Português

domingo, 28 de julho de 2024

Resumo da cena 2 do ato IV de Hamlet

    Quando Hamlet acaba de se desfazer do corpo de Polónio, surgem Rosencrantz e Guildenstern, que o questionam acerca do destino do cadáver, para que o possam transportar para a capela. No entanto, o príncipe recusa dar-lhes uma resposta direta, optando antes por os provocar e chega inclusive a acusá-los de serem espiões ao serviço de Cláudio. Além disso, chama «esponja» a Rosencrantz, pois tanto este como Guildenstern absorvem o favor do rei, acatando e executando as suas ordens e deixando que ele os esprema até secar. Após nova recusa em esclarecer onde esconder o corpo de Polónio, concorda em acompanhar os velhos amigos até à presença de Cláudio, todavia desata a correr, desafiando-os a apanhá-lo.

Análise da cena 1 do ato IV de Hamlet

    A cena inicial do quarto ato é breve e foca-se numa espécie de traição que Gertrudes comete relativamente ao seu filho, concretamente por ter contado a Cláudio o encontro que tivera com Hamlet, quando lhe havia prometido não o fazer. A rainha mostra-se, pois, desleal para com o filho, ao contar ao atual marido que aquele assassinara Polónio, embora não lhe dê conta que o jovem príncipe estava a fingir ser louco. O que significa esta atitude da rainha? Acredita que Hamlet está efetivamente louco, ou, astutamente, reflete e reconhece que o seu interesse reside em se aliar ao marido? Por outro lado, não nos podemos esquecer que Gertrudes é a rainha da Dinamarca, o que implica um conjunto de deveres. Assim sendo, tendo em conta que Polónio era um nobre conhecido e, até certo ponto, respeitado, pelo que esconder a notícia da sua morte poderia ser considerado um ato de traição relativamente aos seus deveres enquanto soberana.
    Por seu turno, Cláudio esforça-se por aparentar calma enquanto ouve o relato da esposa, mas claramente reconhece que os últimos acontecimentos constituem a oportunidade perfeita para exilar Hamlet para Inglaterra. Cláudio é um rei oportunista, ambicioso e egoísta, preocupado apenas em conservar o seu poder a todo o cisto, evitando tudo o que possa constituir uma ameaça a essa ambição. Afinal, ele não hesitou em assassinar o próprio irmão para conquistar a coroa e o poder que lhe está inerente. Deste modo, mais do que nunca, Hamlet deve ser enviado para Inglaterra, não para o punir por ter assassinado Polónio, mas porque a sua presença na Dinamarca representa um perigo para o próprio Cláudio.
    O leitor / espectador facilmente se apercebe que o rei se está a aproveitar da situação para dar andamento aos seus planos sinistros relativamente ao sobrinho, mas também apreende uma diferença comportamental entre ambos: Cláudio age rapidamente, enquanto Hamlet é uma figura hesitante. No entanto, apesar de não perder tempo em pôr em marcha o seu plano, o rei não descura o modo como o concretizar, preocupando-se em controlar os danos. É por isso que, após a saída do Rosencrantz e Guildenstern, sugere que ele e Gertrudes procurem os seus mais próximos para lhes narrar o que aconteceu. De facto, no seu pensamento, ao divulgar os acontecimentos segundo a sua visão e interesses, evitará que o crime de Hamlet o manche a si e justificará a premência da partida do sobrinho. O seu caráter fingido e dissimulado acentua-se quando não tem pejo em afirmar que não mandou Hamlet embora mais cedo por razões sentimentais, procurando transmitir, desta forma, a imagem de alguém atencioso e generoso. Dada disto, obviamente, corresponde à verdade.
    No que diz respeito a Hamlet, o assassinato de Polónio constitui um momento de viragem no seu percurso e na sua caracterização. De facto, antes de ter matado um homem inocente, era possível olhá-lo com olhar benévolo, compreensivo e até solidário, pois estávamos na presença de alguém profundamente marcado pela morte do pai e pelo confronto e as exigências do seu fantasma. Contudo, após o assassinato de Polónio, essa imagem é fortemente afetada. A sua natureza sensível e reflexiva – os traços de caráter que interferem, fazendo-o hesitar, na capacidade de se vingar de Cláudio – dá lugar a uma atitude exatamente oposta, concretizada num ato precipitado e extremamente violento. É verdade que Hamlet age dessa forma por estar convencido de que é Cláudio quem se encontra atrás da cortina, porém, seja como for, o seu gesto põe em xeque a sua superioridade moral sobre o tio. Ambas as personagens assassinaram outras pessoas; a única diferença reside no facto de o crime do príncipe não ter sido premeditado, ao contrário do do tio, que foi planeado e motivado pela ambição. Todavia, as consequências dos dois atos são semelhantes: Laertes e Ofélia perderam o seu pai, tal como tinha sucedido com Hamlet.
    Por outro lado, toda esta sucessão de acontecimentos suscita a abordagem de questões como a violência e o assassinato. Inicialmente, esses aspetos foram abordados de forma algo abstrata, visto que a única violência que teve lugar – o assassinato do velho rei Hamlet – é anterior ao início da peça. Porém, no momento em que o seu filho assassina Polónio, a violência estrema e o assassínio concretizam-se, presentificam-se aos olhos do leitor / espectador. Por outro lado, não podemos esquecer que a morte de Polónio decorre do assassinato de Hamlet pai, o que permite concluir que a violência e o crime só geram mais violência e mais sangue.
    Por último, não se pode deixar de dar uma palavra ao comportamento de Rosencrantz e Guildenstern. Os dois são amigos de Hamlet, porém não revelam qualquer prurido em se voltar contra ele, o que mostra, no mínimo, falta de lealdade e de uma amizade verdadeira e autêntica. Se tivermos em consideração, porém, que a sua obediência é devida a Cláudio, o rei, independentemente das suas crenças e afetos, é natural que tenham de fazer aquilo que o monarca lhes ordenar, mesmo que tal signifique trair um amigo de longa data. Regra geral, o ser humano tem sempre uma opção e é da sua responsabilidade fazer essa escolha.

