Português

quarta-feira, 13 de agosto de 2025

Resumo do conto "O Eremita"

    O conto "O Eremita" narra a odisseia de um professor, conhecido comumente por Toninho, diminutivo de António, que decide abandonar a profissão e a vida agitada para viver isolado no meio dos montes, procurando uma existência mais autêntica. Deste modo, instala-se num pequeno casebre que herdara e que reconstruíra, com a ajuda da comunidade, e passa a levar uma vida simples, criando alguns animais e deslocando-se periodicamente à aldeia.
    Um jornalista,  curioso com a notícia da mudança radical de vida do ex-professor, vai ao seu encontro, guiado por Ti Augusto, um habitante local. No entanto, ao chegarem junto do casebre reconstruído, não encontram Toninho. Curioso, o jornalista decide espreitar o interior da habitação. E cima da mesa, encontra uma edição de D. Quixote aberta numa página onde se destaca uma citação sobre a liberdade, o que esclarece o motivo e o sentido da escolha do antigo professor.
    O conto termina com o jornalista e Ti Augusto deixando o local, acompanhados pelo som distante de Platão, o mastim fiel que acompanhava sempre o «eremita». O primeiro pede ao segundo que lhe conte histórias de contrabando, parecendo considerar que a narrativa em torno da opção de Toninho não teria o impacto esperado. Afinal, em vez de uma história fabulosa com um desenvolvimento do arco da velha, encontrou «apenas» uma história de liberdade. 

Resumo do conto "No limiar da vida"

    Um homem entra num café, senta-se sozinho e começa a folhear um jornal de trás para a frente, observando casualmente o ambiente e uma empregada apressada. Enquanto lê o periódico, depara com um texto sobre o escritor José Cardoso Pires.
    Noutra página de jornal, encontra fotografias a preto e branco, e uma delas desperta a sua atenção em particular: ele reconhece nela uma mulher que conheceu, o seu rosto, o olhar, o sorriso e até o perfume. Essa imagem desperta-lhe memórias da juventude, como, por exemplo, a primeira vez que a viu de minissaia, o primeiro "olá", o primeiro sorriso. A emoção que essas recordações lhe trazem é tão intensa que lágrimas escorrem pela face e caem sobre a página, borrando a fotografia.
    A empregada passa novamente perto de si e o homem descobre uma semelhança desconcertante entre ela e a figura da fotografia, incluindo o perfume. Ao regressar à leitura do jornal, encontra na secção de "fait-divers" uma notícia sobre um fotógrafo que, na sequência de um acidente rodoviário ocorrido há três anos, permanecia em estado vegetativo, sendo a esposa a única sobrevivente ilesa. O homem compreende então que a mulher da notícia era a da fotografia e que ele mesmo era o fotógrafo.
    Voltando à página da necrologia, vê que a imagem da figura feminina tinha desaparecido. De seguida, sorri, dá a mão à mulher que sempre estivera ali e acorda.

Resumo do conto "O caçador"

    A narrativa acompanha João durante uma caçada, sempre cauteloso, atento ao ambiente e seguindo o cão Farrusco, que fareja o rasto de uma presa. Em determinado momento, o animal indica a presença de uma lebre, todavia o protagonista recorda um episódio anterior em que falhou dois tiros, algo incomum para ele, tido como um excelente atirador. Ti Ventura demonstra toda a sua incredulidade por João ter deixado a lebre escapar nessa ocasião.
    Ele explica que falhara o primeiro tiro para não atingir o cão, que cruzava a linha de fogo no momento em que se preparava para disparar. Ti Ventura, satisfeito com a explicação, reconhece que o caçador não erraria de outra forma.
    Regressando à caçada presente, João aproxima-se silenciosamente, posiciona-se e, num momento preciso, surgem duas lebres em simultâneo. Ele dispara rapidamente dois tiros quase simultâneos, abatendo ambas. O conto encerra com Farrusco alcançando os animais já imóveis, confirmando o êxito do caçador.

Resumo do conto "Perseguição"

    O título do conto retrata a sua ação: a fuga de um contrabandista durante a noite, envolta num ambiente de tensão e mistério.
    O texto abre com a descrição do grupo movimentando-se como sombras, silenciosas e cautelosas, até o amanhecer. Dada a atividade a que se dedicam, a luz do dia é vista como inimiga. Em determinado momento, o grupo é surpreendido por um ruído suspeito, um reflexo da presença nas imediações de um guarda civil, um carabineiro. A perseguição inicia-se: o contrabandista corre pelos campos e procura esconder-se, passando despercebido entre trabalhadores rurais.
    Durante a espécie de caçada, ocorrem diálogos tensos em português e espanhol, o guarda ordena-lhe que o contrabandista largue a carga e se entregue. Perante a sua resistência e obstinação, são disparadas rajadas de metralhadora e um cão que acompanha os policiais ataca-o ferozmente, até ser controlado pelo dono. Mesmo acossado desta maneira, o contrabandista consegue criara distrações, atravessar a fronteira e manter distância dos perseguidores, até chegar junto de um povoado e, numa jogada astuta, grita por ajuda aos guardas-fiscais portugueses, confundindo os carabineiros. Estes, surpreendidos pela atitude e sem a compreender, ficam a pensar no caso, enquanto o contrabandista desaparece.
    O final do texto retoma o seu início: há quem diga que se transformou em fantasma, desaparecendo sem deixar rasto, e que os carabineiros sentiram um silêncio ameaçador, como o voo de um dragão invisível prestes a roubar-lhes a alma e a identidade.

