaro de Campos foi uma criação inspirada em Ricardo Reis. _____
i) Segundo Fernando Pessoa, ainda prevalece a sensação de autonomização dos heterónimos que sentiu quando os criou. _____
j) Fernando Pessoa inventou uma fisionomia e uma biografia para cada um dos heterónimos. _____
k) Fernando Pessoa explica ser sempre racional a vontade que o leva a escrever em nome de um ou outro heterónimo. _____
l) Bernardo Soares é um semi-heterónimo que, segundo Pessoa, tem semelhanças com Alberto Caeiro e com o próprio Pessoa. _____
m) Pessoa afirma que lhe é mais fácil escrever poesia do que prosa, em nome dos heterónimos. _____

2.1. Corrija as afirmações falsas.

sábado, 9 de novembro de 2019

Os vícios dos peixes em particular

Capítulo V

Peixe
Roncador
Repreensões
. É pequeno, mas quer parecer grande, por isso ronca muito.
Argumentação
. Quer parecer maior e mais importante do que aquilo que é;
. quando tem de agir, acobarda-se.
Exemplos - Confirmação
. S. Pedro: afirmou estar disposto a morrer por Cristo, mas negou-o; prometeu ficar acordado e vigilante, mas adormeceu durante a vigia;
. Golias: soldado gigante filisteu, que muito se gabava da sua invencibilidade, mas foi vencido por um pequeno pastor, David, com um cajado e uma funda;
. Caifás: roncava de saber;
. Pilatos: roncava de poder.
Castigo
. Deus abate e humilha os que roncam.
Alegoria
. Presunção, arrogância, soberba e orgulho.
Provérbio
. “Presunção e água benta, cada um toma a que quer.”
. “As obras falam, as palavras calam.”
Atualidade/
Anacronismo
. Atualidade: figuras públicas, políticos…
Contraste com S. António
. “o verdadeiro conselho é calar, e imitar a S. António”;
. tinha muito saber e poder, mas não se vangloriava disso.

Peixe
Pegador
Repreensões
. Pequeno, pega-se ao maior;
. vive do maior de forma parasitária.
Argumentação
. Vive como parasita, alimentando-se e fazendo-se carregar pelo peixe maior;
. se algum dos peixes maiores morre, o pegador morre com ele.
Semelhanças com os homens
. Aprendeu o seu estilo de vida com os homens, nomeadamente os portugueses;
. os mais inteligentes despegam-se dos peixes maiores e continuam a sua vida; os mais ignorantes têm o mesmo fim dos maiores.
Exemplos - Confirmação
. Bajuladores dos poderosos, como o vice-rei ou o governador;
. Herodes: quando morreu, morreram com ele todos os seus pegadores;
. Tubarão: tem os seus pegadores que, quando morre, morrem com ele;
. Pegadores de Deus (David e S. António);
. Adão e Eva: comeram o fruto proibido e conduziram todos os humanos à mortalidade.
Alegoria
. Parasitismo, oportunismo e preguiça.
Provérbio
. “Anda meio mundo a enganar outro.”
. “Amigo disfarçado, amigo dobrado.”
Atualidade/
Anacronismo
. Atualidade: comitivas políticas; “amigos interesseiros; cargos políticos ou administrativos…
Contraste com S. António
. “António também se fez Menor, para se pegar mais a Deus” = Santo António “pegou-se” a Cristo, seguindo as suas palavras, a sua doutrina.

Peixe
Voador
Repreensões
. Usa os seus dotes naturais para se exibir;
. é peixe, mas também quer ser ave;
. possui grandes barbatanas e salta para fora da água como se voasse.
Argumentação
. Sendo peixe, quer ser ave;
. por isso, sofre os perigos dos dois elementos, o que o leva à morte.
Exemplos - Confirmação
. Simão Mago: ambicionava subir ao céu, fingindo ser filho de Deus, avisou toda a gente de Roma para que o admirassem e voou muito alto, mas caiu e morreu perante o olhar de todos;
. Ícaro: voou com asas de cera, mas foi demasiadamente ambicioso e aproximou-se do Sol; a cera derreteu e ele caiu no mar, morrendo.
Alegoria
. Ambição, vaidade, ostentação, presunção.
Provérbio
. “Quem tudo quer tudo perde”.
. “Quanto mais alto se sobe, maior é a queda.”
Atualidade/
Anacronismo
. Atualidade: pessoas que não olham a meios para atingir os fins; pessoas que vivem acima das suas posses…
Contraste com S. António
. “Não estendeu as asas para subir, encolheu-as para descer.”
. Foram-lhe dadas duas asas (a sabedoria natural e o poder da palavra), mas ele usou-as com humildade e comedimento e não com vaidade e ambição.

Peixe
Polvo
Repreensões
. Usa as suas defesas para trair as suas presas.
Argumentação
. Parece brando inofensivo;
. no entanto, ataca as suas vítimas de forma traiçoeira e sem escrúpulos.
Exemplos - Confirmação
. Judas, o símbolo da traição entre os homens, é menos traidor do que o polvo;
. Camaleão: muda de cor por «gala», por solenidade; é um artifício de defesa;
. Proteu: metamorfoseia-se por defesa, para escapar dos que o perseguem
Alegoria
. Traição, falsidade.
Provérbio
. “Trair e comer é só começar.”
. “Obra de vilão, deitar pedra e esconder a mão.”
Atualidade/
Anacronismo
. Todos os que parecem honestos e de confiança, mas são falsos.
Contraste com S. António
. “Mas ponde os olhos em António vosso Pregador, e vereis nele o mais puro exemplar da candura, da sinceridade, e da verdade, onde nunca houve dolo, fingimento ou engano.”


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