Resumo da cena 1 do ato IV de Hamlet

    Após o diálogo com o filho, Gertrudes corre ao encontro de Cláudio. Encontra-o acompanhado de Rosencrantz e Guildenstern e pede-lhe para falarem a sós. A rainha narra, então, ao marido o encontro que acabara de ter com Hamlet, detalhando a sua insanidade e o assassinato de Polónio. Horrorizado, Cláudio observa que, se fosse ele a estar escondido atrás da tapeçaria, teria sido morto pelo sobrinho, e conclui que este é um perigo para todos, pelo que deverão enviá-lo, de imediato, para Inglaterra. Em simultâneo, terão de encontrar uma explicação credível de explicar à corte e ao povo as ações de Hamlet.
    De seguida, convoca Guildenstern e Rosencrantz, conta-lhes acerca do assassinato de Polónio e instrui-os a localizar Hamlet e levar o corpo do falecido para a capela. Posteriormente, diz à esposa que é necessário revelar publicamente a verdade sobre o jovem príncipe e encontrar uma forma de lidar com ele.

quinta-feira, 25 de julho de 2024

Correção do Exame Nacional de Português 12.º ano 2024 - 2.ª fase

Exame Nacional de Português - 12.º ano - 2024 - 2.ª fase

Decreto-Lei n.º 48-B/2024, de 25 de julho


    O decreto que estabelece os princípios da recuperação do tempo de serviço docente.

    Em 2018, a fraude que dá pelo nome de António Costa e que andou quase uma década a fazer de contas que era primeiro-ministro afirmou que nem daí a dez anos haveria condições para devolver o tempo que foi surripiado aos professores. Estamos em 2024, passaram, portanto, seis anos.