domingo, 10 de agosto de 2025

A expulsão contemporânea do Paraíso

Mohr


    O cartune de Burkhard Mohr, intitulado Expulsion from paradise (publicado a 5 de agosto de 2025), funciona como uma alegoria sobre a catástrofe ambiental contemporânea e a insuficiência das respostas políticas para o problema. Numa primeira apreciação, vemos as figuras bíblicas de Adão e Eva, nuas e enquadradas no contexto da iconografia clássica, viajando numa jangada minúscula que ainda sustenta uma árvore verde. No lado oposto, irrompe uma massa avassaladora de detritos, uma onda onde a palavra PLASTIC (plástico) se impõe em letras maiúsculas e onde um documento intitulado AGREEMENT (Acordo) é engolido e rasgado. A referência bíblica estabelece de imediato um enquadramento moral e mítico (queda, perda do paraíso), enquanto os objetos quotidianos que compõem a onda, concretamente os copos, as garrafas, os talheres e os sacos, mostram que o “pecado” moderno não é metafísico, mas material e social.
    A jangada é desenhada com traço firme mas económico; ela é frágil, feita de troncos, e a árvore é pequena, o que sugere que o “paraíso” remanescente é mínimo e vulnerável. Em contraste, a massa de plástico é desenhada com maior densidade de sinais: traços soltos, rasgos, objetos reconhecíveis sobrepostos, uma coloração que mistura amarelo e verde doentio, e até um núcleo quase negro, um buraco voraz que confere à onda uma qualidade de máquina devoradora. A tipografia manual de PLASTIC, dispersa no interior da massa, converte o material em força discursiva; não se trata apenas de lixo, mas de um sujeito-agente que age sobre o mundo.
    Da boca de Adão sai um balão que contém uma fala sua: “The apple tasted good anyway!”. Ela constitui simultaneamente uma ironia e uma crítica mordaz: ironia, porque reduz o drama à satisfação imediata; crítica, porque salienta a lógica que sustenta a crise, isto é, o prazer momentâneo, o consumo imediato, a dissonância cognitiva perante consequências coletivas. Ao remeter explicitamente para o fruto que originou a expulsão bíblica, a frase transforma o plástico numa espécie de novo “fruto proibido”: agradável, conveniente, mas letal a longo prazo. Há aqui uma crítica dupla: ao indivíduo hedonista que prefere o prazer imediato e aos sistemas que transformam esse prazer em hábito de massa (indústria do descartável, publicidade, infraestruturas que normalizam o uso único).
    A folha de papel contendo a palavra “AGREEMENT”, presa à onda prenhe de lixo por uma espécie de pionés, configura uma denúncia do consumismo, bem como da forma como as pessoas poluem o ambiente. Por outro lado, a inscrição do cartune no contexto de uma conferência da ONU realizada em Genebra sobre a poluição por plástico, explicitada na legenda, convida o leitor a ver o acordo como algo que existe, se negoceia, porém, na prática, é impotente diante do comportamento quotidiano das pessoas. A imagem sugere que os compromissos são frágeis, ou seja, não passam de pedaços de papel arrastados por lógica económica que os supera. Além disso, a hiperbolização do tamanho da onda face à pequenez humana dramatiza a assimetria de poder entre sistemas (indústrias, cadeias de consumo, ecossistemas) e indivíduos. Outra leitura crítica possível gira em torno de um certo fatalismo. A imagem da onda inexorável e a folha do AGREEMENT a ser arrastada podem gerar uma sensação de desesperança: se até os acordos se rasgam, que eficácia cabe à ação política?
    Em suma, Expulsion from paradise é um cartune que condensa uma denúncia complexa em imagens nítidas e memoráveis: converte o plástico em personagem e em agente destruidor, transforma acordos em papel inútil e usa o mito de Adão e Eva para sublinhar uma perda histórica e comportamentos que condenam o ambiente terrestre.

sábado, 9 de agosto de 2025

Resumo do conto "Mantença inteira"

