Português: Análise de "Conselho"

domingo, 12 de setembro de 2021

Análise de "Conselho"

  
Sê paciente; espera

que a palavra amadureça

e se desprenda como um fruto

ao passar o vento que a mereça

 
            Este poema é da autoria de António Gedeão, pseudónimo de José Fontinhas, nascido na Póvoa de Atalaia, em 1923, e falecido no Porto, em 2005.

            Embora estejamos na presença de uma única quadra, trata-se de uma verdadeira arte poética, ou seja, um conjunto de princípios que orientam a produção de um texto poético. A estrofe abre com um conselho dirigido ao «tu» para ser paciente. Esse conselho assenta no recurso ao modo imperativo («Sê»), que pressupõe a existência do «tu», do interlocutor do sujeito poético, que recebe a mensagem deste último e dela extrai ensinamentos sobre a arte de escrever poesia. Deste modo, é possível concluir que o texto pressupõe uma finalidade didática, visto que se apresenta como um ensinamento dirigido a todos aqueles que procuram exercer a atividade poética.

            A “explicação” desse “conselho” é desenvolvida no resto da composição poética a partir do recurso à metáfora e a nova comparação. Estes recursos estilísticos destacam a naturalidade que deve estar na origem do texto poético, associado metaforicamente a um fruto que, depois de amadurecido, se desprende naturalmente do ramo da árvore. A metáfora do amadurecimento pode também remeter para a ideia da reformulação / reescrita do texto: o escritor escreve e, depois, corrige, reformula até encontrar a «versão» que o satisfaça. Por outro lado, a metáfora e a comparação insinuam também a paciência e a espera que o processo criativo, o processo de escrita implicam.

            Esta temática é abordada por António Gedeão em múltiplos poemas, com contornos semelhantes. De acordo com as suas próprias palavras, não era um poeta de inspiração (não era, portanto, o Alberto Caeiro que, de pé, frente à sua secretária, escreveu, de jato, os poemas de O Guardador de Rebanhos), mas um trabalhador, um «artesão» que escrevia o poema «sílaba a sílaba».
 

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