Questionário sobre o conto "A chama obstinada da sorte" - 1.ª parte

 1.ª parte (do início até “… e de que podiam, por isso, apagar o candeeiro.”)
 
1. Qual é a origem do conto e o significado da epígrafe (Para o senhor Aladino Sepúlveda, primeiro “ocupa” da patagónia)?
 
2. O conto inicia-se com a situação inicial, isto é, com a apresentação da personagem principal e da sua família.
 
2.1. Indica os principais aspetos da vida do velho e dos seus familiares a partir das informações presentes no primeiro parágrafo.
 
2.2. Transcreve as expressões textuais que evidenciam a dimensão da família.
 
2.3. Identifica os recursos estilísticos presentes nas expressões seguintes e refere o seu valor expressivo.
a. “erráticos como o vento da estepe”.
b. “quando os ventos (…) faziam soar as tripas”.
 
3. Além do velho e da sua família, o narrador apresenta-nos outra personagem.
 
3.1. Identifica-a e procede à sua caracterização.
 
3.2. Menciona a função principal que, neste início de texto, lhe era atribuída.
 
4. Explica o sentido da expressão “quando as vacas magras se tornavam realidade”.
 
5. O velho tinha uma intenção ao ordenar a Cachupín que expulsasse toda a gente de casa. Apresenta-a.
 
5.1. Descreve os acontecimentos que se seguiam.
 
5.2. Aponta o valor do diminutivo “familória”.
 
5.3. Procura explicar o sentido da expressão “esperava pela chegada das sombras, atendendo ao valor polissémico da palavra sublinhada.
 
6. Refere o tipo textual predominante nos sete primeiros parágrafos do texto e justifica a tua resposta recorrendo a expressões textuais que o comprovem.
 
6.1. Indica o tipo textual da sequência que se inicia no oitavo parágrafo e transcreve três expressões que fundamentem a tua opção.
 
7. Sintetiza os acontecimentos apresentados até ao final do excerto.
 
8. Localiza a ação do excerto no tempo e no espaço, recorrendo a expressões comprovativas.


Correção do questionário: correção.