    O conto gira em torno de Maneca Gouveia, um homem de origens humildes, mas muito perspicaz e dotado de humor refinado. O seu discurso está recheado de frases espirituosas e ditos memoráveis, como os seguintes: "Enchei a barriga, nem que seja de ramalhos, pois o gosto só está na boca."; "Com o vinho, os homens não perdem o juízo, perdem é a vergonha.".
    Maneca era conhecido entre familiares e amigos pelos chistes inesperados e pela subtileza do humor, muitas vezes subversivo e irónico. Em determinado momento, após perder dinheiro apostado na ceifa, ele observa um frasco que a mulher guardava e, sem mais nem menos, quebra-o intencionalmente contra uma laje. Uma das atividades centrais entre os povos da raia é o contrabando, bem como a travessia clandestina de pessoas para o outro lado da fronteira, as quais exigem perícia e ludíbrio das autoridades, muitas vezes através do suborno, que lhes abre portas e sustenta a sua reputação. As cargas de contrabando mencionadas no texto são de café, pesando cada saco quatro arrobas, armazenados e escondidos, prontos para serem transportados de modo sigiloso pelas estradas ou trilhos que evitam a fiscalização dos polícias.
    Maneca anuncia que vai partir para Pitorino, também chamado Ituero de Azaba, um povoado vizinho em Castela, junto à ribeira Azaba. Ele e a esposa deslocam-se para lá uma vez por ano, por alturas de novembro, regressando após as primeiras neves, perto do Natal, fixando-se numa casinha alugada por algumas pesetas, onde oferecem serviços de calçado aos habitantes locais. O seu ofício de artesão (tamanqueiro) começa com o corte do couro, usando moldes de cartão, e a montagem com pregos de cabeça chata num bastão de amieiro, formando o "cabeçal", recortado em "quadras de Lua". Ele trabalha sem ferramentas sofisticadas, socorrendo-se apenas de tesoura, cutelo, navalha, martelo e um banco. Durante diversos dias, do nascer ao pôr do sol, fabrica tamancos sem parar, pressionado pelas solicitações da população, que exigia novos pares para a festa de Santa Bárbara.
    No dia 5 de dezembro, data da festividade, homens e mulheres têm os seus tamancos prontos. O tamanqueiro, seguindo o costume, acorda cedo com o som dos foguetes anunciando o início da festa. Depois da missa, dirigem-se ao adro e assistem à arrematação dos roscones, após o que o povo se dispersa: os homens vão à taberna e as mulheres voltam ao seu universo doméstico. À tarde, Gouveia e o amigo Martín encontram-se na venda do Constantino, entretendo-se até à chegada da noite. Após o último trago e já saciados, o espanhol convida o tamanqueiro para sua casa. Aí, Martín acolhe-o junto ao lume, oferece-lhe um barranhão de tremoços e diz-lhe que o lume é "meia mantença".
    Gouveia e a mulher regressam a casa, não sem antes convidar Martín a visitá-lo por alturas do Santo António. Depois de assistirem à tourada, já de noite e com o frio a apertar, vão para casa de tamanqueiro. Lá, este acende o lume da lareira e, de propósito, acende também um segundo lume na cozinha. De seguida, oferece a Martín um barranhão de tremoços, repetindo a frase, adaptada, que o amigo lhe tinha dito quando o recebera em casa: "Coge tchotchos, amigo Martín!... que una lumbre es media mantenza, pero dos son mantenza entera!". Ou seja, o tamanqueiro acrescentara ao lume um segundo fogo para completar a "mantença inteira", pagando dessa forma a hospitalidade recebida em dezembro: "Cá se fazem, cá se pagam."

Coimbra tem um rácio de médicos 70 vezes superior aos concelhos com maiores carências

medicina

 (c) Página 1

Resumo do conto "Um lenço bordado"

    Um pai e um filho aguardam, escondidos, a chegada de um veículo que transporta homens importantes, diferentes dos locais, para serem passados a salto para Espanha.
    O trecho seguinte do texto - que oscila entre dois tempos, um passado e o presente - apresenta-nos o povo da localidade, envergando trajes de festa para receber uma ilustre personalidade que passará pela região.
    O menino, curioso, observa as estrelas e conta paralelepípedos, até que acaba por adormecer. Ao ouvir um motor, o pai acorda-o, e ambos veem o táxi com os cinco passageiros, que descem e são rapidamente conduzidos para longe da estrada. O clima muda, anunciando uma tempestade que se aproxima, e todos se refugiam numa loja. Entre os recém-chegados conta-se um casal distinto. Durante a tempestade, o homem dialoga com a criança, explicando que se encontra em fuga, porque há pessoas que lhe querem mal por pensar diferente. Quando a chuva passa, o grupo parte, guiado pelo "passador", um contrabandista conhecedor das passagens fronteiriças e com contactos do outro lado da fronteira. O homem promete à criança regressar um dia para ajudar outras como ele e dá-lhe um lenço branco com duas letras encarnadas bordadas como lembrança.
    O trecho final centra-se de novo no presente. Na estrada, a população aguarda, ansiosa, a comitiva. Quando finalmente chegam carros de luxo, um homem surge à janela de um deles e acena. Um jovem acerca-se dele e oferece-lhe um lenço branco com duas letras encarnadas bordadas, esclarecendo que o faz para que se lembrasse dele.

sexta-feira, 8 de agosto de 2025

Resumo do conto "No casino de Ledesma"

