Português: Capítulo VIII de A Sibila

sexta-feira, 23 de agosto de 2019

Capítulo VIII de A Sibila

            1. Resumo da 1.ª parte do capítulo

            Quina, quarentona, nunca teve tantos pretendentes, mas a sua vaidade e o desinteresse pelo casamento impedem os seus intentos.
            A velha Narcisa Soqueira continua a pretendê-la para o filho Augusto, de quem é traçado um breve retrato ("bronco até ao anedótico"). É dotado de uma natureza selvagem, o que o aproxima das ideias filosóficas de Rousseau.
            Seguidamente, faz-se referência a um brasileiro rico, sobrinho segundo do seu velho amigo Adão, aproveitando a narradora para denunciar a emigração e as suas desastrosas consequências.
            A faceta espiritual de Quina como conselheira é novamente realçada com a alusão a Adriana, uma prima abandonada pelo marido que recorre aos seus conselhos, mas que, deflagrada a guerra, regressa para junto do marido.


            2. Prosperidade da casa da Vessada – conquista do poder económico

            Requestada por um maior número de pretendentes do que em nova, Quina não pretende casar-se, pois a sua preocupação vai no sentido de ser mais respeitada do que amada, o que se deve também à sua ambição de posse e de aumento de património, desiderato conseguido através da captação da herança aos irmãos: "João (...) acabou por abdicar da sua parte da herança por uma quantia em dinheiro que jubilosamente lhe foi entregue por Quina. (...) Adão louvou-a muito por aquele discreto manejo que a fazia senhora de metade do património"; "Era, no fim de contas, Quina que subia, que se emancipava, que, segundo o dizer respeitoso dos do lugar, «fazia casa». Nas rendas dos irmãos, ela subtraía habilmente a comissão devida às suas responsabilidades e fadigas na administração delas." (p. 87).
            Mas a ascensão de Quina como proprietária hábil, abastada, é feita à custa da economia e do governo da casa: "o seu equilíbrio uma forma de génio". E, por outro lado, "a prosperidade trazia-lhe também (...) inimigos..." (p. 88).
            Estes factos levantam uma questão fundamental: porque não casou Quina?
            As causas são as seguintes:
-» Quina tinha uma imagem negativa dos homens, tomando como exemplo o comportamento do pai;
-» gostava mais de ser admirada do que de servir: "Ela adorava os respeitos, mais do que os amores. Sempre assim fora, e, mesmo que agora alguns partidos consideráveis mandavam espiar-lhe as disposições a respeito de consórcio, ela sentia mais prazer pelas alusões feitas ao seu nome de proprietária, do que pela galanteria dedicada à mulher" (p. 82);
-» sente um grande e intenso amor pelo pai, mantém com ele uma aliança secreta (p. 23);
-» o casamento limitaria o seu desígnio do aumento do património e da riqueza;
-» embora muito ligada ao clã feminino da casa e da família, é como um homem que Quina sempre agiu, recalcando a sua feminilidade.


            3. A conquista do poder espiritual

            Quina não chega a ser uma autêntica sibila. Tem de comum com as sibilas de Apolo o facto de ser a guardiã da sua casa, ter por herói o pai, o seu Apolo, possuir um discurso sentencioso e sibilino, um poder medianeiro, interferindo nas ações das pessoas e captando os segredos da existência, entrando frequentes vezes em êxtase.
            Porque é que não foi uma autêntica sibila?
            "Criou asas, sem jamais poder voar. Havia nela uma admirável capacidade de entusiasmo que podia arrastá-la ao sobre-humano. Mas o instinto prático pesava-lhe como chumbo no coração, e ela subordinava aos interesses a chama que Prometeu furtou e cujo valor ela nunca compreendeu. Todos os seus passos acabavam por deixar um rasto de autossuficiência tão inocente quanto grotesca, e todas as suas ações traziam consigo um selo de vaidade e ânsia de louvor que as tornavam desde logo inúteis, ridículas e falsas." (p. 89)
            O seu apelo ao triunfo imediato, às coisas materiais, terrenas, a sua constante e insaciável vaidade, as suas intrigas mesquinhas, tudo isto a condenou, pesou como chumbo, não lhe permitindo voar.

            Todavia, o seu poder espiritual fica patente no auxílio espiritual de Quina aos sofredores e desprotegidos, ilustrado na sua ação junto do marido de Lisa, no seu leito de morte. Esta circunstância exemplifica a projeção social de Quina no espaço onde vive, bem como o seu sentimento de vaidade, com exultação perante a idolatria:
            "- Deite-se para baixo, se Zé - murmurou ela. - Adormeça.";
            "O velho deixou-se recostar, ficou quieto, olhando à sua frente. Não parou de mover os lábios, e, quando Quina tentava afastar-se, ele agitava-se, gemendo. Porém, não a tinha ouvido.";
            "Quina, onde se interpunha à sua vaidade monstruosa e implacável" (p. 91).
            A construção do mito de Quina fica bem marcada neste episódio, finalizado com a oração.


            4. A fragmentação do tempo

            . Analepse: o episódio entre o pai de Augusto e Francisco Teixeira (p. 83).

            . Sumário (p. 87, 1º parágrafo).


            5. Crítica à emigração, na pessoa do sobrinho de Adão, que, cruel e oportunista, se aproveitava da ingenuidade dos emigrantes (p. 85).


            6. Quina, grande e pequena ou o Prometeu agrilhoado

            A associação que o narrador faz entre Quina e o deus Prometeu serve para demonstrar a obsessiva e irrefletida sede de poder e de absoluto de Quina que, como o deus, se torna vítima dela própria: "(...) e ela subordinava aos interesses a chama que Prometeu furtou e cujo valor ela nunca compreendeu." (p. 89).


            7. Domingas:  representa as mulheres que amortalham os mortos, nas aldeias, e as carpideiras, e o seu retrato é-nos apresentado depreciativamente: "(...) Havia alguns vizinhos em volta, e uma mulher, amortalhadeira de profissão, veio desde a lareira, com a colher de lata negra com que estivera a revolver um cozimento suspensa na mão." ;  "(...) e tomando-os alternadamente, com vagidos de comoção e consolo. (...) Ela era, de resto, atreita a amores, e todos os homens lhe pareciam bem." (pp. 90-91).

Sem comentários :

Enviar um comentário

Related Posts Plugin for WordPress, Blogger...