terça-feira, 16 de julho de 2024

Análise da cena 4 do ato III de Hamlet

    A conversa entre mãe e filho é muito interessante, pois permite levantar várias suposições relativamente à atitude e ao pensamento de Hamlet. Por exemplo, terá a rainha conhecimento do crime do seu atual marido? Poderá ela fornecer informações que confirmem o assassinato? Terá sido a monarca cúmplice da barbárie? Seja qual seja o seu intuito, Hamlet «apenas» incita a progenitora a afastar-se de Cláudio, num discurso sexualmente bastante gráfico. Sigmund Freud afirmou que Hamlet possuía o desejo inconsciente de desfrutar sexualmente da sua mãe, algo que seria comum à generalidade dos homens e que designou como Complexo de Édipo, em homenagem à figura da mitologia grega homónima de uma peça de Sófocles que, involuntariamente, cumprindo uma profecia, assassinou o seu pai, Laio, e posteriormente desposou a própria mãe, sem saber de quem se tratava, gerando com ela vários filhos. Freud prossegue, esclarecendo que, enquanto Édipo concretizou essa fantasia, Hamlet apenas possui o desejo inconsciente de o fazer, o que o torna uma figura moderna, dado que reprimiu esse desejo.
    Ao longo da cena, Gertrudes limita-se a reagir aos ataques e às denúncias do filho sobre si, mostrando diferentes reações e emoções ao longo da mesma. Assim, de início revela alguma arrogância e dirige algumas acusações a Hamlet; mais à frente, mostra receio de que o príncipe a magoe fisicamente; quando Polónio é morto, fica chocada; o medo e o pânico dominam-na no momento em que o filho se lhe dirige agressivamente; posteriormente, revela-se espantada e crente de que Hamlet está louco, quando o vê falar com o vazio, já que ela não consegue ver nem ouvir o fantasma do anterior marido; por fim, parece arrependida relativamente ao príncipe e disposta a ajudá-lo. Ou seja, ao longo da cena, Gertrudes vai sendo submetida a sucessivos choques (as acusações de Hamlet, a morte de Polónio), os quais a vão fragilizando e enfrentando a sua capacidade de resistência às acusações do filho e à condenação do seu comportamento e suas atitudes. O modo como a insistência e os sentimentos do príncipe a vergam enfatiza a ideia de que a monarca é uma figura com tendência para se submeter e se deixar dominar por homens poderosos e uma necessidade de que aqueles lhe mostrem o que pensar e sentir.
    Ora, estes traços psicológicos explicarão o facto de Gertrudes se ter entregado tão rapidamente a Cláudio, isto é, pouco depois da morte do velho rei Hamlet. Por outro lado, quando promete guardar segredo da conversa que estão a ter, é possível que a rainha finja apoiar o filho apenas para o acalmar, visto que, como veremos posteriormente, ela relata o que se passou a Cláudio, quebrando a promessa que lhe fizera. Uma outra explicação para este comportamento pode prender-se com um eventual instinto de sobrevivência e autopreservação que a leva a confiar nos homens, ou, pelo menos, em determinados homens.
        Gertrudes é rainha, ocupa uma posição de poder, porém convém nunca esquecer que vive numa sociedade dominada por homens. O filho não se poupa a esforços no sentido de fazer com que ela se sinta culpada por ter traído o primeiro marido, procurando retratá-lo como uma esposa desleal, o que certamente a magoa. Tanto é assim que implora que o príncipe pare com as acusações, nomeadamente a de ter trocado um irmão pelo outro como seu marido. Ou seja, a sociedade parece esperar que uma mulher que enviúva deve pausar a sua morte após o falecimento do marido. Existem ainda hoje mulheres que nunca mais voltaram a casar ou a manter novos relacionamentos amorosos quando ficam viúvas. Algumas, inclusive, carregam luto pesado pelo resto das suas existências. Todavia e, por outro lado, esta análise vai ao encontro da pressão de que Gertrudes certamente foi alvo para voltar a contrair matrimónio, algo comum entre a realeza medieval. Como Eça de Queirós escreveu no sento conto “A Aia”, em que uma rainha se vê subitamente viúva, com um filho de tenra idade nos braços, uma roca não governa como uma espada, não se escusando a salientar como a ausência do rei deixava o reino e a própria família desamparada e frágeis. Além disso, terá Gertrudes pressentido que Cláudio era um homem perigoso, pelo que, caso se recusasse a casar com ele, poderia correr perigo de vida.