    Este conto narra um episódio protagonizado por António, um contrabandista raiano português, em terras espanholas.
    O texto inicia-se com a chegada de um guarda-civil à pousada onde António está a comer. A presença da polícia deixa-o inquieto e desconfiado. O sargento, depois de perguntar por ele ao estalajadeiro, aproxima-se da mesa e chama-o pelo nome, deixando-o atordoado e alarmado. Como poderia aquele homem saber quem ele era?
    O guarda pergunta-lhe se é galego ou português, ao que António responde ser galego, procurando evitar problemas. O sargento tenta saber o que está ali a fazer. António responde que procura trabalho, porém a resposta não convence o polícia, que continua a insistir e lhe faz um aviso misterioso ("Si llevas café al casino, no lleves más de cinco kilos."), que indicia que foi denunciado e que os guardas conhecem as suas atividades de contrabando. O aviso tem toda a aparência de uma tentativa de proteção elada. António fica perplexo, mas finge normalidade, tentando recuperar o apetite enquanto o sargento desaparece por uma porta da estalagem.
    À noite, cinco contrabandistas dirigem-se ao pátio do casino, onde entregam as suas cargas, presumivelmente de café. São recebidos por um funcionário, enquanto António, curioso, observa por uma pequena janela um homem a manusear notas sob vigilância armada, o que indicia a operação ilegal que ocorre no interior do casino. António tenta compreender o aviso que o sargento lhe fizera, enquanto observa outro homem que entra, fala com o funcionário e faz uma chamada telefónica. No pátio, cansados, os contrabandistas descansam e adormecem.
    Um portão abre-se com estrondo. Um grupo de guardas entra no pátio, depois da filha do estalajadeiro os ter informado que chegou à cidade um grupo de portugueses suspeito de contrabando. Um sargento interrogara-a e descobrira que um deles se chama António e que traziam café. Embora a rapariga não soubesse o destino final da mercadoria, um vendedor afirmou que o café ia para o casino. O carabineiro reagiu com inquietação, percebendo que os portugueses estavam em risco. O sargento, embora angustiado pela sua origem portuguesa, reúne cinco homens e parte em direção ao casino, preparando-se para agir com firmeza, norteado pelo dever.
    Os contrabandistas atravessam a ponte romana de Salamanca e encaminham-se para uma venda escondida numa ruela, na qual são recebidos por um homem que os reconhece lhes oferece sedas para contrabandear, em substituição do café. António aceita.
    O conto termina com o protagonista a soprar três vezes o caldo antes de o comer, o que simboliza um breve momento de alívio antes de dar continuidade à vida arriscada do contrabando.

Resumo do conto "Quarenta e dois dias e quarenta e duas noites"

    Um pai dá uma moeda de vinte e cinco tostões para comprar doces, aparentando normalidade, enquanto se prepara para partir, levado por homens num carro. Em Vilar Formoso, o subchefe informa-o que será levado para Coimbra e dá-lhe conselhos como se comportar aí.
    Chegado à cidade dos estudantes, é brutalmente interrogado, sendo sujeito a tortura física, após a qual é conduzido para um calabouço subterrâneo, um local escuro onde passará quarenta e dois dias e quarenta e duas noites. O prisioneiro permanece em silêncio, tentando dormir. Passado algum tempo, é novamente retirado da cela e interrogado, mas continua a não responder, pelo que é acusado de se fazer passar por valente e é ameaçado com mais agressões. Cinco homens cercam-no e começam a espancá-lo intensamente, como se ele não passasse de um saco de pancada para pugilistas.
    A descrição da violência que é exercida sobre ele é profundamente gráfica: o rosto incha, o sangue escorre, cambaleia, quase perde a consciência. Até dos ouvidos sai sangue. Mesmo sujeito a tão extrema violência, o protagonista resiste. Um dos cinco torturadores exige que confesse, ameaçando mesmo matá-lo, porém ele continua a insistir que não conhece os homens de que falam e que nada tem a ver com qualquer negociação ou conspiração. O espancamento só termina quando o chefe manda parar.
    Alguns dias depois, é levando novamente à sala de interrogatório, onde se encontra outro detido. Perguntam-lhe se conhece o outro homem e a resposta é negativa. O interrogador volta-se então para o outro prisioneiro, repetindo a pergunta. Este, completamente debilitado por sucessivos espancamentos brutais, diz que conhece o protagonista e recorda-lhe os homens que passaram para Espanha, mas ele nega. Perante a continuação da negação dos factos que desejam que confesse, segue-se nova cena de violência, marcada por mais um espancamento, tão intenso que chega a perder a consciência.
    Horas depois, desperta, com dificuldade para abrir os olhos e com o corpo coberto de equimoses e inchaços. Lentamente, tenta recuperar-se, levanta-se com esforço e vai para o chuveiro. Enquanto isso, os agentes torturadores observam-no secretamente por trás de um espelho falso. Quando se apercebem de que não toma banho, um deles confronta-o com agressividade, gritando que a água custa dinheiro e ameaça-o de que, se não se banhar, o matará. Mesmo perante esta ameaça, o protagonista não cede e responde que lhe é indiferente morrer naquele dia ou no seguinte.
    Com o corpo entregue e o olhar perdido, parece ver uma nuvem negra de aves necrófagas, uma metáfora da aproximação da morte. Os agentes atiram-no para a tarimba e deixam-no aí. De seguida, entra num sono profundo e, no meio da escuridão, surge uma luz intensa. Uma figura angelical surge e aproxima-se dele. Toca-o e ele sente-se envolvido por uma sensação de felicidade celestial. De mãos dadas, partem juntos, simbolizando a sua morte e libertação espiritual. Sobre a tarimba, uma moeda de vinte e cinco tostões brilha e transforma-se em pó, o que simboliza a transitoriedade da vida e o valor efémero das coisas materiais perante a morte.

quarta-feira, 6 de agosto de 2025

Resumo do conto "Bento, o curandeiro"

     O conto tem como personagem central Bento, um homem magro, de estatura média e aparência frágil, que vive num remoto povoado nas margens do rio Côa. Desde os sete anos, após o falecimento do pai, era pastor, pastoreando cabras na companhia de Lobato, o seu cão. Foi nesse ambiente de carência e solidão que cresceu, nunca tendo frequentado a catequese ou a escola.
    A sua comunicação com os outros seres humanos era muito difícil, o que contrastava com o modo fácil como se entendia com os animais. Raramente sorria e tinha um olhar opaco e vazio, como se carregasse o peso do mundo nos olhos. Não obstante a sua forma de ser, Bento era, na realidade, um homem bondoso, sendo procurado por várias pessoas da aldeia e das redondezas, nomeadamente por quem sofria de doenças persistentes ou se sentia vítima de mau-olhado ou feitiçaria.
    Este facto reforça a crença popular de que Bento possuía um dom, citando-se o exemplo de um menino que chorou três vezes dentro do ventre da mãe e, após ser curado pelo curandeiro, tal episódio foi percecionado como sinal do seu poder de adivinhação e cura. Alude-se ainda ao pormenor de Bento possuir uma cicatriz em forma de cruz no céu da boca desde bebé, após um episódio de alergia aftosa.
    O narrador revela que conheceu o protagonista em 1949, ano em que a sua mãe, já sem saber o que fazer para tratar a doença, decidiu recorrer a Bento, por sugestão de uma prima. O padre Cristóbal, informado da situação, sugeriu que embebesse um ramo de oliveira em água benta e benzesse o filho. Se houvesse uma reação agressiva, era sinónimo de que a criança estava possuída ou sob o efeito de feitiçaria; se não, o problema seria físico, pelo que deveria consultar um médico. Apesar de algum ceticismo, a mãe acabou por o levar a Bento, após o que as febres passaram, mas, na véspera do Dia de Finados, à meia-noite, a criança afirma ter visto a silhueta de uma mulher aos pés da sua cama. Ti Maria do Rosário, uma vizinha, recomenda uma consulta com o curandeiro.
    A mãe prepara o jumento e, ao amanhecer de uma terça-feira de 1949, partem rumo à aldeia onde Bento mora. No caminho, param numa igreja para se abastecer de água, prosseguindo depois para Castelo Bom. À sua chegada, encontram uma multidão de pessoas, muitas com galinhas, chouriças, morcelas e farinheiras, uma forma de pagamento ao curandeiro. Bento chega já de noite e começa a atender quem o quer consultar, enquanto a mãe e o filho se abrigam na cozinha. Já é bem tarde quando o casal que os antecedia é chamado. A mulher, exausta, adormece encostada à chaminé. Após a última consulta, o curandeiro declara-se esgotado, aconselha que pernoitem no palheiro e regressem na semana seguinte.
    Aquando da segunda visita, Bento aparece novamente ao anoitecer. Quando chega a vez de atender o narrador, este sente uma dor no estômago e o coração começa a bater mais depressa, mostrando todo o seu nervosismo. Todavia, apesar da longa espera, o curandeiro não o chama, pois acaba por dar prioridade a um homem que aparenta estar possuído, retorcendo os olhos e espumando pela boca. O atendimento é muito demorado e, com o passar das horas, o narrador e a mãe adormecem de cansaço, enrolados no xaile junto à chaminé. Acabam por ser despertados por uma mulher que está de saída, porém já é muito tarde e não resta ninguém na cozinha. Bento, mais uma vez exausto, volta a não os atender e sugere de novo que pernoitem no palheiro e regressem na semana seguinte. A mãe do narrador revolta-se, acreditando que o curandeiro está a zombar deles por não levarem qualquer oferta como as outras pessoas.
    Em seguida, o narrador relata que, a pedido da Ti Maria do Rosário, resolve finalmente perguntar à mulher que frequentemente vê aos pés da cama se ela é desta mundo ou do outro e o que deseja dele. Assim, na sexta-feira seguinte, o narrador aguarda a aparição para a questionar, contudo adormece sem querer. Quando desperta, sente um frio gélido no rosto e avista a mulher, silenciosa, aos pés da cama. Ele questiona-a, mas ela não responde. No dia seguinte, conta à mãe e à vizinha o episódio. Na noite desse dia, tem uma visão mais nítida: a figura é jovem, apresenta uma das faces em carne viva e um ferimento que se estende até o pescoço. Além disso, tem o ventre dilatado, como se esteja grávida, e tem uma mão sobre ele, enquanto chora silenciosamente.
    Ao saber do sucedido, Ti Maria do Rosário diz que se trata de Cremilde, uma jovem do seu tempo que perdeu o primeiro filho, falecido ao nascer com o cordão umbilical enrolado no pescoço, e nunca mais conseguiu engravidar. A partir desse momento, enlouqueceu: passava os dias a lavar-sena ribeira, chorava, colhia ramos de giesta, amarrava-os ao ventre e voltava ao povoado com as mãos coladas à barriga e um sorriso desfigurado e perturbador. Um dia, ao adormecer, foi atacada por um lobo, que a matou, deixando o corpo esfacelado de cima a baixo. Na noite em que esta história é contada, regressa a febre do narrador, que começa a delirar, invocando o nome «Cremilde» repetidamente e descrevendo, em transe, o que aconteceu com o bebé.
    Na manhã seguinte, a mãe pede à vizinha uma carroça, onde acomoda o filho com palha e uma manta, e os dois partem em direção à casa de Bento. Este chega ao entardecer, entrega as cabras à ordenha, lava as mãos com sabão de banha de porco como de costume e recebe o narrador e a mãe. No quarto, pede à criança que abra a boca e mostra à progenitora a cruz gravada no céu da boca do filho.
    Três dias depois, Ti Maria do Rosário, aflita, pede ajuda à mãe do narrador, pois a sobrinha, Ermelinda, está prestes a dar à luz, mas o parto está complicado. Os dois vão até lá, e o narrador pede que todas as mulheres saiam do quarto e o deixem a sós com a parturiente. De seguida, lava as mãos e coloca-as sobre o ventre de Ermelinda, sem lhe tocar, tal como vira Bento fazer aquando da primeira tentativa de consulta. O rapaz sente o calor concentrar-se na ponta dos dedos e começa a fazer movimentos circulares, no sentido dos ponteiros do relógio. O calor aumenta, e o narrador transpira intensamente, enquanto uma sensação semelhante a um formigueiro toma conta do seu corpo. Ermelinda sente o bebé a rodar dentro do ventre, mudando para a posição de cabeça para baixo, pronto para nascer. As parteiras são chamadas e o parto corre normalmente.
    Na noite anterior, Cremilde tinha aparecido ao narrador pela última vez: ela vagava pelo quarto, com as mãos sobre o ventre grávido, chorando em silêncio. Em determinado momento, deteve-se aos pés da cama, fez movimentos circulares com as mãos no sentido dos ponteiros do relógio, sorriu-lhe e desapareceu para sempre. No entanto, começou a ser visitado por outras figuras, que lhe revelam o que está por vir e o que deverá fazer. Uma dessas visitas é a de Bento, que lhe aparece em espírito e o informa de que o tempo do narrador chegou. Além disso, diz-lhe que, dentro de sete dias, será procurado por um jovem, que deverá atender somente quando o visitar pela terceira vez. Então, deverá confirmar se o jovem tem uma cruz no céu da boca, como ele mesmo tivera.
    Após a morte de Bento, espalha-se a notícia de que há um novo homem, que mora numa pequena aldeia da raia, que faz bem às pessoas. Deste modo, as pessoas das redondezas começam a procurá-lo por causa das suas maleitas.