    Voltando a Hamlet, a sua ação nesta cena é movida tanto pela raiva quanto por uma certa curiosidade, daí que tenha confrontado a mãe para esclarecer o que pensava sobre o assassinato do seu pai e também para questionar o papel da rainha em toda a situação. É neste cenário que Hamlet assassina Polónio, pensando tratar-se do «rato» Cláudio, um ato impulsivo e não planeado. Este é um dado curioso e particularmente interessante, visto que a ação mais ousada, decisiva e impactante tomada pelo príncipe, que sempre se mostrou hesitante em agir, resulta exatamente de um impulso. Isto é comprovado pelo facto de mesmo agora, quando Hamlet está certo de que Cláudio assassinou efetivamente o seu pai, continuar a adiar a sua vingança. Deste modo, é perfeitamente lícito concluir que o príncipe só consegue agir sem premeditação.
    De facto, Hamlet é alguém caracterizado pela reflexão, mais do que pela ação, sendo perseguido por questões morais e hesitações e incertezas quando se trata de vingar a morte do pai, assassinando o ator do crime, o seu tio Cláudio, mesmo quando se lhe depara a oportunidade perfeita. No momento em que decide agir, fá-lo cega e quase instintivamente, atingindo alguém que ele pensava ser o tio através de uma cortina. É como se o príncipe soubesse intimamente que era incapaz de agir racionalmente e apenas fosse capaz de agir e concretizar a sua vingança de forma acidental, instintiva, e não planeada e premeditada. Quando constata que, afinal, matou Polónio, interpreta o seu ato no contexto do esquema retribuição, punição e vingança. O assassinato, para Hamlet, significa que Deus o usou como instrumento de vingança para punir os pecados de Polónios e os seus próprios, manchando a sua alma com o crime que acabara de cometer.
    O diálogo intempestivo entre mãe e filho faz reaparecer o fantasma do velho rei, que lhe recorda que não deve magoar a mãe. Como esta não consegue ver nem ouvir o espectro, ela é levada a acreditar que Hamlet enlouqueceu realmente. Mas será ele realmente louco? Por outro lado, será o único capaz de ver e interagir com o fantasma? A resposta é obviamente negativa, pois, como vimos nas cenas iniciais da peça, ele foi visto também pelos guardas que percorriam as muralhas de Elsinore. Além disso, o público que assiste à representação também vê o espectro, o que significa que William Shakespeare quer que os espectadores acreditem que o que Hamlet vê é real. Por outro lado, é interessante observar que, quando Gertrudes afirma que o filho perdeu o juízo, o plano inicial do príncipe de se fingir louco se volta contra ele. De facto, agora parece genuinamente louco, o que faz com que seja pouco provável que a mãe se coloque do seu lado.
    Ao assassinar Polónio, Hamlet comete, involuntariamente, um crime para o qual não tem justificação. Curiosamente, inicialmente, o príncipe protela o assassinado de Cláudio por não ter a certeza se o tio era ou não culpado e, portanto, merecedor da punição da vingança. Todavia, nesta cena, matou um homem inocente, pelo que terá de passar a haver-se com o sentimento de culpa. Interessantemente, não se mostra arrependido do que acabou de fazer, o que permite pôr em causa os princípios morais que norteiam a sua vida. De facto, apesar de se debater, ao longo da peça, até aqui, com a dúvida se seria correto assassinar Cláudio, neste momento a morte de um homem inocente, ou aparentemente inocente, não pesa particularmente na sua consciência. Tudo isto confere complexidade à peça, desde logo porque o seu protagonista é uma figura particularmente complexa e difícil de ler. Por vezes, ele parece querer fazer o que é moralmente correto, porém, noutros momentos, parece pôr de lado os seus princípios e valores.
    Outra questão significativa refere-se a uma presumível decadência moral que atinge Hamlet. Inicialmente, adiou a morte de Cláudio por uma questão ética e nobre, ou seja, por querer certificar-se que o tio é efetivamente o assassino, porém, nesta cena, torna-se ele mesmo um criminoso. A procura de vingança leva o indivíduo a trilhar caminhos sombrios.