terça-feira, 5 de agosto de 2025

Resumo do conto "O burburinho"

    O casal Maria e José seguia em silêncio através de um matagal espesso. Ele guiava um jumento, enquanto ela levava o filho recém-nascido ao colo. Ao chegarem a uma bifurcação, o animal parou subitamente, o que surpreendeu José, que tentou forçá-lo a seguir em frente, no entanto o jumento resistiu. O casal receou que se tratasse de algum perigo próximo, como, por exemplo, um lobo. Subitamente, um redemoinho (isto é, um burburinho de vento) surgiu na sua frente.
    José, conhecedor das crenças populares da região, gritou a Maria que fizesse cruzes com os dedos, no entanto a mulher, preocupada sobretudo em proteger a criança que carregava, apenas conseguiu fechar os olhos. O fenómeno desapareceu rapidamente, o burro voltou a obedecer ao dono e o casal prosseguiu o seu caminho. Pouco depois, Maria sussurrou que se sentia mal. O companheiro tentou acalmá-la e encaminhou-se na direção de um casario próximo, onde sabiam existir uma pousada. Aí, foram acolhidos e levados para um espaço onde havia feno e Maria poderia descansar. José, exausto, permaneceu ao lado da esposa, medindo-lhe a febre com as mãos. Do andar de cima, chegaram-lhes vozes e passos misteriosos, aumentando o clima de mistério e inquietação.
    De repente, uma voz convidou-os a subir e comer um caldinho. José aquiesceu e deparou-se com duas pessoas na cozinha: um mulher, ajoelhada junto à lareira, retirava uma panela do lume; um homem, sentado à mesa, servia vinho. Durante a refeição que se seguiu, o homem perguntou o que os levara até ali, e José respondeu que vendiam louça espanhola, vindos de Cidade Rodrigo. Após ter sido questionado sobre o motivo por que Maria não subira para comer, declarou que estava com febre. A mulher da casa insistiu com José que a chamasse.
    Quando este regressou com a companheira e o bebé, encontrou uma vela acesa sobre a mesa e uma malga com água. A dona da casa pediu, então, que Maria se sentasse perto do lume e deu início a um ritual popular de cura: colocou o utensílio de cozinha no colo, verteu azeite e começou uma reza misteriosa, em voz baixa, com palavras ininteligíveis. Durante a oração, a misteriosa mulher realizou movimentos circulares com os antebraços sobre o peito de Maria, unindo água e azeite, num ritual que durou vários minutos.
    Terminada a reza, a mulher aproximou a vela da malga e José pôde ver o seu conteúdo: a tigela estava cheia de bichos, mais de cem, todos de aspeto horripilante e nauseabundo.
    Quanto ao título do conto, de acordo com a crença popular, «burburinhos» ou redemoinhos de vento eram tidos como obras de bruxas e possuíam poderes maléficos. Para se proteger, quem os avistasse deveria fazer cruzes com os dedos; caso contrário, poderia ser vítima de um bruxedo.

segunda-feira, 4 de agosto de 2025

Resumo do conto "Meia-lua ou a história do menino levado"

    A estrutura do conto assemelha-se a uma reportagem, feita por alguém não identificado, que entrevista e grava conversas com diversas pessoas que testemunharam ou têm conhecimento do evento que vai ser narrado.
    Certa noite de verão, a primeira pessoa entrevistada acorda a meio da mesma e apercebe-se de que o filho de três anos já não se encontra entre os pais, onde o tinham deitado. A família, por causa do calor e de vigiar as medas de trigo para não serem roubadas, pernoitara na eira.
    O segmento seguinte do texto apresenta a visão de uma irmã do menino levado, que na época contava dez anos. Como consequência do que sucedera ao irmão, pensou no que acontecera durante vários dias e recusou-se a pernoitar fora de casa durante as semanas que se seguiram.
    Segue-se a voz do povo, que ficou a conhecer a história ao serão do dia seguinte, quando as pessoas se reuniram na rua, pela fresca, depois da ceia. Essa voz dá conta do espanto geral pelo facto de quer os pais quer as outras pessoas que pernoitaram nas eiras não terem dado por nada.
    O quarto segmento apresenta a versão de uma figura não identificada, alguém que estava nas eiras nessa noite e que participou na busca do desaparecido. O seu testemunho acrescenta um pormenor à história, caracterizada até agora por um grande mistério: a criança caminha quatrocentos metros sem se lembrar de o ter feito. Além disso, acrescenta que acordara nessa madrugada, incomodado com um zunido estranho nos ouvidos.
    O segmento seguinte acrescenta novo dado: a criança, de apenas três anos, teve de saltar uma parede de um metro de altura. A voz que fala é a de um tio / uma tia do menino e aposta na crença popular: tinham sido as bruxas, que levam os bebés de noite, sem os pais se aperceberem, para fazerem bruxarias. Golpeavam-nos numa mão ou numa perna e enchiam um dedal de sangue para usarem nas encruzilhadas dos caminhos.
    Através da figura seguinte, ficamos a saber que todas as vozes que foram ouvidas até aqui são testemunhos dados ao narrador, que os grava. Os acontecimentos tiveram lugar há mais de quarenta anos e que vai contar tudo o que sabe e que naquele tempo não contara nem à esposa por receio da PIDE. O fenómeno desenrolou-se na madrugada de 14 para 15 de julho de 1960, numa época em que se dedicava ao contrabando. Nessa madrugada, ao regressarem da sua atividade, foram surpreendidos pela polícia e cada um escapuliu-se por onde pôde. A testemunha voltou para trás, para casa. Depois de esconder a carga de contrabando, reparou num avião que, subitamente, parou e ficou a pairar no céu, emitindo uma luz mais intensa do que a das estrelas e que foi mudando de tonalidade e de forma. Enquanto prosseguia o trajeto para casa, viu surgir outra luz, esférica, de menor dimensão e totalmente branca. Depois de ter girado em torno da alaranjada, desceu e a personagem perdeu-a de vista.
    Duas horas depois, voltou a avistar a luz branca, já que a alaranjada se conservava parada no céu. Escondeu-se atrás dos muros e foi-se aproximando da luz. Então, abriu-se uma portinhola e, da nave, saiu uma figura com forma humana, transportando uma criança nos braços. A figura dirigiu-se para a meda onde os pais da criança dormiam. Nesse momento, alguém tossiu dentre os que pernoitavam no local, enquanto a misteriosa entidade transpunha o referido muro. Pouco depois, as duas naves «encontraram-se», viu-se um relâmpago silencioso e as luzes desapareceram.
    O testemunho final é novamente o do progenitor inicial, que começa por dar conta da aflição que o atingiu quando deu pelo desaparecimento do filho, receando que pudesse ter caído num dos muitos poços que havia por ali e morresse. Foram dar com ele no caminho do Linteiro, junto às alminhas, a noite da eira, a quatrocentos metros de distância de onde dormiam. Não possuía qualquer ferimento, à exceção de um pequeno golpe na perna esquerda, com a forma de um «C» invertido, uma espécie de meia-lua, que lhe deixou uma cicatriz. É então que o narrador lhe mostra uma sua cicatriz exatamente igual: "Mas... quem é o senhor?...".

domingo, 3 de agosto de 2025

Resumo do conto "Há coisas..."