Resumo da cena 4 do ato III de Hamlet

    Nos aposentos de Gertrudes, a rainha e Polónio aguardam a chegada de Hamlet e o homem explica à soberana o seu plano, que ela aceita. Quando o príncipe chega, Polónio esconde-se atrás de uma tapeçaria. Hamlet entra no compartimento e pergunta à mãe o motivo por que o chamou. A mulher responde que o filho insultou a memória do pai ao ofender Cláudio, mas o jovem responde-lhe que foi Gertrudes quem ofendeu o velho rei Hamlet ao desposar o seu irmão. A rainha questiona as palavras duras do filho e pergunta-lhe se esqueceu quem ela é, ao que ele responde que sabe perfeitamente a sua identidade: a esposa do irmão do seu pai e, lamentavelmente, sua mãe.
    O comportamento de Hamlet assusta Gertrudes, que grita por ajuda. De trás da tapeçaria, Polónio, alarmado, grita também. O jovem príncipe, percebendo que alguém se esconde atrás das cortinas e suspeitando que pode ser Cláudio, desembainha a sua espada, enfia-a através da tapeçaria e mata Polónio. A monarca condena o ato do filho, no entanto este afirma que o seu gesto não é tão mau quanto o de assassinar um rei e casar-se com o seu irmão, afirmações que a deixam incrédula. O filho prossegue, questionando os motivos da progenitora para ter desposado o cunhado, especulando que era louca ou tinha sido enganada pelo diabo, e repreendendo o facto de dividir o leito com um vilão assassino.
    Subitamente, o fantasma do velho rei aparece, e Hamlet pergunta-lhe o que terá que fazer. Gertrudes não consegue ver o espectro, por isso afirma que o filho perdeu o juízo ao vê-lo conversar com o vazio. O fantasma afirma que veio para recordar Hamlet do seu propósito, que ainda não o vingou, matando Cláudio. Percebendo que Gertrudes não o consegue ver nem ouvir, o espectro pede ao jovem príncipe que interceda por si junto da mãe. Hamlet descreve o fantasma, mas a rainha nada vê e ele desaparece. Tenta, de seguida, desesperadamente, convencer a soberana que não está louco, mas apenas fingiu loucura, e insta-a a abandonar Cláudio e a recuperar a sua honra. Além disso, pede-lhe também que não revele ao atual marido aquela conversa entre ambos. Gertrudes, abalada pelas palavras duras do filho, concorda em manter segredo.
    Antes de sair, Hamlet lembra à mãe que, em breve, partirá para Inglaterra com Rosencrantz e Guildenstern, mas acrescenta que a mensagem que levará não será diplomática, antes uma ordem de execução assinada por Cláudio. Acrescenta ainda que tem um plano para enganar o tio e, de seguida, sai, arrastando o corpo de Polónio.

Análise da cena 3 do ato III de Hamlet

    Nesta cena, Hamlet parece disposto a, finalmente, concretizar o seu desejo de vingança. O jovem mostra-se satisfeito por a peça e o excerto que nela enxertou terem provado a culpabilidade do tio. Quando este reza, fica-se com a certeza de que Cláudio assassinou o irmão. De facto, trata-se uma confissão absoluta e espontânea, mesmo que ninguém mais a ouça.
    Cláudio e Polónio urdiram um plano para espiar Hamlet e desvendar o que está a acontecer exatamente com o príncipe, o que significa que o seu comportamento errático os confundiu. Por outro lado, ironicamente é o próprio Hamlet quem acaba por observar secretamente o tio, embora não tenha ouvido o solilóquio de Cláudio, pois somente o vê ajoelhado a rezar. Convém ter presente que o solilóquio é um recurso muito importante na peça, dado que muitas personagens escondem frequentemente os seus pensamentos, sentimentos e motivações, agindo de forma enganosa, de forma a tentar enganar os demais. Esses momentos de confissão constituem os únicos momentos em que o público tem a oportunidade de conhecer as verdadeiras intenções das personagens.
    Podemos considerar que o momento fundamental da cena é a reação de Cláudio à encenação que reproduz o assassinato do rei Hamlet, que confirma, de facto, a sua culpabilidade. Se dúvidas ainda houvesse, porém, o solilóquio posterior acaba com as mesmas: Cláudio assassinou o seu irmão. Está, pois, aberto o caminho para o príncipe concretizar a sua vingança, contudo ele coloca o seu ato na perspetiva da moralidade. Por um lado, o seu intuito ultrapassa os limites da moralidade cristã, pois deseja matar o tio e, ao mesmo tempo, condenar a sua alma. Com efeito, a sua decisão de não consumar o assassinato quando o tio está ajoelhado a rezar prende-se com o seu medo de que esse ato enviasse a alma de Cláudio para o céu, em vez do inferno, o que confirma que as motivações de Hamlet giram em torno do sentimento de vingança. Por outro lado, pode encarar-se esta atitude como mais uma desculpa para adiar a morte do tio, apesar de ter a certeza da sua culpabilidade. No fundo, estamos perante uma questão de justiça: o velho rei fora assassinado sem ter tido a oportunidade de purificar a sua alma através de orações ou confissões, por isso o seu assassino deveria padecer a mesma condenação.
    Noutra perspetiva, podemos observar que, quando Hamlet decide não assassinar Cláudio enquanto este reza, está a desejar comportar-se e atuar de modo honrado. Simultaneamente, demonstra grande respeito pelos valores religiosos, considerando um assassinato um pecado mortal, enquanto a vítima se encontra a orar. Ao deixar passar esta oportunidade privilegiada de consumar a sua vingança, Hamlet torna claro que os seus valores morais e religiosos têm influência nos seus comportamentos e atos, tanto ou mais que o desejo de vingar o pai. É possível que a noção de que executar alguém a sangue frio é um ato desumano que ele não consegue concretizar.
    No que diz respeito a Cláudio, a sua tentativa de rezar é muito interessante. Aparentemente, deseja ser perdoado pela morte do irmão, no entanto não está disposto a abdicar dos benefícios que o crime lhe trouxe: a coroa e a rainha. Esta postura escancara a sua corrupção e decadência moral, a sua falta de integridade, traços que, nas palavras ditas anteriormente por Marcelo, quando afirmou que algo estava podre no reino da Dinamarca, se estendeu à sociedade. Assim sendo, podemos concluir que Cláudio é a personificação dessa decadência moral, pois ele reconhece que cometeu um crime, porém decide conscientemente que não irá retificar o seu comportamento pecaminoso, arrependendo-se genuinamente.