    O conto narra uma experiência inquietante vivida numa noite de verão. Acordado repentinamente em plena madrugada, o narrador sente um medo profundo e solidão, com o coração disparado e o quarto mergulhado num silêncio assustador.
    Subitamente, ouve-se um ruído estranho e sem explicação aparente, que intensifica a sensação de medo, evocando memórias infantis de fantasmas e lendas noturnas. O temor é apontado como consequência do desconhecido e da possibilidade de que as histórias de fantasmas sejam reais. Apesar de tentar racionalizar a situação, atribuindo o barulho a uma brisa da madrugada, todavia o facto de a janela do quarto estar fechada deixa em aberto a dúvida e mantém o mistério e o clima de inquietação. De facto, «há coisas» inexplicáveis que nos cercam na solidão.
    Quando ouve novamente o som, estremece: parece-lhe que unhas arranham a parede, perto do seu ouvido. Assustado, lembra-se de Bieito, uma personagem de um conto galego que foi enterrada viva por engano. De facto, o desgraçado acordou a caminho da sua derradeira morada e arranhou desesperadamente as tábuas do caixão. Um dos que carregavam o caixão pareceu ouvi-lo, mas, duvidoso, permaneceu calado. A lembrança aprofunda a sua sensação de pavor. Questiona-se então se os sons que escuta são reais ou fruto da sua imaginação. Quando mais sons sinistros ecoam no quarto, sente-se fisicamente afetado e quase cede à vontade de gritar por ajuda, mas hesita. Com efeito, recorda-se da história de Bieiro e o medo de parecer louco fá-lo ficar em silêncio.
    De seguida, reflete sobre as possíveis consequências da sua reação, nomeadamente alarmar outras pessoas, não conseguir provar o que ouviu e descobrir, eventualmente, descobrir que nada havia. O medo do ridículo e do desconhecido mantém-se calado. No escuro, com os olhos abertos, sente-se indefeso no meio da escuridão. Senta-se na cama, sentindo um frio intenso e uma angústia profunda, como se algo invisível e ameaçador estivesse a seu lado.
    O protagonista acende a luz e o medo dissipa-se de imediato. Observando o quarto, descobre que o motivo de medo do narrador é apenas um gafanhoto dourado, pousado na mesinha de cabeceira. Seguidamente, desfaz-se do intruso e começa a recuperar o sangue frio e a razão, refletindo sobre como medos tão intensos podem nascer de algo inofensivo. Superstições e crenças parecem-lhe agora ridículas.
    No entanto, ao desligar a luz e retornar ao descanso, o narrador tenta convencer-se de que os medos e os fantasmas são um mero produto da mente. Porém, ao fechar os olhos, um sopro gélido acaricia-lhe o rosto, o que o faz ter a certeza inquietante de que não está só, reinstalando-se a dúvida de que algo não racional pode, de facto, estar presente.

sábado, 2 de agosto de 2025

Resumo do conto "A camisa de linho"

    O conto "A camisa de linho" inicia-se de forma misteriosa, com um som suave de batidas à porta da casa de Jacinto, um viúvo solitário que vive isolado num casebre de granito desde que perdeu a esposa, Maria, despertando a sua curiosidade. Apesar do isolamento, Jacinto não sente a falta de companhia humana, pois conta com a presença constante do seu cão, Nero, que o acompanha fielmente e parece compreender-lhe os estados de alma, reagindo às emoções do dono, especialmente quando Jacinto se mostra triste ou pensativo.
    Ao ouvir as batidas, Nero, que dormitava aos pés de Jacinto, acorda subitamente, alerta e começa a ladrar, sinalizando algo incomum. O homem levanta-se com algum esforço e vai até à porta, acompanhado do cão. Ao abrir a porta, não vê ninguém e imagina tratar-se de alguma travessura de criança. Contudo, quando se prepara para a fechar, nota que Nero tem o focinho enfiado num embrulho de papel estranho.
    Jacinto apanha o embrulho deixado à porta e examina-o. Intrigado, sai à rua e observa em redor, mas não vê ninguém. Senta-se na ombreira, abre o objeto com um canivete e no interior encontra uma camisa de linho branca. Nesse instante, Nero começa a ladrar e corre na direção de algo suspeito. Pouco depois, surge uma galinha preta detrás de uma laje com musgo, cacarejando. O animal persegue-a, mas ela consegue escapar, desaparecendo no telhado de um celeiro abandonado.
    Jacinto chama o cão, que regressa com relutância. Afaga-o e graceja, lembrando-se então do dito popular ("Nu sabes o que se diz das galinhas pretas?") sobre galinhas pretas, e percebe o significado da estranha entrega: aquela camisa de linho constituía um presságio ou possuía um sentido oculto.
    Há muito tempo, numa madrugada, Jacinto regressava exausto a casa após uma dura jornada de contrabando. Cansado e faminto, separou-se dos companheiros ao chegar ao povoado e seguiu sozinho. Subitamente, deparou com uma mulher misteriosa, paralisada, como se tivesse criado raízes no chão, que lhe disse enigmaticamente: "Nu sabes o que se diz das galinhas pretas?!", como se se tratasse de uma cantiga memorizada. De seguida, implorou-lhe que a levasse para casa, prometendo-lhe uma camisa de linho e pedindo que não contasse a ninguém acerca do encontro. Confuso e sem entender o que se estava a passar, o homem acabou por ceder, movido pela aflição crescente dela e pelo amanhecer que se aproximava.
    Jacinto levou a mulher até casa, onde ela lhe agradeceu e renovou a promessa feita. O velho nunca falou do episódio a ninguém e também jamais recebeu qualquer recompensa. Com o passar do tempo, o estranho acontecimento caiu no esquecimento, até àquele momento em que lhe bateram à porta e lhe deixaram tão estranho presente.
    Arrastando o corpo cansado, Jacinto dirige-se à cozinha, senta-se junto à lareira e chama Nero. Em voz alta, reflete sobre o que aconteceu naquela madrugada, associando a misteriosa mulher à crença de que galinhas pretas são almas do diabo, bruxas transformadas que, se não regressarem a casa antes da meia-noite, perdem o feitiço e ficam paralisadas.
    Jacinto observa por instantes a camisa de linho e lança-a ao lume. Nero deita-se aos seus pés e os dois contemplam em silêncio as chamas.
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