segunda-feira, 15 de julho de 2024

Resumo da cena 3 do ato III de Hamlet

    A ação desta cena tem lugar na mesma noite da representação da peça. Depois de todos deixarem o local onde a produção ocorrera, Rosencrantz e Guildenstern falam com Cláudio, que se encontra muito abalado com o conteúdo da peça e com a aparente loucura de Hamlet, que considera perigosa, daí que peça à dupla que escolte o jovem príncipe até Inglaterra, para segurança de todos. Os dois homens, leais ao rei, acatam e vão-se preparar de imediato para a viagem.
    Entretanto, chega Polónio e informa Cláudio que Hamlet está a caminho dos aposentos de Gertrudes, lembrando ao rei o seu plano de se esconder no quarto da rainha para observar o encontro entre mãe e filha e, posteriormente, lhe relatar o que ficar a saber. De seguida, sai, para dar andamento ao seu plano.
    Sozinho, Cláudio, num solilóquio, reconhece o seu crime hediondo, a sua culpa e a noção de que cometeu um pecado indesculpável: o fratricídio é uma das piores ofensas que se pode fazer, é o crime mais antigo, que acarreta a maldição mais antiga. Assim, implora pelo perdão e pela misericórdia de Deus, porém receia não ser perdoado, exceto se renunciar ao trono da Dinamarca e à rainha. Porém, em simultâneo, afirma que não está preparado para desistir daquilo que conquistou por meio do crime. Tomado pela culpa, ajoelha-se em oração.
    Hamlet, a caminho dos aposentos da mãe, depara-se com Cláudio a rezar e vê a situação como uma oportunidade para se vingar dele e o matar. No entanto, de repente ocorre-lhe que, se assassinar Cláudio enquanto esta está a orar, de acordo com as crenças da época, inadvertidamente enviá-lo-á para o céu, exatamente o oposto daquilo que Hamlet e o seu pai pretendem, visto que o tio, ao matar o defunto monarca antes que este tivesse tido oportunidade de fazer a sua última oração, garantiu que o irmão não iria para o céu.
    Deste modo, Hamlet decide esperar, até que o tio cometa um ato pecaminoso, como, por exemplo, quando estiver bêbedo, dominado pela ira ou lascivo. O jovem príncipe sai, a caminho do encontro com a mãe, enquanto Cláudio se ergue, desesperado com a ineficácia das suas orações, duvidando da sua salvação.
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